Rebeldes lançam ofensiva para quebrar cerco ao Leste de Alepo
Rockets disparados contra o Oeste da cidade mataram pelo menos 15 mortos. Operação, que o Exército diz ter rechaçado, reúne grupos islamistas, jihadistas e facções nacionalistas.
Uma aliança de grupos rebeldes sírios, incluindo jihadistas e islamistas e facções nacionalistas, lançaram nesta sexta-feira uma contra-ofensiva para quebrar o cerco aos bairros do Leste de Alepo, controlados pela oposição ao regime de Bashar al-Assad. Há informações contraditórias sobre os avanços que terão feito, mas sabe-se que pelo menos 15 civis foram mortos pelos rockets disparados contra metade ocidental da cidade, em poder do Exército sírio.
Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos – organização sediada em Londres e com uma rede de informadores em todo o país –, pelo menos 150 rockets atingiram durante a madrugada e manhã bairros no Sudoeste de Alepo, bem como o aeroporto internacional, situado a Leste da cidade, e a base militar de Nayrab, a oeste. Uma escola foi atingida e entre as vítimas mortais há pelo menos seis crianças, a que se juntam mais de cem feridos.
Os combatentes usaram também carros armadilhados, conduzidos por suicidas, para atravessar a linha da frente. Uma fonte militar síria garantiu, no entanto, à Reuters que o avanço dos rebeldes foi rechaçado e a televisão estatal anunciou que o Exército destruiu quatro carros armadilhados antes que estes atingissem os seus alvos.
“Todas as facções da Jaish al-Fatah [Exército da Conquista] anunciam o início de uma batalha para quebrar o cerco a Alepo”, disse à AFP Abu Youssef al-Muhajir, comandante e porta-voz do Ahrar al-Sham, um dos principais grupos islamistas que integram a coligação rebelde, de que faz parte também a Fatah al-Sham, o antigo braço da Al-Qaeda na Síria.
Apelo às armas
A Reuters escreve que as primeiras movimentações sugerem que o grosso das operações estão a ser levadas a cabo por combatentes vindos de fora da cidade – o exército da Conquista controla grande parte da província vizinha de Idlib e foi também dali que partiu, em Agosto, uma primeira tentativa para quebrar o cerco imposto um mês antes pelas forças leais ao Presidente Bashar al-Assad aos bairros do Leste.
Mas os grupos rebeldes sediados em Alepo, vários deles ligados ao exército Livre da Síria, confirmaram também a sua participação nas operações – “foi lançado um apelo a todos os que possam empunhar armas” disse à Reuters o porta-voz de uma das facções. Um correspondente da AFP nos bairros cercados contou que a notícia da ofensiva foi celebrada do alto dos minaretes e vários populares queimaram pneus, receando novos ataques da aviação síria e russa – uma acção que a densa nebulosidade que cobria a cidade terá impedido.
“O cerco será quebrado. Vamos proteger os civis, as escolas e os hospitais dos ataques russos e vamos levar comida e alimento ao nosso povo”, disse à AFP um comandante da brigada Nureddin al-Zinki, na mesma altura em que as agências divulgaram fotografias de carrinhas de caixa aberta, blindados e alguns bulldozers a avançar na direcção de Alepo. O Ahrar al-Sham colocou online também um vídeo em que mostra os seus combatentes a disparar salvas de rockets alegadamente contra o aeroporto internacional de Alepo, situado a Leste da cidade.
Ao final do dia, a Fatah al-Sham divulgou um comunicado em que anunciava ter conquistado o bairro de Dahiyet al-Assad, um pequeno bairro na extremidade sudoeste da cidade, mas o Observatório diz ter informações de que a rebelião apenas conseguiu entrar numa parte da zona residencial.
Reinício dos ataques?
A operação dos rebeldes foi lançada na mesma altura em que o chefe da diplomacia russa, Sergei Lavrov, recebia em Moscovo os seus homólogos da Síria e do Irão. Horas mais tarde, o Ministério da Defesa de Moscovo anunciou ter pedido autorização para retomar os bombardeamentos sobre o Leste de Alepo, suspensos desde uma “pausa humanitária” de três dias cumprida na semana passada com o objectivo de permitir a saída de feridos e de combatentes das zonas cercadas.
Um porta-voz do Presidente russo respondeu, no entanto, que o Kremlin entende que o reinício dos ataques não é “necessário para já”, explicando que a actual pausa visa dar tempo aos Estados Unidos para convencer os grupos rebeldes que apoiam na Síria a distanciar-se dos grupos terroristas – uma separação que estava prevista no acordo negociado em Setembro entre os dois países, mas que a ofensiva desta sexta-feira mostra que é cada vez menos uma opção para a rebelião considerada mais moderada.
Moscovo anunciou, ainda assim, que se reserva o direito de “usar todos os meios” para apoiar o Exército sírio na luta contra o terrorismo e um jornal Rossiiskaya Gazeta, próximo do Kremlin, anunciou que partiu já em direcção à Síria mais um contra-torpedeiro, que se vai juntar ao grupo naval que está há vários meses fundeado no Mediterrâneo e ao porta-aviões Kuznetzov que viaja actualmente em direcção à região.
Alepo, que era a maior cidade da Síria e o seu principal pólo económico, é agora terreno da mais importante batalha da guerra civil – a sua conquista, quer pelo Exército quer pela rebelião pode definir o desfecho de um conflito que, em cinco anos, provocou mais de 300 mil mortos e forçou seis milhões de pessoas a deixarem as suas casas.
Dividida a meio desde 2012, foi alvo nos últimos meses de uma violenta ofensiva das forças governamentais que culminou, em Julho, com o fecho do cerco aos bairros do Leste. Em Agosto, combatentes do exército da Conquista chegaram a quebrar o cerco, mas os militares sírios, com o apoio em terra das milícias xiitas e no ar da aviação russa, lançou no mês seguinte uma nova campanha que não só repôs o bloqueio, como submeteu os bairros do Leste a impiedosos bombardeamentos – mais de 500 pessoas morreram e duas mil ficaram feridas na zona só no último mês, levando o secretário-geral da ONU, os países ocidentais e várias organizações de defesa dos direitos humanos dizem configurar crimes de guerra. A metade Oeste da cidade, onde vivem mais de um milhão de pessoas, é um alvo frequente dos rockets disparados pelos rebeldes e de atentados reivindicados por grupos islamistas, mas tem sido ainda assim muito mais poupada à guerra que transformou Alepo num dos piores cenários de catástrofe humanitária do conflito sírio.