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Com Sotak, Karla da Silva quer construir pontes e destruir os muros de preconceitos
Nascida em Madureira, subúrbio do Rio de Janeiro, e desde 2019 em Portugal, a cantora Karla da Silva lança o quarto disco com os vários sotaques do samba. Ela tem shows marcados para Lisboa e Porto.
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A carioca Karla da Silva, 40 anos, ganhou um codinome na França, onde tem se apresentado com frequência: o de “nova rainha do samba”. Não há nenhum exagero nessas palavras, diante da voz potente e das músicas cada vez mais elaboradas que ela tem composto. O quarto disco que a artista lança, Sotak, que será apresentado em dois shows em Portugal — um, em Lisboa, em 17 de novembro, no B.O.T.A Anjos; outro, no Porto, dia 30, no Instituto Pernambuco —, sintetiza o amadurecimento da cantora, que cresceu em Madureira, subúrbio do Rio de Janeiro, cercada pelo samba.
“Nesse novo disco, o mais importante é que trago o samba como língua mãe, com toda a diversidade de sotaques, que conversam com a lusofonia”, diz Karla. “Tem o samba de roda, o samba reggae, o samba-canção, o samba de terreiro. Mas tem, também, a morna, de Cabo Verde, e o semba, de Angola”, acrescenta. Foi o ritmo angolano, segundo a cantora, que deu origem ao samba de hoje. “O semba era tocado pelos escravos no Brasil e, ao longo do tempo, foi sofrendo influências de outros ritmos”, explica.
Karla quer, com o novo álbum, de 10 músicas, fazer uma reflexão sobre a língua portuguesa. “Os sotaques fazem parte da nossa cultura, não podem se transformar em muros de preconceito”, afirma. “Acredito que os diferentes sotaques devem ser pontes para a construção de um futuro coletivo, de paz, não de conflitos”, emenda. Ela ressalta que todas as canções presentes em Sotak foram feitas já em Portugal, para onde se mudou em 2019. “A maioria das músicas fiz sozinha, mas há composições com Pierre Aderne e Ju Moraes”, conta.
Não à intolerância
Para a artista, a música, seja de que ritmo for, é um instrumento fundamental para reforçar a identidade de um povo, contudo, é uma linguagem universal, transformadora. “Cresci em um ambiente em que a música era motivo de confraternização. Na minha casa, as cantorias eram frequentes. E, mais do que isso, era uma forma de expressão. Não podemos esquecer que o samba permitiu que uma parcela dos brasileiros ganhasse voz numa sociedade que procurava inviabilizar boa parte de sua população”, assinala.
A artista abriu a maratona de shows em Paris com casa lotada. Nesta sexta-feira (08/11), apresenta-se em Bruxelas. “Esses espetáculos têm sido gratificantes. O retorno do público é de muito carinho e respeito”, frisa. Há, na opinião dela, uma compreensão enorme das letras de suas músicas, que retratam a cultura negra. A cantora leva, nos ritmos e na escrita, todo o seu envolvimento com o candomblé, religião de origem africana que vem sofrendo fortes ataques no Brasil, diante da intolerância propagada pela extrema-direita.
É verdade que o samba não esteve presente o tempo todo na carreira de Karla, que foi semifinalista do The Voice Brasil. Durante um período, ela navegou pelo pop. “Foi em Portugal que me reencontrei com o samba. Ele ficou ali quietinho, dentro de mim, como um pai espera a rebeldia da adolescência passar”, diz. Agora, a cantora, com todas as suas raízes, acredita que o poder transformador do samba, em seus vários sotaques, está lhe trazendo o melhor que um artista pode querer. “Nossa visão coletiva nos encoraja a agir solidariamente”, enfatiza.