Presidente do Infarmed: cannabis como medicamento seria "fantástico" para algumas pessoas

Maria do Céu Machado defende o "cultivo controlado", com prescrição e acompanhamento médico, e venda em farmácia. E admite a eventual criação de um gabinete específico de acompanhamento dentro do Infarmed.

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Daniel Rocha

A presidente do Infarmed defendeu nesta quinta-feira o uso da cannabis como medicamento, desde que em condições específicas e controladas e não através de auto-cultivo.

"Penso que seria fantástico para algumas pessoas e patologias, haver acesso", mas com "cultivo controlado, prescrição médica, acompanhamento médico" e venda em farmácia, e eventualmente com a criação de um gabinete específico de acompanhamento dentro do Infarmed, disse Maria do Céu Machado.

A presidente do Infarmed - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, falava na Comissão de Saúde da Assembleia da República, num grupo de trabalho que está a avaliar a utilização da canábis para fins medicinais, no seguimento de dois projectos de lei nesse sentido, um do Bloco de Esquerda e outro do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN). Os dois projectos admitem o auto-cultivo da planta.

Ouvida pelos deputados a presidente do Infarmed começou por lembrar que as propriedades da planta são conhecidas há séculos e referiu que a mesma tem mais de 400 constituintes e 60 canabinoides, sendo que os constituintes variam consoante as condições em que é cultivada.

Contaminação da planta

Maria do Céu Machado insistiu na questão da segurança da planta, porque a mesma se contamina muito facilmente com metais pesados, fungos e pesticidas e o Infarmed, assegurou, não tem capacidade para controlar cada cultivo particular.

"Num medicamento interessa a eficácia, a qualidade e a segurança. Coloca-se o problema da qualidade e da eficácia. Se não for regulado o cultivo a planta facilmente se contamina", alertou.

A responsável explicou também aos deputados o circuito do medicamento para dizer que não vê grande necessidade de nova legislação sobre a matéria, porque medicamentos com base em canábis já podem ser prescritos, e que em Portugal não houve até agora qualquer pedido de autorização de introdução no mercado de um medicamento do género.

Na União Europeia, disse, há neste momento 42 ensaios clínicos, acrescentando que em países com legislação específica sobre a matéria os medicamentos à base de canábis são indicados para esclerose múltipla e doenças oncológicas. A Holanda, frisou, alterou a legislação para proteger os doentes, introduzindo o controlo de qualidade e venda nas farmácias e criação de uma agência específica.

No período das respostas a dúvidas dos deputados Maria Antónia Almeida Santos (PS), Moisés Ferreira (Bloco de Esquerda, que coordena o grupo), Isabel Galriça Neto (CDS-PP) e Carla Cruz (PCP), Maria do Céu Machado reafirmou que as plantas variam muito e facilmente se contaminam, pelo que o Infarmed não pode assim garantir a eficácia, a qualidade e a segurança de um produto à base de canábis que alguém cultivou em casa.

E disse desconhecer o motivo porque nunca foi pedida uma autorização de comercialização de medicamento em Portugal, referindo ainda que já houve medicamentos à base de canábis no mercado europeu que foram retirados por terem efeitos adversos graves.

Em janeiro passado os projectos de lei do BE e do PAN para a utilização terapêutica da canábis baixaram sem votação, à comissão parlamentar de saúde, após um debate no parlamento em que os partidos se dividiram.

A baixa à comissão foi acordada entre os partidos com propostas e justificada, em plenário, pela deputada bloquista Mariana Mortágua como uma tentativa de se tentar "uma solução de compromisso" para se conseguir a "melhor lei possível" no parlamento.