Voltar ao número de alunos por turma antes da troika custaria cerca de 84 milhões de euros
Estudo encomendado pelo Ministério da Educação avalia impacto financeiro da redução de alunos por turma no ensino básico e secundário, mas medida só deverá ser aplicada até ao 9.º ano de escolaridade.
A redução do número de alunos por turma para os níveis em vigor antes da troika representaria em 2020/2021, ano da generalização da medida, um acréscimo orçamental de cerca de 84 milhões de euros, conclui-se num estudo encomendado pelo Ministério da Educação (ME) ao Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE-UL, com o objectivo de avaliar os impactos financeiros e pedagógicos desta política.
Este impacto é muito menor do que aquele resultaria da aplicação dos limites propostos pelo BE, PCP e Os Verdes, e que segundo o Conselho Nacional de Educação levaria a um acréscimo de custos que oscilaria entre os 500 e os 700 milhões de euros. Estas propostas foram aprovadas pelo Parlamento, no ano passado, na generalidade, estando agora em apreciação na comissão parlamentar de Educação. O aumento da despesa com a redução do número de alunos por turma deriva sobretudo da necessidade de contratação de mais professores já que menos alunos significa maior número de turmas.
Entre os objectivos fixados no programa do Governo figura a “redução gradual do número de alunos por turma”, não estando especificados os limites desta redução, nem os ciclos de ensino abrangidos. No ano passado, por altura da discussão do Orçamento de Estado para 2017, o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, revelou que as estratégias a adoptar neste campo estavam dependentes dos resultados de um estudo sobre o impacto financeiro da medida, que já fora encomendado.
Menos dois alunos
Este estudo foi divulgado publicamente nesta terça-feira e por via dele ficou a saber-se também que o Governo nunca equacionou baixar os limites que vigoraram entre 2004 e 2013. Foi esse o objecto da encomenda ao ISCTE: “estimar os efeitos do retorno aos limites legais de dimensão das turmas previstos, em termos gerais, no despacho normativo n.º 13765/2004.”
Neste diploma estipulava-se que o número máximo de alunos por turma não podia exceder os 24 no 1.º ciclo do ensino básico e os 28 nos restantes níveis de escolaridade. Em 2013, com o então ministro Nuno Crato, estes limites subiram respectivamente para 26 e 30 alunos. Os partidos de esquerda que apoiam o Governo no Parlamento têm defendido uma redução muito mais acentuada, com o número máximo de alunos por turma a oscilar entre os 19 no 1.º ciclo e os 22 no ensino secundário.
O estudo encomendado pelo ME confirma que, em Portugal, existe "um predomínio claro de turmas com uma dimensão inferior aos parâmetros previstos na legislação".
O estudo do ISCTE foi divulgado publicamente já depois de, neste ano lectivo, se ter iniciado a redução do número de alunos por turma nos 139 agrupamentos de escolas situadas nos chamados Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP) e de o Governo ter aceitado incluir no Orçamento de Estado para 2018 a sua generalização às outras escolas.
À semelhança do que sucedeu nas escolas TEIP, também nas restantes a redução de alunos por turma começará por ser aplicada nos anos iniciais de cada ciclo de escolaridade.
Redução só no básico?
O estudo divulgado nesta terça-feira calcula que neste ano lectivo a redução de alunos por turma nas escolas TEIP representará um acréscimo de cerca de quatro milhões de euros. Já em 2018/2019, a sua extensão às outras escolas, nos anos iniciais de cada ciclo, teria um custo de perto de 29 milhões de euros, se neste pacote fosse incluído também o ensino secundário, como sucedeu no caso das TEIP.
O que foi aprovado pelo Parlamento para 2018/2019 diz apenas respeito aos três ciclos do ensino básico, já os cerca de 84 milhões de euros estimados para 2020/2021 incluem os custos com o ensino secundário. Naquele ano, este valor ficará em cerca de 50 milhões com a redução desta medida apenas ao ensino básico.
Esta é, aliás, uma das recomendações dos autores do estudo, coordenado por Luís Capucha. Propõem eles que a redução seja feita apenas no ensino básico, uma vez que no ensino secundário, “dada a variabilidade das modalidades que constituem este nível de ensino”, estar a estipular-se “padrões normativos rígidos” poderia “inviabilizar a oferta existente”.
A redução do número de alunos por turma é uma das medidas propostas no programa do Governo para se “melhorar a qualidade do ensino”. No relatório do ISCTE lembra-se que esta temática tem sido alvo de um grande número de estudos, que chegaram a “conclusões muito diversas”. Sublinham, no entanto, que “os principais estudos de referência apontam para a conclusão de que turmas mais pequenas tendem a produzir resultados pedagógicos positivos, principalmente entre os alunos oriundos de meios socioeconómicos mais desfavorecidos”.
“É exactamente nesta última questão, no que respeita à igualdade de oportunidades na escola, que as pesquisas são mais consonantes”, frisam. Este benefício resultará do facto de a menor dimensão das turmas estar associadada " a mais tempo para os professores dedicarem atenção específica a cada aluno, maior possibilidade de controlo da disciplina e experiências mais positivas de aprendizagem", constatações que, afirmam, também são partilhadas pela maior parte dos estudos realizados.
Menos chumbos
Mas se a diminuição da dimensão das turmas tem estes impactos, tal não significa, como também mostram muitos estudos, que esta medida, só por si, se traduza em melhores desempenhos escolares dos alunos, alerta-se no estudo do ISCTE. Por isso, defendem que as medidas adoptadas “neste domínio devem ser perspectivadas num conjunto mais vasto de políticas educativas”, entre as quais figura a formação de docentes.
Feita esta ressalva, os autores do estudo do ISCTE concluíram, contudo, que existe uma relação entre a dimensão das turmas e as taxas de retenção e abandono escolar. Para tal, analisaram os dados reportados pelas escolas em 2014/2015 sobre os resultados dos alunos nos exames de Português e Matemática do 4.º, 6.º, 9.º e 12.º ano e as taxas de transição e conclusão de ciclo. Principais conclusões: “no 9.º e 12.º ano a uma maior dimensão de turma associa-se significativamente uma menor probabilidade de transitar de ano”, quanto aos resultados dos exames constata-se que, no 4.º, 6.º e 9.º ano, “as turmas de maior dimensão tendem a estar estatística e significativamente associadas a desempenhos escolares mais baixos”.
Por essa razão recordam que no cálculo dos custos financeiros é preciso ter em conta que “vários autores referem o modo como aqueles são atenuados, ou até mesmo compensados com vantagem, a médio e longo prazo, com a redução da retenção e do abandono escolar”. Em Portugal, há outro factor para não temer a multiplicação anual do custo desta medida já que, frisam, o acréscimo de turmas por via desta política “estará bastante abaixo das turmas que serão extintas por via da quebra demográfica".
Número de alunos por turma em 2016/17
No 1.º ciclo do ensino básico, cada turma tem no máximo 26 alunos. No 2.º e 3.º ciclos e ensino secundário, o limite é 30.
Número de alunos por turma em 2018/19
O Governo aprovou novos limites para o 1.º, 5.º e 7.º anos (anos iniciais do 1.º, 2.º e 3.º ciclo do ensino básico). A saber, 24 para o 1.º ano e 28 para o 5.º e o 7.º.
Número previsto para 2020/21
O Governo comprometeu-se com o alagamento até ao 9.º da redução do número de alunos por turma. A concretizar-se: em todos os anos do 1.º ciclo, as turmas passarão a ter até 24 alunos; no 2.º e 3.º ciclo o máximo será 28.
Números previstos no estudo
O estudo do ISCTE encomendado pelo Governo estima o custo da generalização atrás referida, mas inclui também o ensino secundário. A despesa estimada de mais de 80 milhões parte do pressuposto de que no 10.º, 11.º e 12.º as turmas teriam também um máximo de 28 alunos.
O que propõem BE, PCP e Verdes
Os três partidos propõem uma redução ainda maior do que a preconizada pelo Governo: entre 19 e os 22 alunos, no máximo, por turma. O Conselho Nacional de Educação calcula que os custos destes valores oscilariam entre os 500 milhões e 700 milhões de euros.
Notícia corrigida às 19h32. Retira-se a referência a não se saber qual o impacto financeiro da redução no ensino básico, porque este cálculo também figura no estudo.