Seguimo Aquí — a afirmação da essência cultural de Porto Rico por Bad Bunny

Com o álbum Debí Tirar Más Fotos, Bad Bunny afirma a essência cultural de Porto Rico, através do poder das fotografias, da conjuntura nacional deste país e de ritmos musicais tradicionais.

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DtMF Bad Bunny Frazer Harrison
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Debí Tirar Más Fotos (“Devia ter tirado mais fotografias”, traduzindo para português), o mais recente álbum de Bad Bunny, o cantor oriundo de Porto Rico, é composto por inúmeras músicas com ritmos que fazem o nosso corpo, instintivamente, movimentar-se. No entanto, este álbum é muito mais que um mero conjunto de músicas de reggaeton, sendo, no cerne da sua criação, cultura, tradição, nostalgia e um amor à vida e a um país abandonado por muitos e esquecido por outros tantos. Assim, este é, sem dúvida, o álbum mais porto-riquenho de Bad Bunny.

Muitos poderão questionar o motivo pelo qual Bad Bunny lançou, neste momento, um álbum tão marcadamente porto-riquenho, quando alcançou uma sólida carreira internacional, podendo ter apostado num certo registo musical mais comercial, que pudesse alargar o seu número de ouvintes. Contudo, talvez seja por, justamente estar sob os maiores holofotes do mundo, que tenha escolhido destacar destacar a essência cultural de Porto Rico, através do poder das fotografias e memórias, da referência à conjuntura social, económica e política desta ilha e da música e ritmos tradicionais deste país.

A forma como Bad Bunny aborda o tema das memórias e da nostalgia, através das fotografias, é extremamente emocional e algo com o qual, certamente, muitas pessoas, independentemente do local onde nasceram, se podem identificar.

Nesses termos, a canção DtMF, leva-nos a reflectir sobre o objectivo primordial da fotografia e sobre o processo de decisão da sua captação. A importância e motivo de captar uma fotografia não é, ou pelo menos não deveria ser, por motivos materiais, que se enquadram na forma como as fotografias são percepcionadas hoje em dia no contexto das redes sociais. Tiramos, ou, mais uma vez, deveríamos tirar uma fotografia porque queremos combater o esquecimento de momentos que nos fizeram ignorar que existe todo um mundo caótico e confuso fora desse lugar em que nos encontrávamos e de pessoas que tornaram a palavra “amor”, algo concreto e real, que vamos guardar para toda a nossa vida num sítio em que apenas nós o conhecemos.

Por isso, falar de fotografias, é falar de família, comunidade, amizade e amor — ​o que realmente importa na vida.

Além disso, no seu mais recente álbum, Bad Bunny, além do impactante poder das fotografias, fala-nos também sobre o amor e orgulho que tem por Porto Rico. Por um lado, há, a valorização da história e defesa da identidade nacional da ilha caribenha, visível, por exemplo, pelo facto da primeira música do álbum, NUEVAYoll, abordar a íntima relação histórica entre Porto Rico e Nova Iorque, na qual foi criada a bandeira nacional deste país ou pelo facto de nos vídeos das músicas termos a possibilidade de ler várias descrições de momentos da história de Porto Rico.

Por outro lado, há a questão da identidade cultural deste país, que se encontra, como em outras tantas partes do mundo, ameaçada por interesses económicos, que no caso de Porto Rico, são, em algumas situações, apoiados pelo próprio governo nacional. Esta situação traduz-se, em termos práticos, no turismo massificado, na gentrificação e na subida do custo de vida, o que leva ao abandono de muitos jovens porto-riquenhos do país.

Enquanto isso, múltiplos empresários, designadamente norte-americanos, pretendem construir grandes empreendedorismos turísticos, alguns deles, em terras protegidos e espaços outrora públicos (“Quieren quitarme el río y también la playa; Quieren el barrio mío y que abuelita se vaya”, LO QUE LE PASÓ A HAWAii).

Todavia, a valorização da essência cultural da ilha de Porto Rico, não se faz apenas pela referência ao poder das fotografias ou pela crítica ao presente e possível futuro da Ilha caribenha, fazendo-se também pela celebração da música tradicional de Porto Rico, agora combinada com sons e ritmos mais modernos. Para isso, o cantor recupera certos ritmos musicais tradicionais, como a plena, levando as novas gerações de porto-riquenhos a valorizarem o seu país e a sua cultura, através da memória trazida pelos seus antepassados, por meio de ritmos musicais e de letras intemporais.

Com efeito, este é um álbum que cruza identidade, memória e um país que luta pela subsistência da sua cultura e história. E é a mais bonita carta de amor que Bad Bunny poderia ter alguma vez escrito e oferecido a Porto Rico e a todos os porto-riquenhos

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