Fotografia

Como a força do mar pode “sarar cicatrizes” do cancro da mama

Miana Jun
Fotogaleria
Miana Jun

Quando Rebecca Pine foi diagnosticada com cancro da mama, passava muito tempo na praia. E a escrever. A natureza, as ondas e o rugir do mar em Long Island, Nova Iorque, eram uma “terapia” quando, aos 33 anos, um mês antes de se casar — com um estilo de vida saudável, um filho e desejos de outros a caminho —, o diagnóstico a apanhou de surpresa, conta, por email, ao P3. Sobreviveu, continuou sempre a visitar o mar, a vê-lo transformar conchas e objectos, e, depois de acabar de relatar a sua experiência com palavras, queria uma fotografia para mostrar um momento em particular. Escolheu-o porque foi especialmente difícil encontrá-lo retratado durante a sua pesquisa, antes da mastectomia. Já trazia a imagem na cabeça quando se encontrou com a fotógrafa, Miana Jun: queria ver-se e mostrar-se a amamentar a filha com a mama que o cancro não tinha levado. O retrato foi tirado pouco tempo depois de uma segunda mastectomia por prevenção, uma vez que a norte-americana foi também diagnosticada com uma alteração hereditária no gene BRCA1, que aumenta significativamente o risco de cancro.

Foi nesse encontro com Miana que começou a história do projecto The Breast And The Sea, que proporcionou a tantas mulheres um final feliz. É que, mais do que contar a sua experiência, Rebecca estava interessada em conhecer e escrever a de outras “sobreviventes”, como chama às mulheres nestas fotografias. Queria ajudar a “sarar-lhes as cicatrizes” e, para isso, tinha de as deixar bem à mostra. “Partilhar imagens das nossas cicatrizes ajuda outros que vão passar pelo mesmo a ter uma noção melhor de como vai ficar o seu corpo”, defende. "E ajuda-nos a não nos sentimos tão sozinhas."

O projecto documental começou em 2013 e as duas mulheres deram o primeiro workshop sobre “o processo de cura interior e celebração de si mesmas e do mar” um ano depois. O local escolhido? O mar de Long Island, claro. “É incrível como os participantes se sentem realizados e renovados depois de passarem tempo na água, com o ar fresco, os pássaros, o céu e uns com os outros”, conta a fotógrafa. “Eu tento mesmo capturar e sentir a interconectividade com todas as formas de vida nesse retrato.”

As mulheres entram na água juntas, como se vê nestas fotografias, e a primeira sensação, diz, é de “libertação”. Depois é a “paz e o laço de irmandade que se começa a formar entre as várias participantes”. As emoções que se seguem são difíceis de prever. “Os workshops envolvem uma conexão entre as sobreviventes e uma partilha íntima, atém de uma expressão criativa como, por exemplo, uma sequência de movimentos dentro de água”, explica. O objectivo é voltar a pôr nas mãos das mulheres a sua própria definição de beleza. Na opinião de Rebecca, “a maneira como os corpos das mulheres mudam durante o cancro da mama é diferente de como outros tipos de cancro afectam a imagem corporal”. “Altera as partes do nosso corpo que a sociedade diz serem as nossas características mais femininas e nós queremos normalizar estas alterações”, diz. As imagens, muitas das vezes, servem como ajuda “à decisão de fazer ou não reconstrução mamária”.

“Eu vi em primeira mão como o projecto transformou as mulheres que participaram”, sublinha. “Estas imagens expressam momentos de verdade, que inspiram e encorajam.” Isto pode significar “dor e lágrimas”, mas também “alegria e felicidade”. O que Miana faz é retratar a sua viagem emocional, dentro do mar, que “tem a capacidade de nos reflectir e de nos suportar de formas que mais nenhum elemento consegue”. “Serem vistas é uma parte gigante do processo de cura”, acredita. As histórias que resultam das mais de 75 entrevistas a sobreviventes, pacientes e especialistas em tratamentos do cancro da mama vão ser reunidas em livro, que as autoras esperam ver publicado em 2018.

Esta segunda-feira, 30 de Outubro, celebra-se o Dia Nacional da Prevenção do Cancro da Mama. Em Portugal, todos os anos, são detectados “cerca de 6000 novos casos de cancro da mama e 1500 mulheres morrem com esta doença”, lê-se no site oficial da Liga Contra o Cancro.

Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun
Miana Jun