Mario Balotelli: uma história sem sentido
O avançado italiano destruiu a Alemanha no Euro 2012. A partir desse momento, o seu caminho foi feito sempre a descer.
28/06/2012 - Varsóvia
Às 20h05, Mario Balotelli esgueira-se por trás de Badstuber e “diz sim” ao cruzamento de Antonio Cassano. Alemanha 0-1 Itália.
Às 20h21, “Super Mario”, quem mais, desmarca-se nas costas da defesa alemã, coloca no chão a bola longa de Montolivo, corre, isolado, até à entrada da área alemã e desfere um remate portentoso ao ângulo superior da baliza de Neuer. O guarda-redes alemão acompanhou o míssil de Balotelli com os olhos. Alemanha 0-2 Itália.
Os alemães ainda reduziriam perto do fim, mas o mal estava feito. Mario Balotelli destruiu a Alemanha, quase sozinho, carimbando a passagem da Itália para a final do Euro 2012. O mundo do futebol via nascer uma nova estrela e os italianos acreditavam ter um avançado para os dez anos seguintes, saudosos por Giuseppe Meazza, Sandro Mazzola, Luigi Riva, Rossi, Roberto Baggio, Del Piero, Totti ou “Pippo” Inzaghi.
02/07/2016 – Bordéus
Às 20h, italianos e alemães encontram-se de novo num Europeu, num jogo a eliminar, mas há uma baixa: Mario Balotelli não estará lá. O ataque italiano estará entregue a Pellè e Éder, um avançado trabalhador, disciplinado e humilde e um brasileiro naturalizado, também ele muito esforçado. Para o seu 3x5x2, Antonio Conte nem pensou em “Super Mario”.
Depois de a 28 de Junho de 2012 se ter colocado, de pleno direito, na rota para o topo da Europa, Mario Balotelli não só não apanhou esse barco, como perdeu os seguintes. Balotelli regrediu. Olhar para Balotelli, dentro ou fora do campo, era ver espontaneidade. Não a boa, a má. Ver Balotelli tornou-se um exercício proveitoso para quem gosta do barulho das polémicas e dos episódios caricatos, sempre espontâneos.
“Super Mario” ainda esteve presente no Mundial 2014 (fez um golo), mas nas passagens por AC Milan e Liverpool foi desaparecendo do radar. Sete golos em 51 jogos é o registo do italiano, desde que assinou com os ingleses que, na última temporada, o emprestaram ao AC Milan, clube ao qual tinham contratado o jogador por cerca de 20 milhões de euros.
Em Milão, Balotelli nunca encontrou o caminho para o sucesso, com algumas lesões a complicar, mais ainda, a sua vida no Norte de Itália. Três golos é o que o avançado italiano tem para contar da última época, sendo que dois foram de grande penalidade e um de livre directo.
O percurso de Balotelli, no regresso a Milão, é misterioso. No Manchester City, Balotelli incendiava a própria casa com fogo-de-artifício, atirava dardos (sim, aqueles dos pubs) aos jovens jogadores durante o treino dos “miúdos” e reclamava com qualquer companheiro menos talentoso. Mas também doava milhares de euros a mendigos quando saía do casino ou ia, espontaneamente, pelas ruas de Manchester, vestido de Pai Natal, oferecer dinheiro e presentes a crianças desfavorecidas. “Se repararem, ele nunca foi notícia por beber ou sair à noite. Ele não faz isso. Faz coisas mais inocentes e a verdade é que nunca deixaram de falar dele”, recordou José Coelho, português que foi colega de Balotelli nos jovens do Inter de Milão.
Mas tudo isto mudou. Ainda que surjam sempre algumas histórias de noites em discotecas, pouco credíveis e prontamente desmentidas, o jovem e incontrolável Balotelli não alimentou mais a lista de “Balotellisses” que alegrava os jornais ingleses e italianos. O vice-presidente do AC Milan, Adriano Galliani, chegou até a dizer “Ele é muito pontual. É quem acende as luzes no Milanello (centro de estágios do clube) e eu estou a pensar dar-lhe as chaves”.
Ainda que caricaturada, a ideia de Galliani mostra que Balotelli se tem esforçado. Ainda na última temporada, foi Roberto Baggio, grande lenda do futebol italiano, a falar do jogador: “Adoraria ensinar-lhe futebol”. Este seria o tipo de declaração que Balotelli desdenharia ou a que responderia com uma “Balotelisse”, mas o avançado italiano escolheu encontrar-se com Baggio.
Também Cesare Prandelli, treinador que viu Balotelli destruir os alemães em 2012, mostrou o seu sentimento agridoce. “Em termos de potencial, ele é um dos cinco melhores do mundo”, elogiou o antigo seleccionador italiano, que acrescentou: “Mas para ele, talvez o futebol não seja uma prioridade".
Dentro ou fora do campo, Balotelli fez com que se deixasse de falar dele. Por um lado, deixou de ser o “craque” que resolve jogos. Por outro, fez por deixar de aparecer nas manchetes, com os episódios caricatos, as partidas e as polémicas. Os últimos rumores apontam para a possibilidade de Balotelli rumar a campeonatos periféricos como o turco ou o chinês.
Para quem naquela noite de Verão, em Varsóvia, viu Balotelli disparar um míssil para a baliza de Neuer e enviar os alemães de volta a Berlim, esta história não faz sentido.
Texto editado por Jorge Miguel Matias