Somos uns macacos falantes. Falamos, falamos, falamos, escutamos, lemos, escrevemos e pensamos… Estamos presos nas palavras! Por isso nos emocionamos com elas e nos deixamos levar por elas e por quem as diz. Porém, ao longo da história, muitos foram os contos de fadas que nos iludiram e muitos foram os discursos messiânicos e as promessas vãs que nos conduziram (e tantas vezes à tragédia…).
A verdade é que há um perigo nas palavras: porque nos podem encantar, podem-nos também ofuscar a realidade e fazer com que as sigamos, só porque são belas, só porque são lógicas, só porque fazem sentido (e queremos acreditar nesse sentido…). E mais, aqueles que mais dizem as palavras sem hesitar, seguros de uma verdade absoluta, são, muitas vezes, os que mais longe estão da realidade, porque estão iludidos, ou porque são loucos, mas sempre perigosos!
A história da humanidade está repleta de exemplos daqueles que fizeram do seu discurso a verdade absoluta e o catalisador de multidões, guerras e revoluções. No final, porém, sentiu-se sempre o choque com a realidade, com a verdade que não estava dita nas palavras mas que o tempo e os acontecimentos sempre fazem o favor de desvendar.
Desde líderes religiosos a gurus espirituais, passando por políticos profissionais, muitos são aqueles que ensaiaram o discurso forte e absoluto, belo, empolgante e contagiante, internamente coerente, mas desligado do real… E nós, seres humanos carentes da mensagem da verdade, do conforto da salvação, caímos sempre na mentira encapotada, na impossibilidade desejada, na quimera sempre procurada… Somos frágeis, tememos a morte e buscamos a felicidade. E estamos dispostos a acreditar no outro, no que traz a palavra do conforto, da esperança. E se a palavra dita é bela e ressonante, perdemos as dúvidas (porque as queremos perder?) e seguimos a ilusão. Estamos viciados nas palavras fortes, miríficas e salvíficas.
E, como qualquer viciado, tardamos a perceber que o somos e a ver a realidade. A realidade, porém, está aí à frente de todos nós, sempre a lembrar-nos que existe: quando a palavra divina nos prometia a salvação, a felicidade e a paz, e a realidade nos deu as guerras “in nomine dei” e os abusos eclesiásticos; quando a palavra ideológica nos prometia a justiça, a igualdade e a riqueza e a realidade nos deu a ditadura, a tirania e a pobreza; ou quando a palavra espiritual nos prometia a transcendência e o nirvana e a realidade nos trouxe a alienação, o suicido e a extorsão…
Paremos, então, para pensar. Usemos as palavras (porque somos delas prisioneiros) já não para acreditar mas para duvidar. Essa sim, uma única certeza: a dúvida! Somos precários, morreremos e nunca vamos saber toda a verdade…
Até la, resta-nos pensar, criticar, questionar e tentar sermos felizes. E por isso tenho um lema que aprendi no cinema com João César Monteiro: perante a dúvida existencial “Qual é a solução? Não há. O suicídio é uma solução. Se é, e há quem defenda que é, não me interessa. Só o problema é interessante. Nunca a solução. E o ser humano, ou o que dele resta, tem que ser capaz de viver com a insolubilidade da própria vida”.