Na décima passagem pelo Milhões os totalistas Riding Pânico tocam num castelo só para eles

Concerto Riding Panico, fotografia de Paulo Pimenta
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Concerto Riding Panico, fotografia de Paulo Pimenta

Os Riding Pânico vão lançados nas primeiras músicas do alinhamento do concerto centrado no novo álbum, Rabo de Cavalo, no último dia do Milhões de Festa. Dez edições tem o festival, dez vezes tocou lá a banda instrumental. O som sai directo dos amplificadores, sem passar por um PA, e o público, a meio de uma tarde soalheira, tenta aproveitar a sombra que as paredes da ruína do Paço dos Condes de Barcelos vão fazendo. Fábio Jevelim (guitarrista) toca sentado ao sol numa das entradas que sobra do edifício de pedra. Os outros cinco, Makoto Yagyu (baixo), João Nogueira (guitarra), Miguel Abelaira (bateria), Shela (teclas) e Zé Penacho (guitarra), refugiam-se entre paredes. Do nada, surge um elemento estranho que invade o espaço reservado à banda que toca sem palco. Dirige-se ao teclista, toca-lhe no ombro e fala-lhe ao ouvido. Pois se tocassem mais baixinho o senhor agradecia. Há quem esteja a rezar na igreja do lado e a música atrapalha. O recado foi dado pode então sair de cena. No final da música, Shela sente-se na obrigação de dar uma justificação ao homem. Aponta para os amplificadores e diz que a culpa é dos guitarristas que tocam muito alto. Naquele dia, o Castelo, como também é conhecido o espaço, era dos Riding Pânico, que não falharam uma edição do festival, e por isso até ao final do concerto o volume do som foi o mesmo. A relação dos Riding Pânico com o festival já é longa. Começa em 2006, na primeira edição, na altura no Porto, quando tocaram no extinto Uptown para uma plateia que não passava das 30 pessoas. O guitarrista, João Nogueira, depois do concerto, explica-nos que é aí que nasce “um acordo de cavalheiros”, entre a banda e Joaquim Durães, responsável pelo festival. Seguiu-se Braga em 2007, antes do Milhões se mudar definitivamente para Barcelos em 2010, e todas as edições seguintes. Antes disso já existia uma ligação a Joaquim Durães, também conhecido como Fua, na altura em que estava a criar a Lovers & Lollypops. “O Fua já tinha organizado uns concertos connosco. É uma pessoa fácil de se gostar e ficamos amigos a partir daí”, recorda. Os Riding Pânico já tocaram em todos os palcos que havia para tocar no Milhões. No Castelo foi uma estreia. O concerto foi anunciada apenas meia hora antes de começar. A organização optou por guardar a surpresa até a hora da actuação se aproximar. Fora do recinto do festival, numa zona alta da cidade, a ruína do edifício construído no século XV tem vista para Barcelinhos. Até lá deslocaram-se perto de uma centena de pessoas que não se assustaram com a pequena caminhada. Não chegou lá um PA. A banda tocou com som directo. O baixista, Makoto Yagyu, conta que naquele dia acordou com pouca disposição para tocar. Agradou-lhe o cenário idílico e logo a disposição mudou. No local onde o material foi montado, está “um sarcófago com centenas de anos”. “É aqui que vamos tocar? Siga montar as coisas”. A apresentarem o novo álbum, Fábio Jevelim, como o resto dos colegas, preferia ter tido acesso a um PA. “Tocamos com 3 guitarras, se o som não estiver controlado pode tornar-se mais confuso. Quando uma guitarra está mais à frente e as outras estão atrás a fazer cama, sem o PA, é mais difícil controlar essa mistura”, diz. Essa preocupação tem mais a ver com o público do que propriamente com a banda: “O público precisava de ouvir o álbum de forma melhor. No entanto, a estética do espaço é fixe e ajuda a puxar por nós. Acho que ajudou para que estivéssemos numa boa onda”. Rabo de Cavalo, a terceira longa duração, é um álbum muito distante do post-rock de Lady Cobra (2008). Nas músicas há mais coisas a acontecer ao mesmo tempo, mais camadas, ao contrário do formato clássico da estrutura post-rock assente em crescendos. Neste trabalho, há mais espaço para explorar novas abordagens, sem que se identifique um género em particular que seja mais constante. Em comparação com os dois anteriores será talvez o mais livre e o mais instintivo. Como músico, Fábio diz gostar de ir à procura de um som que não existe. Quando foi convidado para entrar na banda sabia que a direcção a seguir teria que ser outra. “Quando começaram faziam post-rock e eu odeio post-rock”, diz, seguido de gargalhada dos músicos. “Somos amigos há muitos anos mas eles tinham essa base post-rock que eu não tenho. Tinha 14 anos quando vi Mogwai no Paredes e Coura e achei uma seca do caraças”, recorda. “Quando entrei para a banda o ponto de partida passou por responder à questão: como fazer uma banda instrumental sem ser post-rock?”. João diz que o grupo precisava desse “boost”, dessa energia que o colega guitarrista trouxe. Com a saída de som directo dos amplificadores, as músicas saíram numa versão mais crua do que na gravação. Sem descurar a execução dos temas houve tempo para tudo e mais qualquer coisa. Houve tempo para recuar ao passado, com Blueberry Surprise, do segundo álbum, Homem Elefante, ou com E Se A Bela For O Monstro, do primeiro. A acabar deu para um improviso de vários minutos, com tempo para solos de guitarra, passagens breves pelo reggae, com o baterista Miguel Abelaira a aguentar o ritmo mesmo sem estar nas melhores condições físicas. As muletas pousadas ao lado da bateria provavam isso. O problema que teve nos últimos dias com um pé não se fez sentir na performance. A banda entrou em modo jam session e o concerto deixou de obedecer à lei do limite da duração das actuações de um festival com várias bandas. O Castelo era deles, controlavam eles o tempo. Todos os músicos da banda estão envolvidos com outros projectos, tais como Paus, Cruzes Credo, Quelle Dead Gazelle, LAmA ou Marvel Lima. São os Riding Pânico um ponto de encontro entre amigos. “Uma banda de bairro”, diz João. Banda de bairro que em termos musicais não facilita. Contudo, é essa abordagem que diz ser o segredo para que ao fim de mais de uma década ainda consigam “aturar-se uns aos outros”. Será por isso que dizem enquadrar-se “tão bem” num festival como o Milhões de Festa. “Este é um festival familiar. Não vimos cá tocar apenas como uma banda contratada. Já aconteceu ensaiarmos só para tocar no festival, mesmo sem material novo e muitas vezes sem banda, ao ponto de chamarmos amigos para tocarem connosco”, diz Fábio que considera que este é “um festival com carisma que nunca quis explorar uma vertente mais comercial. Seria fácil abrir as portas a marcas. Preferiram manter-se no mesmo lugar que tinham e a dar não só aquilo que o público quer, mas a também a oportunidade de descobriram coisas novas”.

Concerto Riding Panico, fotografia de Paulo Pimenta
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