Pinturas em acção a partir do real

"Uma história de amor", no Chiado 8, assinala o regresso, a título individual, de Bruno Pacheco ao contexto expositivo português. E dá conta, com três núcleos de obras produzidas desde 2009, de uma nova fase do seu trabalho. Escrevemos "nova" com cautela. Porque a pintura de Bruno Pacheco continua a nascer e a crescer a partir de fotografias encontradas ou produzidas por ele. Ou seja: continua a ganhar corpo a partir de outro corpo. E porque reencontramos objectos tridimensionais ou situados algures entre a escultura e pintura, como tinha acontecido há dois anos na Galeria Marz, em Lisboa, e na Culturgest do Porto.Dito isto, avistam-se desenvolvimentos. Ainda presente, a referencialidade das imagens fotográficas (conservando o primeiro olhar do pintor) é agora mais ambígua, fragmentada e desconcertante. E o dispositivo da série (presente nos pinturas dedicadas a grupos de pessoas que Bruno Pacheco realizou no passado) cedeu o lugar a uma ideia de montagem ou de edição que deixa ao espectador a liberdade de construir - com as cores, formas e superfícies disponíveis - as suas próprias narrativas.

O material dessas narrativas pode ser a história da pintura, tomando o modernismo como ponto de partida, ou a simples relação com as imagens, sendo que Bruno Pacheco nunca impõe um guião ou uma orientação prescritiva. "The Possible Ball" (2009) é uma esfera semelhante a uma bola de pano e tem uma escala quase humana, convidando ao toque, ao movimento do corpo (do espectador). Entretanto, um olhar mais atento descobre imperfeições, inchaços, manchas: o pano é, afinal, um conjunto de telas que o artista recortou, coseu e virou para o interior. Duvidará ele, afinal, das imagens?

Nem por isso. "Nudists.com" (2009)" e Revelation/Shelter" (2010) mostram, respectivamente, um casal de nudistas e naves espaciais. A alusão ao Jardim do Éden e à vida extraterrestre é inevitável (e daí também as relações que se sugerem com a esfera como representação do mundo), mas o que estas pinturas reivindicam é uma crença na emancipação das imagens. Na sua independência relativamente a convenções e hierarquias.

Uma crença que surge retomada nos sete expositores que constituem "R., O., Y., G., B., V.," (2010-2011). Semelhantes aos módulos usados para mostrar posters ou amostras de pavimentos, contêm pinturas sobre papel, e cada um remete para uma das cores do arco-íris. Esta condição surge, aliás, anunciada numa serigrafia em que é possível descobrir a frase que os ingleses usam para fixar essas mesmas cores: "Richard of York Gave Battle in Vain: red, orange, yellow, green, blue, indigo e violet".

Mas regressemos aos módulos. Amovíveis, ocultam e revelam como folhas de um livro e habitam a sala como corpos cuja configuração no espaço depende da acção do espectador. E o que revelam e ocultam? Paisagens, monocromias, objectos, figuração, abstracções. Certas pinturas apresentam um cariz naturalista, outras parecem estudos. Por vezes, vêem-se pinceladas fortes, densidade e carne, ou coisas criadas por gestos discretos, leves. Na mesma série, alguns motivos transformam-se (como uma rapariga de gorro que parece definir a paisagem) ou repetem-se (a série das luvas). E há "zooms", separadores, "fade outs", imagens que entram em conflito com outras imagens.

As pinturas de Bruno Pacheco não dizem nada. Mesmo quando rememoram histórias da história da pintura (com alguns dos seus nomes), deixam essa responsabilidade a quem as olha. Veja-se a série "Folding Box", exposta na última sala. São pinturas de caixas de papel que o artista fotografou. Formas geométricas, naturezas-mortas, jogos de luz e de sombras (como em "The Possible Ball"), figuras, corpos. A pintura em acção a partir do real.

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