20% dos portugueses têm anemia mas a maioria não sabe
Estudo pioneiro avaliou a prevalência da doença em Portugal. Retrato mostra mais casos do que o se pensava e o cenário pode piorar: um terço dos portugueses têm falta de ferro, um dos principais causadores da anemia.
O estudo Empire, feito pelo Anemia Working Group Portugal (AWGP) com o apoio da farmacêutica OM Pharma, contou com entrevistas presenciais e análises feitas em 2013 a 7890 pessoas com mais de 18 anos, e traça um cenário que preocupa os especialistas. “A anemia é uma epidemia, com uma característica muito especial que é ser uma epidemia oculta. O que sabemos dela é provavelmente muito menos do que a sua realidade, quando muitas vezes é um sinal de alerta para uma patologia subjacente grave”, explicou António Robalo Nunes, presidente do AWGP e imunohemoterapeuta do Centro Hospitalar Lisboa Norte.
“A anemia condiciona de forma inegável a qualidade de vida dos doentes”, acrescentou Cândida Fonseca, investigadora principal do estudo. Para a cardiologista do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, o actual trabalho vai permitir conhecer a verdadeira realidade portuguesa e delinear estratégias para grupos e zonas específicas. Isto porque, além da prevalência geral, há grandes diferenças associadas ao sexo (20,8% das mulheres com anemia contra 18,9% dos homens), à baixa escolaridade e à idade, com a maior prevalência a acontecer entre os 18 e os 34 anos e, depois, acima dos 75 anos.
A região sul e de Lisboa e Vale do Tejo também apresenta valores mais elevados, de quase 25%, quando o norte se fica pelos 15% – uma diferença atribuída à melhor alimentação. Entre os inquiridos, apenas 2% faziam tratamentos para a doença. Sobre as grávidas em concreto, Cândida Fonseca diz que apesar de se saber que são um grupo de risco, a elevada prevalência mostra que os suplementos (como o ferro) não estão a ser dados correctamente.
António Robalo Nunes reconhece que a anemia é muitas vezes desvalorizada pelos médicos e diz que é preciso mudar tanto essa realidade como a falta de importância que lhe é atribuída pela população. “A anemia é a diminuição da concentração de hemoglobina, do número de glóbulos vermelhos no sangue, e com isso fica comprometida uma das mais nobres missões, que é a capacidade de transporte de oxigénio”, sublinhou, alertando para as consequências para o doente até em termos de desempenho cognitivo.
“A anemia afecta a saúde humana em termos individuais como depois tem repercussão nos níveis de desenvolvimento social e económico”, acrescentou, lembrando que com uma análise à hemoglobina é possível detectar a presença do problema. Considera-se que há anemia se a concentração for inferior a 12 gramas por decilitro nas mulheres e a 13 gramas nos homens.
Para os investigadores, o facto de a anemia começar a dar logo sinais aos 18 anos aponta para a necessidade de futuros estudos que incluam as crianças e adolescentes, onde acreditam que podem encontrar problemas semelhantes. Destacam também a importância de dar mais atenção às carências de ferro. O estudo estimou que um em cada três portugueses tenham deficiência de ferro, quando a falta desta substância é causa de 50% dos casos de anemia. “Os que não têm anemia hoje vão ter amanhã”, ilustra Cândida Fonseca.
Os dados do AWGP permitiram já elaborar uma norma de orientação clínica em conjunto com a Direcção-Geral da Saúde, acreditando Robalo Nunes que com esta base o tratamento em Portugal melhore. Além disso, está também em curso uma petição para criar o Dia da Anemia, como forma de aumentar a sensibilização para o problema.