Os amigos da praia
Os amigos da praia são amigos de circunstância mas é por isso que são valiosos.
É bom meter conversa com vizinhos acidentais. Falar com estranhos obriga-nos a pôr em causa essa estranheza. Ao princípio procuram-se semelhanças, só para estabelecer que partilhamos a humanidade. Depois são as diferenças que nos divertem e fazem rir e pensar. Quanto mais sinceros e indiscretos formos, maior é a festa.
É um exercício difícil apresentarmo-nos rapidamente, sem enfastiar o vizinho. É preciso compreender a boa educação: uma pergunta acerca de nós próprios é uma delicadeza, designada a mostrar interesse pela nossa pessoa. Uma longa resposta é malcriada e debilitante.
Bastam dois dias – duas manhãs, duas tardes – para se formar uma comunidade praieira. Trocam-se impressões sobre os benefícios dos banhos, a temperatura da água e a correspondência da cor das bandeiras com os perigos do mar.
Os amigos da praia são amigos de circunstância mas é por isso que são valiosos. A criatura humana gosta de se armar em solitária mas é fundamentalmente sociável. De resto, os amigos da praia respeitam a solidão. Se estivermos a ler não nos interrompem. Se não lhes apetecer conversar, viram-se de lado ou tapam os olhos com um chapéu. Dir-se-ia que os amigos da praia têm antenas que lhes permite averiguar os estados de alma de cada um.
As praias do Algarve são o lugar onde os portugueses de Portugal inteiro se encontram para conversar. A começar pelos algarvios, possuidores do melhor sentido de humor do país, que acompanham com uma dose generosa de sinceridade. É incrível – mas é verdade – que o espírito brincalhão e a frontalidade dos algarvios que estão a trabalhar violentamente sejam iguais nos algarvios que estão aqui a passar férias.
Os amigos da praia desaparecem de um dia para o outro, o que é desconcertante. Há conversas que ficam interrompidas para sempre e personalidades engraçadas a que nos habituámos que nunca mais vamos ver ou ouvir.
Mas outros regressam, passado um ano ou mais. E são muito felizes esses reencontros. É um alívio estarmos outra vez juntos. Tal e qual como se tivéssemos combinado. Quem sabe se, nalguma dobra secreta dos nossos cérebros, não combinámos mesmo? Deus queira que sim.
Adeus, amigos da praia. Por enquanto...