O fim de uma relação e o movimento de libertação
Perante o descontentamento, manter ou romper um vínculo exige movimento. A mudança pode seguir caminhos distintos, sendo um deles a reconstrução conjugal, outro, a separação.
As relações de intimidade que satisfazem as necessidades de cuidado, afeto, cumplicidade e lealdade são indubitavelmente positivas para a saúde física e mental dos seres humanos. Sentimo-nos bem na presença ou perante a representação mental de alguém que nos proporciona segurança.
As expectativas e as experiências exercem influência nas relações, sendo as primeiras representadas pelas aspirações de confiança, dedicação, carinho e respeito, que tendem a ser mais elevadas no início do relacionamento. As experiências resultam da vivência partilhada ao longo do tempo. A presença de uma acentuada disparidade entre as expectativas e a experiência requer a necessidade de redução da expectativa ou a melhoria da experiência. Conclui-se com facilidade que a constante diminuição das expectativas como resultado de uma experiência insatisfatória compromete o vínculo relacional.
Perante o descontentamento, manter ou romper um vínculo exige movimento. A mudança pode seguir caminhos distintos, sendo um deles a reconstrução conjugal, outro, a separação.
Recompor a conexão emocional numa relação que está enfraquecida é um desafio. A mera vontade não é suficiente, é preciso empenho. Requer a criação de uma nova dinâmica relacional que se fundamenta numa reflexão em conjunto, na ação, no compromisso e na dedicação. Diante do rompimento, o movimento deve ser outro. Não o movimento acelerado do tempo atual onde tudo acontece a uma velocidade maior do que aquela com que se deve abraçar as emoções; nem um movimento abreviado que obriga a esquecer o outro sem tempo a perder — como se os sentimentos seguissem sozinhos o seu caminho. Para quem se sente devastado não é assim. O amor não gosta de decisões racionais, teima em permanecer mesmo sem ninguém querer.
Na sequência da separação, é comum haver lugar a um conjunto de emoções dolorosas e até contraditórias — raiva, culpa, abandono, tristeza, alívio, entre outras — que, quando vividas, representam uma oportunidade para fortalecer quem ficou ferido e garantir o impulso de prosseguir com a vida. A libertação do vínculo com alguém com quem já não se pode ou não se quer estar envolve aceitar e não fugir às emoções difíceis. Permitir este contacto vai ajudar a transformá-las.
A consciência das perdas e dos ganhos representa um passo importante para seguir em frente, mesmo para aqueles que sentem que perderam mais. Há quem encontre satisfação no fim da relação — como escreveu Bob Dylan, Don't think twice, it's all right. Há quem só perceba com o passar do tempo que foi melhor assim e há quem fique paralisado pelas lembranças e assuntos não resolvidos que envolvem uma bagagem emocional pesada que pode transformar-se em ressentimentos. Avançar torna-se duro, quase cruel. Quem preferia ter preservado a relação pode sentir-se indesejado, culpado, traído. Ser rejeitado por alguém em quem se confiava e amava fragiliza e causa sofrimento a qualquer um.
Depois de ter sido transportado para um lugar árido, é natural demorar algum tempo, que é conveniente respeitar, até ser capaz de aceitar as emoções e tolerar a exposição ao que é doloroso. A oscilação emocional é esperada — o dia pode começar com sentimentos de tristeza intercalados com a raiva. Importa dar espaço a cada emoção, identificando-as e encontrando palavras que as descrevam, incluindo o que é estranho, difícil, ou até positivo sobre o rompimento.
Durante este processo, que se pretende regenerativo, há perdas invisíveis a serem cicatrizadas (a esperança, os sonhos, as férias programadas a dois). É essencial identificar e sentir cada uma à medida que a pessoa processa o fim da relação e começa a mover-se em direção aos outros e à vida, sendo este caminho pautado por avanços, retrocessos, paragens e recomeços até alcançar a ressignificação.
Este é um movimento pela reconquista da dignidade e do valor de quem está a sofrer. A evolução irá requerer tempo até que seja possível organizar aquela parte da história de vida partilhada com uma pessoa com quem, em determinado momento, teve um passado em comum, mas que, doravante, passa a ocupar outro lugar. A rede social de apoio poderá servir de amparo neste caminho, embora, dada a complexidade da vivência a dois, muitas variáveis envolvidas no rompimento de uma relação, incluindo o luto, possam não ser compreendidas, tornando-se alvo de crítica.
A separação opõe-se diretamente aos ideais sociais dos casais felizes para sempre. Como resultado, muitas pessoas que terminam uma relação, mesmo que por vontade própria, relatam sentir receio e vergonha de falar sobre a experiência, dadas as suposições implícitas à volta do distanciamento do casal.
Por fim, a pessoa vai precisar de voltar a acreditar que tem valor e que as suas necessidades de afeto e de cuidados podem voltar a ser satisfeitas, embora tenha sido magoada, traída ou tenha perdido alguém de quem gostava. Mover-se perante o fim de um relacionamento significativo é saber usar as emoções para (re)organizar-se de uma forma saudável e seguir em frente.
A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990