A arte ofende em Portugal

O que Élsio Menau fez nada teve a ver com a profanação do símbolo de Portugal. O que ele fez foi dissociar a bandeira do objecto simbólico nacional e trabalhá-la como ideia de nacionalidade, que representa o país, neste caso na forca

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El Menau/Facebook

Eu conheço o Élsio Menau. Não apenas pelo Facebook, nem apenas de vista. Eu já tive o prazer de falar com o Élsio, conversar com ele e de ser tatuada por ele. Eu gosto do Élsio. Ele é uma pessoa como não há muitas, hoje em dia. O Élsio é calmo, muito positivo, simpático, dono de um sorriso contagiante. É boa pessoa. Eu gosto do Élsio. E mais do que boa pessoa, ele é de facto um bom artista. Um artista completo. Basta ver os trabalhos dele para sabermos que o El Menau é artista de mente aberta, criativo, dono da sua própria cena. Tem uma associação de arte, a Policromia, e outros projectos. Participou em diversas exposições, faz dos graffiti mais bonitos e originais do Algarve e, quiçá, do país.

E por que é que eu vos estou a falar do Menau? Ora, porque o Menau vai a tribunal esta segunda-feira. E porquê? Porque ser artista em Portugal, aparentemente, é crime. Passo a explicar: na sua licenciatura em Artes Visuais, na Universidade do Algarve, Menau desenvolveu  projecto "Portugal na Forca", em que aparecia a bandeira Portuguesa "enforcada". O trabalho valeu-lhe 17 valores — mas apenas porque os professores acharam que o tema era muito "forte" e "directo". Valia muito mais e Menau podia tero acabado o curso com 20 valores.

Menau conta que só foi intimado pela polícia depois do incidente em que o Presidente da Républica hasteia a bandeira Portuguesa ao contrário.

Agora pergunto-me: houve, de facto, profanação de um símbolo nacional? Não será, também, profanação as dezenas de bandeiras Portuguesas, “made in China” que vemos hasteadas nas casa alheias, em paus de esfregona, em capas para animais, bandeiras falsificadas e por aí?

A arte ofende em Portugal. Onde é normal o nosso Presidente hastear a bandeira ao contrário de sorriso nos lábios, arte interventiva é crime.

O que Élsio Menau fez nada teve a ver com a profanação do símbolo de Portugal. O que ele fez foi desassociar a bandeira do objecto simbólico nacional e trabalhá-la como ideia de nacionalidade, que representa o país, neste caso na forca. Trata-se aqui de um país enforcado — e não da estrangulação, pura e dura, de um símbolo nacional. É a diferença entre olharmos apenas para a bandeira, ou vermos a obra de arte no seu todo.

Se calhar, o que ainda nos falta é a literacia visual e artística necessária para entender para além do que nos é mostrado. Mas essa falta de compreensão e a incapacidade de lermos o que nos é mostrado está a fazer com que um artista esteja a ser privado de expor, livremente, a sua arte.

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