Fotografia
A lente de Jordana “dá voz” a uma comunidade de mulheres e skaters não-binários
Num desporto ainda dominado por homens, uma comunidade de mulheres e skaters não-binários quer deixar a sua marca, em Nova Iorque. Jordana Bermúdez fotografou esta jornada e, agora, não se consegue desprender da causa.
Jordana Bermúdez chegou a Nova Iorque com pouco mais do que um sonho. Queria que as suas fotografias contassem histórias e, por isso, inscreveu-se num curso de Fotojornalismo no Centro Internacional de Fotografia (ICP), depois de passar meses a fazer trabalho editorial para revistas e livros no México. Numa cidade onde as pessoas vão e vêm e tudo parece efémero, Jordana encontrou uma comunidade no local mais inesperado.
Costumava deambular pelas ruas de Nova Iorque à procura de algo para fotografar, quando um dia embateu com uma imagem de bowls (pista de skate) e rails a serem ocupados por mulheres e pessoas não-binárias, em vez de homens, a quem o skateboarding é tradicionalmente associado. O instinto foi começar logo a fotografar e foi essa a primeira semente para o Girls Can’t Skate, um trabalho multimédia feito para o seu curso no ICP e que encontrou sucesso mundial ao ser publicado nos Estados Unidos, em Itália e no México.
“Fiquei logo intrigada com aquele mundo. Eu cresci perto de skateparks, sempre tive uma grande conexão com esses locais e, por isso, foi quase como encontrar um sítio familiar no meio do desconhecido. Comecei a falar com as pessoas que lá estavam e descobri que existia estes dois grupos de ajuda, cujo objectivo era formar um espaço seguro para mulheres e não-binários conseguirem andar de skate, um desporto ainda dominado pelos homens”, revela por videochamada ao P3.
A fotógrafa de 33 anos integrou-se rapidamente neste mundo e começou a participar nos encontros organizados pelos dois grupos que descobriu, a Grlswirl NYC e a Quell Skateboarding, embora não soubesse andar de skate. “Eu venho do México, que ainda é um país com uma grande cultura machista e muito perigoso tanto para mulheres, como para não-binários. O que mais me atraiu nestes grupos foi a mensagem de empoderamento que estavam a tentar transmitir. Eu senti a necessidade de documentar e dar-lhes uma voz, já que o meu trabalho se foca em desigualdades de género e grupos marginalizados”.
Começou a fotografar a comunidade por volta de Dezembro de 2019 e, até agora, ainda não parou. Afirma estar “demasiado conectada” para abrir mão do projecto, que já conta com dezenas de retratos e GIF e, devido à pandemia da covid-19 que fechou os skateparks em Nova Iorque, entrevistas em vídeo e sessões de fotos virtuais. “Ao início, eu não estava muito contente com o resultado destas sessões feitas pelo Zoom e pelo FaceTime, porque não podia usar a minha câmara. Tinha de estar constantemente a pedir às pessoas para se aproximarem da janela ou tentar outra luz. Era tudo muito experimental, até que mostrei os resultados aos meus colegas e professores e eles adoraram. Eu acabei por começar a gostar também”, explica.
Ao trocar os retratos presenciais por virtuais, a fotógrafa conseguiu alargar o projecto a mais países, como o Brasil e a Noruega, ao mesmo tempo que constituiu uma oportunidade para conhecer melhor e entranhar-se, ainda mais, na comunidade. Jordana e a sua lente já se tornaram figuras familiares naquele parque de Nova Iorque, mas andar de skate continua a ser um sonho que a fotógrafa não partilha com a comunidade. “Eu vejo aquelas bowls enormes que os parques têm, vejo as pessoas constantemente a caírem, e digo sempre ‘não, obrigado’. Acho que é demasiado tarde e eu estou bem sem acidentes.”
Texto editado por Ana Maria Henriques