The Woman who Left ganha Leão de Ouro do Festival de Veneza
O júri que deu o prémio ao realizador filipino Lav Diaz foi presidido pelo cineasta Sam Mendes.
Seis meses depois do Urso de Prata em Berlim, por A Lullaby to the Sorrowful Mystery, o “fenómeno” Lav Diaz marca o Festival de Veneza: The Woman who Left recebeu o Leão de Ouro, decisão de um júri presidido pelo cineasta Sam Mendes.
De alguma maneira, o Lido reclama aquilo que também é seu, porque foi em 2007 que o filipino foi exposto ao público e à crítica internacionais, com Death in the Land of Encantos exibido na secção Horizontes. Os filmes de Diaz, as longas durações (The Woman who Left até só dura cerca de quatro horas), tornaram-se rapidamente na coqueluche dos festivais. São experiências sobre o espaço da História filipina, e este é também uma experiência no espaço da História do cinema filipino: uma tradição melodramática que teve num cineasta como Lino Brocka (1939-1991) um incandescente cultor.
É a história de uma mulher que sai da prisão onde esteve presa durante 30 anos e regressa à vida, ou a uma aparência de vida, porque ficou condenada a habitar, como super-herói sombrio, o mundo dos fantasmas – o lado mais interessante é este negrume fantasmagórico. É considerado o mais acessível do cineasta, mas não está nada isento de auto-indulgências. Mas alguma coisa fez “clic” entre os festivais e Lav Diaz, chegou a vez de Veneza e não há muito que se possa fazer.
Dizia-se, curiosamente, que o filipino não seria “coisa” para um júri presidido por Sam Mendes. Afinal, engano. Mendes em conferência de imprensa revelou que houve um “grande” entusiasmo no júri. Mas deve haver algum mal-entendido nisto: no início da cerimónia no Lido, o presidente do júri elogiou o “extraordinário” festival que foi a selecção dos programadores, o que é uma opinião, mas está longe de ser consensual. Por aqui achamos que foi medíocre.
Nos três prémios principais, estão um deficiente vai-e-vem narrativo entre níveis de ficção (Grande Prémio do Júri a Nocturnal Animals, de Tom Ford, muito esforçado, com óbvios e feios raccords, e sem chegar lá), uma versão autoritária, académica, de cinema de autor (Paradise, de Andrei Konchalovsky, que recebe o mesmo prémio, Melhor Realizador, que teve, com o muito diferente The Postman’s White Nights, em 2014), e uma próxima next big thing, ou se calhar já o é, filme desafiante, sim, frustrante, também, mas seco e orgulhoso: o mexicano Amat Escalante, por La Region Salvaje, premiado ex-áqueo com Konchalovski – são temperamentos de cineasta tão diferentes que é uma associação esquizofrénica.
Um dos piores filmes do concurso, porque se encosta de forma oportunista a uma série de referências (Tarantino, Lynch...) sem articular, recebeu o Prémio Especial do Júri, e logo esse: The Bad Batch, de Lily Amirpour. Emma Stone, por La La Land, de Damien Chazelle, Oscar Martinez, por Il Ciudadano Ilustre, de Gastón Duprat e Mariano Cohn, foram os intérpretes premiados – o discurso de Martinez, obviamente, mais caloroso e emocionado que o discurso cínico e angustiado da sua personagem, um escritor que recebe o Nobel.
O prémio do Melhor Argumento foi para Frank Oppenheimer, por Jackie, de Pablo Larraín. Um dos melhores filmes do concurso, Frantz, de François Ozon, recebeu “apenas” o Prémio Marcello Mastroianni para uma jovem actriz emergente: Paula Beer. Um dos melhores filmes do concurso, Une Vie, de Stéphane Brizé, não levou nada do palmarés oficial (os jurados da FIPRESCI, associação da crítica de cinema internacional, não se esqueceram dele). Do maior filme do concurso, o grande e comovente come back de um cineasta, On the Milky Road, de Emir Kusturica, o júri constituído por Sam Mendes (presidente), pela cantora e artista visual Laurie Anderson, pelas actrizes Gemma Arterton, Nina Hoss, Chiara Mastroianni e Zhao Wei, pelos realizadores Joshua Oppenheimer, Lorenzo Vigas, e pelo argumentista Giancarlo de Cataldo, passou ao lado.