Que "Homeland" exerce um poder hipnotizante desde os primeiros minutos não é surpresa alguma. Esta série, um verdadeiro jogo do "cat-and-mouse", sobre um recém-libertado "marine" vestido de herói americano, Nick Brody (Damian Lewis), que passou anos como prisioneiro do “inimigo”, no Iraque, é baseada numa série israelita adaptada e produzida para a televisão dos EUA por Howard Gordon, produtor executivo de "24". Não haja dúvidas: Mr. Gordon mantém a sua capacidade de criar um "script" diabolicamente hábil e atmosferas carregadas de dúvidas, suposições e ameaças silenciosas.
Carrie Mathison (Claire Danes), uma analista e agente da CIA, recebeu uma notícia, enquanto estava no Iraque, de que um prisioneiro de guerra americano se tinha convertido à causa “jihadista” mas, agora, tinha sido milagrosamente resgatado por forças norte-americanas encontrando-se prestes a ser recebido com toda a pompa e circunstância digna do herói, símbolo da resistência e patriotismo. Carrie, a única que carrega e acredita nesta inconveniente informação inicia uma perseguição obsessiva (atiçada pela bipolaridade psicótica de que padece) a Brody sempre com medo que o herói-agora-agente-da-Al-Qaeda planeie um ataque terrorista ao Tio Sam.
A maioria dos críticos acusa esta produção premiadíssima (variadas categorias dos Globos de Ouro em 2013 e outras tantas dos Emmy de 2012) de racismo, islamofobia e militarismo knee-jerk. Nada de mais errado. “Homeland” desafia os preconceitos dos seus telespectadores em vez de os afirmar. Pensemos, por exemplo, na fé islâmica de Brody. Enquanto a personagem vai oscilando entre ajudar Abu Nazir – um procurado terrorista pela CIA – e a colaboração com a CIA, a sua fé no Islão mantém-se constante e independente das suas alianças políticas. E mais. O sargento abraça tanto o terrorismo como o Islão mas, quando inicia a colaboração com a CIA a fim de encontrar Abu Nazir, vemos um Brody a ser absorvido e purificado pela primeira oração da manhã. Assim fica clara a separação entre terrorismo e islamismo.
A série mostra ainda o verdadeiro estado de segurança dos EUA pós 9/11, inevitavelmente associado ao programa americano dos drones e apimentado pela corrupção e voracidade de poder ilimitado do Vice-presidente William Walden. Episódio após episódio, o pensamento moral monocromático, sem variação, ao jeito do “nós contra eles”, assume-se como o verdadeiro inimigo, ao invés de um qualquer determinado pela nacionalidade ou grupo étnico.