No Carnaval de São Miguel há uma batalha de sacos de plástico: a tradição justifica tudo?

Hugo Moreira
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São “milhares e milhares” os sacos de plástico que cobrem as ruas de Ponta Delgada, em São Miguel, quando a Batalha das Limas acaba. Inicialmente feita com flores, a "batalha", que acontece no dia de Carnaval, passou a dada altura a ser feita com limas — uma espécie de bolas de parafina — e actualmente usa como "arma" sacos de plástico cheios de água. Terça-feira, 5 de Março, quando a diversão acabou, Hugo Moreira, fotógrafo açoriano de 22 anos, decidiu registar o reverso da medalha: “É verdade que a Batalha das Limas é uma tradição tipicamente micaelense, mas também é verdade que a tradição não justifica tudo”, aponta.

A tradição é, de facto, centenária, mas Hugo não é o único que se começa a manifestar contra aquilo que pode ser “um contra-senso”: “Os governos assinam programas e tentam educar as pessoas para a não utilização do plástico descartável, mas, por outro lado, permitem que se faça um atentado deste género”, afirma José Pedro Medeiros, presidente da associação ambientalista Amigos do Calhau. O fotógrafo subscreve: “É difícil compreender como se é contra a utilização de sacos de plástico nas compras e de palhinhas nos bares durante 364 dias por ano, mas depois se defende com unhas e dentes que nesta tradição ‘não se pode tocar’ ou pensar em alternativas.”

No ano passado, a associação tinha mostrado o seu descontentamento à Câmara Municipal de Ponta Delgada (CMPD) através de um comunicado: “O único efeito que surtiu foi uma limpeza mais rápida por parte dos serviços do município”, refere José Pedro Medeiros. “Antes do desfile [deste ano] também fizemos um comunicado, mas não surtiu efeito”, continua. Também Os Verdes se manifestaram contra a utilização de plástico no evento. Em comunicado publicado no site, o partido afirmou não se opor à tradição, mas ressalvou que “este festejo popular só deve ser permitido com materiais biodegradáveis ou reutilizáveis”.

Em declarações escritas ao P3, a CMPD garantiu que “os serviços de higiene e limpeza urbana de Ponta Delgada asseguraram uma rápida e integral limpeza e controlo das consequências do evento”. Mas “por maior que seja o esforço das equipas de limpeza”, Hugo Moreira refere que “há sempre ‘restos’ da batalha, pela cidade e junto ao mar, que está a poucos metros da marginal”. E “mesmo que a limpeza fosse perfeita”, não seria eliminado “o facto de se estar a falar de plástico utilizado apenas uma vez e de haver, decerto, outras soluções”. José Pedro Medeiros fala também no desperdício de água: “Temos preocupações com a seca durante o Verão, é ridículo desperdiçar milhões de litros de água numa situação destas.”

Alternativas? Voltar às flores “não seria sustentável”, acredita o presidente da Amigos do Calhau. “É preciso parar e pensar numa solução.” A CMPD afirma estar “a trabalhar com vista a encontrar alternativas ao uso do plástico que sejam, por um lado, mais amigas do ambiente e, por outro, que não coloquem em causa a tradição”. Afinal, “pedir que se pense em alternativas não significa que se seja a favor do fim da celebração”, remata Hugo.

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