Terrorismo, modo de usar
Para fazer um ataque terrorista não é preciso vir uma equipa da Síria.
É mesmo um atentado quando uma carrinha é atirada contra peões e um grupo de homens esfaqueia transeuntes numa capital europeia? Afinal, morreram sete pessoas, e em oito minutos os atacantes foram abatidos a tiro. Isso é comparável com algo como o ataque à bomba de quarta-feira no Afeganistão, com um camião-cisterna armadilhado, em que morreram quase 100 pessoas? A resposta é sim, porque o objectivo é o mesmo, embora os meios sejam diferentes: espalhar o terror, minar uma sociedade e levar os políticos a responder da forma mais agressiva.
O último número da revista do Daesh Rumiyah — que substitui a Dabiq, que tirava o nome da cidade síria onde uma profecia dizia que iria acontecer o Armagedão, mas cujo controlo o grupo jihadista perdeu no ano passado — apela a novas técnicas de espalhar o terror no Ocidente. O novo nome da revista é, aliás, todo um programa de ameaça ao Ocidente; “Rumiyah” é a palavra em árabe para Roma, tirada também de uma profecia que diz que os muçulmanos conquistarão um dia a cidade santa dos cristãos.
A revista do Daesh sugere aos seus seguidores “nas terras dos descrentes” que usem sites como o eBay ou de ofertas de emprego, para atrair incautos para encontros. O objectivo não é tanto transformá-los em reféns, explica Robin Wright na New Yorker, mas executá-los. É uma nova forma de cumprir o apelo anterior para matar infiéis de toda a maneira possível, com facas, atirando carros contra multidões — tudo ideias já postas em prática em vários locais.
O objectivo, diz a revista, é “ganhar uma ampla publicidade e plantar de forma mais eficaz o terror no coração dos não crentes”. Também é possível criar situações de tomada de reféns, “em clubes nocturnos, cinemas, centros comerciais — áreas fechadas que permitam massacrá-los, usando o edifício como uma defesa natural”.
Para fazer um ataque terrorista não é preciso vir uma equipa da Síria. As ideias e os apelos sobre como o fazer estão a circular na Internet, circulam boca a boca, circulam em papel.
Mas a reacção automática de Theresa May foi puxar da sua antiga ambição de ministra do Interior (2010 a 2016) de controlar a Internet. “Precisamos de trabalhar com outros governos democráticos para alcançar acordos internacionais que regulem o ciberespaço e evitar que se espalhe o extremismo e o planeamento de actos terroristas”, afirmou.
Na verdade, o que a primeira-ministra está a fazer é campanha para as eleições de quinta-feira — quando o seu partido anunciou que suspendia os actos de domingo. Mais, está a promover a censura. Está a transformar-se num inimigo de rosto mais semelhante com o que é descrito pela propaganda terrorista.
“Nos anos 1970, antes da era dos telefones móveis, quando o IRA irlandês usava telefones para organizar os seus ataques, ninguém apelava ao controlo dos telefones”, recordou Charles Arthur no Guardian, comentando os pedidos de políticos como May para que as empresas da Internet sejam consideradas responsáveis pelas comunicações dos terroristas. “As empresas precisariam de ter pessoas a monitorizar cada palavra que nós escrevemos, cada vídeo que vemos, e compará-lo com algum manual de dissidência.”
Em suma, seria outra forma de terrorismo: controlo absoluto sobre o comportamento e o pensamento.