Maus tratos a idosos mais que duplicaram

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Desde o início do ano, a Linha do Cidadão Idoso recebeu 176 queixas de maus tratos físicos e psicológicos Foto: Paulo Pimenta

Segundo Maria de Oliveira, da APAV, mantém-se uma "tendência de crescimento", que, apesar de denotar que as pessoas denunciam mais estas situações, reflecte ainda a falta de formação e de preparação das famílias para cuidarem dos seus idosos. Aliás, 22 por cento dos crimes dizem respeito a maus tratos físicos e 25 por cento a psicológicos, sendo que, em metade das situações, o agressor é o cônjuge ou um filho.

Maria de Oliveira avançou ao PÚBLICO que a APAV vai lançar já no próximo dia 7 de Outubro uma nova campanha que visa sensibilizar a sociedade e os profissionais para a importância de se estar mais atento e de se prevenir a violência nesta faixa etária e que aproveita a efeméride de 1 de Outubro, Dia Internacional do Idoso. "É importante que as pessoas percebam o que é envelhecer e que estejam preparadas para alguns quadros de depressão e de demência que podem acontecer aos seus familiares. A pirâmide etária está a inverter-se e vamos ter cada vez mais idosos e pessoas mais velhas a tratar deles que não estão preparadas e que reagem por exaustão e por não terem capacidade e distância emocional. É o chamado "stress do cuidador"."

A campanha terá alguns spots, acções de formação que vão decorrer paralelamente e um manual de procedimentos, mas Maria de Oliveira defendeu que a solução passa pelo alargamento da rede de cuidados. Uma opinião partilhada pela responsável pela área do idoso da Provedoria de Justiça, Teresa Cadavez, que entende que a situação justifica um aumento das respostas institucionais, nomeadamente porque "as listas de espera para os lares são grandes e as respostas muitas vezes não são tão rápidas quanto seria necessário".

Num balanço, Teresa Cadavez informou que, desde o início do ano, a Linha do Cidadão Idoso recebeu 176 queixas de maus tratos físicos e psicológicos e 79 denúncias de abandono, o que representa um aumento de 40 por cento e de 25 por cento face a 2009, respectivamente. Ainda segundo Cadavez, os maus tratos ocorreram em ambiente familiar. "Os agressores são quase sempre familiares, na maior parte dos casos os próprios filhos", especificou, para acrescentar que, numa percentagem significativa das situações, "são os vizinhos que telefonam a denunciar". O que diz poder ser sinal tanto de um aumento efectivo de casos como de mais sensibilização. Muitos dos maus tratos reportados são de "familiares que ficam com o dinheiro das pensões".

Quinze mil à espera de lar

Nas contas do presidente da Confederação das Instituições de Solidariedade Social (CISS), Lino Maia, "haverá à volta de 15 mil idosos em lista de espera para entrar num lar", descontadas já as situações de dupla ou tripla inscrição. Esta situação deverá melhorar ligeiramente nos próximos três anos, quando abrirem portas os lares que estão a ser construídos ao abrigo do Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais. Mas não ficará resolvida, segundo Lino Maia, enquanto não for agilizado o processo de licenciamento destes equipamentos. Lino Maia recusou, contudo, estabelecer qualquer paralelo com a crise económica. "A única coisa que é clara para nós é que, depois das férias, há sempre um ligeiro aumento dos casos de abandono por parte de familiares que recorrem ao lar por um mês e que depois não aparecem."

Também António Mariano, que até ao ano passado esteve à frente da Associação de Apoio Domiciliário de Lares e Casa de Repouso, reconheceu que "as coisas estão a complicar-se muito" por falta de resposta das instituições públicas e por "medidas cegas" como "o fim da comparticipação de medicamentos a 100 por cento para pensionistas carenciados e que vão precisar de continuar a tratar-se". O responsável explicou que o número de famílias a tirar os idosos de lares é "residual", mas disse que há muitas a desistirem das listas de espera.

Já o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, Pedro Lopes, salientou que, "com o envelhecimento da população e com a situação económica, houve uma ligeira tendência para as situações de abandono nos hospitais ou de adiamento da alta crescerem". O PÚBLICO tentou ouvir o presidente do Instituto da Segurança Social, Edmundo Martinho, sem sucesso.

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