Hospital dos Capuchos limita acesso de doentes com VIH enviados pelo Checkpoint

Responsáveis pelo centro de rastreio da doença, situado em Lisboa, alegam que a administração do hospital quebrou um protocolo que estava em vigor há três anos e meio. Hospital diz que não havia protocolo nenhum.

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Desde que abriu, em Abril de 2011, o CheckpointLX já detectou 277 casos de HIV positivo Miguel Manso

Desde que abriu portas no Príncipe Real, em Abril de 2011, este centro de aconselhamento e detecção precoce de VIH dirigido especialmente a homens que têm sexo com homens (HSH), forneceu de forma gratuita 7657 testes, que permitiram detectar 277 casos positivos ao vírus. Destes, 80% foram encaminhados para os Capuchos ao abrigo de um protocolo que, segundo os dirigentes do centro, foi assinado em 2011 entre o médico responsável pela consulta de Infecciologia naquela unidade e a direcção do GAT – Grupo Português de Activistas sobre Tratamentos de VIH/sida, responsável pelo CheckpointLX.

O protocolo funcionava como uma espécie de "via verde" de acesso à consulta nos Capuchos para as pessoas encaminhadas pelo centro do GAT, às quais era garantido o atendimento no prazo médio de sete dias úteis e o tratamento gratuito. No entanto, no mês passado, este "acordo informal, que tem funcionado perfeitamente, entrou em ruptura", diz Luís Mendão, presidente do GAT.

Segundo Mendão, o conselho de administração do Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC), no qual está incluído o Hospital dos Capuchos, emitiu uma circular interna estipulando que apenas poderiam ser aceites nesta unidade doentes com requisição médica ou inscritos nos centros de saúde da sua área de influência. “Na recepção, disseram-nos que a administração não tinha conhecimento do protocolo. Só ao fim de três anos e meio é que dizem isto?”, questiona João Brito, coordenador da equipa do CheckpointLX, acrescentando que já foram recusadas seis pessoas, que acabaram por ser aceites após reclamação.

Segundo este responsável, mais de metade dos homens que procuram o centro não são de Lisboa. “São de Almada, do Barreiro ou da Amadora, alguns até do Porto”, afirma. Alguns são estudantes que residem temporariamente em Lisboa e não têm o processo médico em nenhum centro de saúde da cidade.

“A decisão do CHLC é uma violação dos direitos básicos dos doentes, é ilegal. Vai contra todas as recomendações, que passam por eliminar barreiras no acesso às consultas e reconhecer os problemas de estigmatização da doença que levam muitas pessoas a recusarem ser seguidas no seu centro de saúde ou no hospital da sua área de residência”, reforça Mendão.

Questionado pelo PÚBLICO, o conselho de administração do CHLC garante que "nunca" se recusou a atender doentes de fora da área de influência, "desde que existam razões objectivas para tal". A administração afirma que "é legalmente reconhecida aos utentes do Serviço Nacional de Saúde a liberdade de escolha dos estabelecimentos e agentes prestadores de cuidados de saúde" mas lembra que "essa liberdade de escolha está, porém, condicionada pela medida dos recursos existentes, sendo exercida de acordo com as regras de organização dos serviços de saúde".

O conselho de administração informa ainda que embora "nunca" tenha tido qualquer protocolo com o Checkpoint/GAT, solicitou uma reunião ao Director do Programa Nacional para a Infecção VIH/SIDA, António Diniz, com a presença do presidente do GAT e dos directores dos Serviços de Doenças Infecciosas dos três centros hospitalares de Lisboa, "com o objectivo de encontrar uma solução imediata de referenciação destes doentes, de acordo com as regras em vigor". Até que seja encontrada esta solução, o Checkpoint está a encaminhar as pessoas infectadas para o Hospital Pulido Valente, embora sem qualquer acordo formal.

Segundo António Diniz, a possibilidade de os doentes optarem por ser seguidos num hospital de fora da sua área de residência "depende da existência de protocolos firmados entre as entidades envolvidas". De outra forma, "poderão estar condicionados pela aceitação por parte do hospital". Para o responsável pelo plano nacional para o VIH, o que importa agora não é saber se a decisão do CHLC é legítima, mas sim "criar as condições para que o doente possa ter, efectivamente, liberdade de escolha da instituição onde pretende ser seguido", como defende a maioria dos especialistas nesta área.

António Diniz diz que o Programa Nacional para a Infeção VIH/SIDA está "fortemente empenhado" em garantir o princípio da liberdade de escolha, que está associado ao modelo de financiamento e à contratualização dos hospitais em relação a esta infecção. Segundo Diniz, está "para breve" a criação de uma Rede de Referenciação Hospitalar para o tratamento da doença, que deverá ajudar a solucionar este problema.

Actualmente, os hospitais recebem um valor fixo por cada doente com VIH que tratam, sendo o número de utentes estipulado no início de cada ano e definido de acordo com as áreas de residência. No caso do CHLC, os encargos com doentes infectados com o VIH têm vindo a aumentar, sendo que este é mesmo o centro que acompanha o maior número de doentes infectados no país. Segundo o mais recente relatório de desempenho económico-financeiro do CHLC, referente a 2013, esta doença representou 55% dos encargos com medicamentos de dispensa gratuita.

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