O "custo" da interioridade na saúde
Não basta fechar serviços em prol da diminuição de custos e centralização de recursos. Deveremos garantir a essa população equidade e acessibilidade aos cuidados gerais.
Hoje, sabemos ser impossível manter as respostas em saúde que foram preconizadas aquando da criação do Serviço Nacional da Saúde (SNS). Não podemos ter todas as valências de cuidados gerais e especializados nos mesmos territórios, mas, se desejamos fixar as pessoas e famílias no interior, teremos de lhes proporcionar as respostas básicas de cuidados em saúde. Esse custo o Estado tem de perceber e suportar porque a população em geral, e a população do interior em particular, aplaudem e aceitam facilmente como um gesto de grande patriotismo e solidariedade na defesa e manutenção dos seus cidadãos nas suas comunidades.
A população do interior merece esse cuidado!
Temos vindo a assistir a uma reforma do SNS lenta e com medidas locais que não servem de todo essas populações. Faltam estudos e análises que demonstrem à comunidade os motivos e ganhos de determinadas mudanças!
Hoje, no interior das regiões, os doentes e familiares percorrem dezenas e centenas de quilómetros na procura de respostas em cuidados de saúde. Não basta fechar serviços em prol da diminuição de custos e centralização de recursos. Deveremos garantir a essa população equidade e acessibilidade aos cuidados gerais e assegurar os mecanismos de acesso aos cuidados especializados, aos cuidados continuados, aos cuidados paliativos e a outros.
Os cuidados de saúde primários (CSP) nesta reforma do SNS continuam a ser assegurados a essas populações nas diversas Unidades Funcionais, reconfiguradas e agrupadas, com procedimentos e metodologias de funcionamento diferentes. Pretende-se que cada utente tenha o seu médico e enfermeiro de família, pilares fundamentais numa equipa de saúde. O horário de funcionamento dessas Unidades é diurno, em dias úteis, o que implica que das 8h às 20h os utentes têm a assistência necessária garantida. E das 20h às 08h, aos fins-de-semana e feriados?
Tivemos recentemente conhecimento de um despacho ministerial que define os Pontos de Rede de Urgência e suas características da Rede de Serviços de Urgência, de forma a responder ao doente urgente e emergente num tempo máximo de acesso de 60 minutos. Nos territórios mais interiorizados, com condições geográficas difíceis, esse tempo previsto é facilmente ultrapassado. Acresce as deficitárias redes de comunicações em alguns locais, agravadas muitas vezes pelas condições climatéricas adversas.
Como encontrar melhores soluções?
Penso que a resposta estará numa distribuição mais equitativa e suportada nos meios de emergência pré-hospitalar nos casos de doença aguda e/ou grave. Esses meios pertencentes ao Instituto Nacional de Emergência Médica, I. P. (INEM) e acionados através do Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) do INEM encontram-se definidos e integrados na Rede de Serviços de Urgência (SU) conforme a tipologia dos níveis de resposta. Penso que aqui, os decisores políticos e técnicos podem encontrar respostas de proximidade mais adequadas, mais eficazes e seguras para as pessoas que vivem nos locais mais interiorizados.
A rede de SU e os meios do INEM deveriam ter uma articulação funcional mais próxima dos Agrupamentos dos Centros de Saúde (ACeS) com as suas Unidades Funcionais (USF; UCSP; UCC). Em cada ACeS, deveria existir um meio de emergência pré-hospitalar, uma ambulância de suporte imediato de vida (SIV) com recursos humanos que poderiam ser internos mas geridos dentro do Ponto de Rede de Urgências. Esse meio móvel, não podendo ser permanente, pelo menos que assegurasse o período de encerramento das unidades desses ACeS de forma a garantir à população os cuidados de saúde imediatos e mediatos em situações agudas e específicas.
Se as tomadas de decisão em saúde, locais e territoriais, envolvessem os seus protagonistas, não assistiríamos a tantas reações e manifestações de descontentamento. As pessoas e famílias resistiriam mais ao “custo” da interioridade e o país agradecia.
Presidente do Conselho Diretivo Regional do Norte da Ordem dos Enfermeiros