O que quer o Governo do SIRESP?
Para que a responsabilização não seja apenas um artifício, para que o SIRESP possa ser um aliado e não um bode expiatório de tudo o que falhou, era importante que o Governo esclarecesse isto.
O Governo decidiu não esperar pelo fim da época de incêndios, nem pela conclusão dos 1001 relatórios que estão pedidos, nem pelas respostas que António Costa pedia ainda no sábado, na entrevista ao Expresso: o SIRESP falhou e o Estado vai accionar os mecanismos legais para reclamar uma indemnização. Convém partir para esta discussão limpando-a de demagogias: o SIRESP é uma rede de comunicação de emergência necessário a um combate eficaz em situações de emergência - e como tal não pode ser rasgado. Porém, dizer isto não é dizer tudo.
Voltemos, portanto, ao essencial: o SIRESP é a PPP mais opaca que o Estado português assinou. Não se sabe quem manda nele, não se conhece quem se responsabiliza, os seu conselho de utilizadores não reunia há dois anos, não há relatórios de avaliação publicados, não há sequer dados sobre a sua utilização e, ao que se sabe agora, nem o Estado cumpre devidamente o papel de o fiscalizar. Nada disto acontece nos hospitais, por exemplo. E, sim, tudo isto é grave - mas não é responsabilidade de quem gere o SIRESP: se o Estado português contrata um serviço e nunca o fiscaliza nem se assegura do seu cumprimento, processá-lo não é o essencial.
Concordamos nisto: face ao que aconteceu em Pedrógão, será um dever moral pedir responsabilidades ao SIRESP, por uma vez que seja. Mas o que temos de exigir ao Governo é mais do que isso: que nos diga, desde logo, se vai sentar-se com os privados e renegociar o serviço que, assume agora o MAI, já falhou várias vezes este ano. O que diz o parecer da Linklaters é que pode fazer até mais do que isso: “Não caso de não cumprimento, grave ou reiterado, não sanado ou sanável, das obrigações por parte da operadora, há lugar a rescisão sancionatória”. Claro que não se pode rasgar o contrato, porque o Estado precisa do serviço. Mas pode rever-se o que se se paga, nacionalizá-lo e/ou obrigar a reforçar os seus meios. Será que o Governo o vai fazer?
Para que o processo que se vai agora abrir não seja apenas um artifício, para que o SIRESP possa ser um aliado e não um bode expiatório de tudo o que falhou, era importante que o Governo esclarecesse isso: o que quer do SIRESP. E que nos mostrasse tudo: as contas, os relatórios anuais que não são públicos, as actas das reuniões, as indicações sobre as falhas, neste e noutro ano. E já agora que nos explicasse exactamente onde falhou e porquê o SIRESP em Pedrógão Grande e noutros focos - porque sempre que há uma noticia de uma falha, a Protecção Civil vem a correr dizer-nos que foi só um bocadinho e sem interferência no combate. Era bom sabermos porquê.