Pilotos, TAP e Governo tentaram travar greve até ao último minuto
Negociações prolongaram-se noite dentro, mas sem acordo à vista. Paralisação de dez dias irá causar danos incalculáveis.
A poucas horas do início da paralisação, multiplicaram-se ainda os esforços para lhe pôr um fim a tempo de evitar o pior cenário. Durante a tarde de quinta-feira, o presidente da TAP recebeu o Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) para tentar um acordo de última hora e, mesmo depois de os pilotos anunciarem, numa conferência de imprensa às 20h, que iriam avançar com a greve, as negociações com o Governo prosseguiram. No entanto, os protestos continuavam de pé.
Os impactos da decisão ainda são difíceis de calcular. O que se sabe, por agora, é que só no primeiro dia da greve, cujo início está marcado para esta sexta-feira, pelo menos três mil passageiros cancelaram os voos, com uma perda imediata para os cofres da transportadora aérea. Mas, além de o número ser provavelmente mais elevado (porque nem todos confirmaram os cancelamentos junto da TAP), haverá prejuízos futuros. É que os clientes que optaram por transferir as viagens ou pedir vouchers vão ocupar o lugar das novas reservas que pudessem surgir.
Como, desta vez, a companhia de aviação optou por não cancelar voos para evitar reembolsos, limitando-se elencar os que provavelmente não irá realizar, os aeroportos portugueses vão viver nesta sexta-feira um dia muito agitado. É muito provável que milhares de passageiros apareçam de malas feitas, mesmo sem haver certezas de que o avião não vai ficar em terra.
Para o primeiro dia de greve, a TAP tem apenas garantidas 56 ligações ao abrigo dos serviços mínimos, que protegem apenas 5500 dos perto de 30 mil passageiros que tinham reservas marcadas para esta sexta-feira. A estes clientes já acautelados, juntam-se os restantes três mil que cancelaram os voos, ficando mais de 20 mil pessoas com as viagens em risco.
É deste lote que fazem parte os cerca de três mil passageiros com bilhetes para os voos que a companhia colocou na quinta-feira na lista de 33 frequências que não prevê realizar. E sobram, por isso, perto de 18 mil, não se sabendo quantos já desistiram de voar pela TAP e ainda não comunicaram o cancelamento e quantos só saberão se descolam quando chegarem ao aeroporto, ficando à mercê da adesão dos pilotos à greve.
Se a paralisação se mantiver nos próximos dias, já que está agendada até 10 de Maio, os danos vão continuar a acumular-se. A transportadora aérea previa transportar 350 mil pessoas nestes dez dias e, dos três mil voos que estavam programados, apenas 276 ficaram assegurados com os serviços mínimos. A lista dos cancelamentos prováveis, que a TAP divulgou na quinta-feira, abrange apenas os três primeiros dias de greve, mas já inclui 86 voos. Nada garante, porém, que não aumente, se a previsão de que muitos pilotos compareçam ao serviço sair frustrada.
Entre acusações e apelos
O pior cenário parecia, porém, evitável, ao início da noite de quinta-feira. Antes de o SPAC iniciar a conferência de imprensa, havia a expectativa de que a reunião de última hora com o presidente da companhia de aviação tivesse dado frutos. Mas o sindicato, que reclama a devolução das diuturnidades suspensas desde 2011 e uma fatia entre 10% e 20% no capital, acabou por anunciar que a greve se mantinha.
Na conferência de imprensa que começou às 20h, Hélder Santinhos, da direcção do sindicato, afirmou que “os pilotos e os trabalhadores estão cansados de pagar por erros que não são seus” e garantiu que fizeram “concessões muito significativas”, acusando a TAP e o Governo de “radicalismo”. Mas, ainda assim, admitiu que “existe sempre” a possibilidade de um acordo.
Em reacção, o ministro da Economia também deixou no ar a “esperança” de que a paralisação fosse suspensa. “Apelo a que os pilotos, homens e mulheres habituados a tomar decisões em momentos delicados, trabalhem de 1 a 10 de Maio”, disse Pires de Lima.
O governante justificou o facto de não responder a mais perguntas dos jornalistas com a “esperança que a sociedade portuguesa toda ainda mantém, até à última hora,” de que a paralisação fosse desconvocada. Para o ministro, fazer mais comentários poderia colocar em causa uma eventual “reconsideração dos pilotos”, deixando transparecer a expectativa que ainda existia a essa hora, dentro do Governo, de que houvesse um acordo com o SPAC.
Estas foram as últimas declarações públicas antes da hora marcada para o início da greve, depois de uma semana de intensos ataques de parte a parte. Ainda na quinta-feira, o sindicato acusava o secretário de Estado dos Transportes de ter proferido afirmações falsas numa entrevista à SIC. E, por isso, exigia que Sérgio Monteiro pedisse desculpa ou apresentasse provas do que dissera em tribunal.
O Presidente da República também veio fazer manifestar a sua posição sobre este braço-de-ferro, deixando no ar a ideia, já defendida pelo Governo, de que esta greve poderá obrigar a uma reestruturação da companhia. “Deus queira que na TAP não aconteça aquilo que aconteceu noutros países da União Europeia, em que as companhias de aviação foram forçadas a realizar despedimentos muito significativos e a cortar nas rotas”, disse Cavaco Silva.