Gestão do INEM deve ser investigada até às últimas consequências, defende sindicato

Rui Lázaro, presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar, diz que conclusões do relatório da Inspecção-geral das Actividades em Saúde devem ser enviadas ao Ministério Público.

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As associações dos técnicos de emergência médica (ANTEM) e dos técnicos de emergência pré-hospitalar (ANTEPH) destacaram que o socorro à população "vai muito além do INEM" Daniel Rocha
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O presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (STEPH), Rui Lázaro, considerou que o projecto de relatório da auditoria da Inspecção-geral das Actividades em Saúde (IGAS) à legalidade e eficiência da gestão do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) vem corroborar todas as denúncias que o sindicato tem feito ao longo dos últimos anos em relação à gestão dos recursos humanos e financeiros.

“Já esperávamos que as conclusões deste relatório fossem neste sentido de responsabilizar o anterior Conselho Directivo do INEM pelo degradar constante dos serviços médicos de emergência do INEM”, afirmou este sábado em declarações ao PÚBLICO, acrescentando que o mesmo deve ser “enviado ao Ministério Público (MP) para que a gestão anterior do INEM [liderada por Luís Meira], seja investigada até às últimas consequências”.

Rui Lázaro destacou, por exemplo, a questão da falta de recursos humanos, que o actual presidente em exercício, Sérgio Janeiro, já reconheceu publicamente e que obriga a recorrer a muitas horas extras.

“O relatório é muito claro e diz que perante o número cada vez menor de técnicos de emergência pré-hospitalar não foi adoptada qualquer medida que visasse nem atrair ou fixar recursos humanos. E que enquanto o número de chamadas aumentava, sobretudo no turno da manhã (08h00/16h00) que é o que apresenta maior taxa de chamadas abandonadas, menos técnicos havia”, afirmou, frisando que “isto pode explicar os atrasos que vieram a público ao longo dos últimos tempos e que podem estar na origem das 11 mortes que foram divulgadas” durante a greve às horas extraordinárias dos técnicos de emergência pré-hospitalar no início de Novembro e que estão a ser investigadas também pelas IGAS e pelo Ministério Público.

Outra questão apontada pela IGAS está relacionada com o recurso excessivo aos ajustes directos. “O relatório considerou que não tinham justificação e a isto juntam-se algumas nomeações para cargos de direcção intermédia do INEM que não terão cumprido os requisitos legais, bem como o acesso à categoria de coordenador de técnico de emergência pré-hospitalar, cujos nomeados não detinham a formação específica para o efeito", enumerou. Para Rui Lázaro, “era importante que o Ministério Público investigasse” tudo isto.

A propósito do mesmo relatório, as associações dos técnicos de emergência médica (ANTEM) e dos técnicos de emergência pré-hospitalar (ANTEPH) destacaram que o socorro à população "vai muito além do INEM", impondo-se apostar na formação e carreira dos técnicos de emergência."Oitenta a 90% do socorro é feito pelos bombeiros e pela Cruz Vermelha. Portanto, mesmo quando o INEM tiver os quadros completos - e nós defendemos tudo o que está a ser feito para tornar a carreira mais atractiva, para que o INEM possa ter uma força de elite de 1200 homens - os problemas do socorro só se resolvem quando o técnico de emergência médica pré-hospitalar for uma profissão. E ainda não chegamos lá", afirmou à Lusa o presidente da Associação Nacional dos Técnicos de Emergência Pré-hospitalar (ANTEPH).

Luís Canaria lamentou que ainda não tenha sido abordado "o real problema dos técnicos" de emergência pré-hospitalar. "Estamos a reviver aquilo que se passou em 2016. Criou-se uma carreira especial da função pública, existem dezenas de técnicos que já saíram (muitos deles agora, com esta renovação da carreira, até poderiam ter interesse em voltar, se fosse feito um concurso de mobilidade na Administração Pública), mas o que importa (e aqui acreditamos que haja "lobbies" por parte da Ordem dos Enfermeiros e também de alguns médicos para que isso não aconteça) é deixar que se crie a profissão de técnico de emergência médica", sustentou.

Também o presidente da Associação Nacional dos Técnicos de Emergência Médica (ANTEM), Paulo Paço, lembra que os técnicos do INEM "representam apenas cerca de 10% da resposta dos serviços médicos de emergência em Portugal". "Uma vez mais, reiteramos que aquilo que realmente é pertinente é que todos os operadores tenham uma formação mais diferenciada", afirma, sustentando que "a formação dos operacionais que operam na rua é muito deficiente e fica muito abaixo daquilo que é a média europeia e outras referências a nível internacional".

Como resultado, refere o dirigente associativo, um técnico que actualmente saia dos quadros do INEM e pretenda trabalhar no estrangeiro "pura e simplesmente não tem colocação, porque a carreira especial dos técnicos de emergência pré-hospitalar é uma coisa específica e única de Portugal".

Relativamente às conclusões do relatório da IGAS, Paulo Paço refere que "nenhuma é novidade", estando em causa situações para as quais a associação "tem vindo a chamar a atenção nos últimos anos".

A Fénix - Associação Nacional de Bombeiros e Agentes de Protecção Civil defendeu este sábado que toda a formação dos técnicos de emergência médica actualmente prestada, com "má qualidade", pelo INEM deve passar "exclusivamente para as faculdades de Medicina".

"A FENIX-ANBAPC defende que toda a formação INEM, IP deverá passar exclusivamente para as faculdades de Medicina, garantindo assim, todos os aspectos fundamentais para que Portugal detenha excelentes provedores de cuidados médicos de emergência, altamente educados, treinados e qualificados providenciando um serviço de excelência às comunidades, focados nos pacientes", lê-se num comunicado divulgado hoje.

Para a associação Fénix, o INEM deverá ficar apenas responsável por "produzir a autorização para a prática da actividade" e por "executar o controlo da mesma, nos padrões e métricas cientificamente validadas", produzindo "a cada dois anos as chamadas certificações de prática".

Salientando que na auditoria "foram apuradas diversas insuficiências e suspeitas de ilegalidades", a Fénix refere que "infelizmente não são novidade", tendo várias das situações elencadas sido "por várias vezes apresentadas em sede própria, sem terem tido a atenção devida". Como resultado, sustenta, a emergência médica em Portugal chegou ao "estado lastimável em que se encontra".

Entre as várias situações de "gravidade extrema" detectadas, a associação Fénix lembra que "desde sempre que alertou para o facto de que a formação INEM, I.P. é de má qualidade" e não é sujeita a "qualquer auditoria e controlo".

"No que diz respeito em especial à formação TAT [Tripulante de Ambulância de Transporte] e TAS [Tripulante de Ambulância de Socorro], ministrada aos corpos de bombeiros e Cruz Vermelha Portuguesa através de várias entidades acreditadas pelo INEM, revela-se a falta de auditoria. Ora, não havendo auditoria e acompanhamento não podem ser garantidos os padrões, o que nos leva a colocar em causa toda a formação que foi ministrada", sustenta.