Em vez de cliques, lojas físicas voltam a estar na moda na Europa

Especialistas acreditam que compradores preferem o toque humano, conveniência e imediatismo de comprar numa loja. Espaço de venda na Europa, em metros quadrados, aumentará 2,7% em 2028 face a 2022.

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Os consumidores europeus estão a regressar às lojas físicas ANDREA COMAS/Reuters
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O aumento das compras online levou ao encerramento de muitas lojas, lançando dúvidas sobre o futuro dos centros comerciais e das ruas com mais comércio, mas na Europa há sinais de que as lojas estão de novo na moda e são importantes para ajudar a impulsionar as vendas online. Os retalhistas europeus estão a investir em lojas físicas para estimular as vendas, uma vez que enfrentam a concorrência crescente de empresas gigantes do comércio electrónico, como o grupo de fast fashion Shein.

Pretendem também capitalizar a renovada apetência das pessoas para visitar as lojas após o fim do confinamento devido à covid-19, o que fez com que as compras de sábado à tarde voltassem a estar na moda. “Venho às lojas porque quero ver as coisas ao vivo, experimentá-las e tê-las imediatamente disponíveis”, justifica Francesca Marini, de 28 anos, enquanto faz compras num centro comercial em Roma. Para a consumidora, as esperas das compras online estragam a experiência.

O número total de lojas na Europa está a diminuir ligeiramente, passando de 4,92 milhões no ano anterior para 4,90 milhões em 2023, segundo dados da empresa de estudos de mercado Euromonitor. Mas o espaço de venda medido em metros quadrados subiu quase 1% e deverá aumentar para 2,7% em 2028, em comparação com 2022, revelam os mesmos dados.

Os retalhistas aperceberam-se de que é difícil manter os clientes sem algum contacto directo com eles, explica Thomas Joekel, gestor de carteiras da Union Investment, que detém acções da LVMH e da Adidas. “Isto é mais fácil de conseguir se tivermos lojas físicas em vez de apenas comércio electrónico”, afirma. “No comércio electrónico, só se vêem fotografias, mas não se sente, não se cheira, não se fala com ninguém, pelo que é muito mais difícil ser-se optimista ou entusiasta em relação a uma marca”, defende.

Experimentar antes de comprar

Desde a pandemia, os retalhistas desportivos têm assistido a um aumento da procura de produtos como sapatilhas de corrida e kits de treino, à medida que as pessoas aproveitam ao máximo as actividades ao ar livre. “Se olharmos para o sucesso da Adidas ou da North Face e outras, penso que houve definitivamente uma tendência para mais actividades ao ar livre, em parte durante a pandemia”, diz Adam Cochrane, analista do Deutsche Bank. “Penso que as pessoas se aperceberam de que precisavam de sair e fazer coisas e que alguns desses comportamentos se mantiveram.”

Este ano, o retalhista francês de artigos desportivos Decathlon acrescentou cerca de 80 lojas à sua rede, informa Celine Del Genes, directora global de clientes, elevando o seu número total de pontos de venda para cerca de 1700 em todo o mundo.

Com cerca de 160 lojas em Itália, a Cisalfa, retalhista italiano que vende vestuário desportivo, como sapatilhas de futebol da Nike e T-shirts de corrida da Under Armour, planeia abrir ou renovar cerca de dez lojas no seu mercado nacional este ano. A empresa expandiu-se na Alemanha para 75 lojas com a sua recente aquisição da SportScheck, acrescentando 25 lojas à sua carteira alemã.

Compradores multicanal

Ter uma loja física pode aumentar as vendas online entre 10% e 20% num raio de 20 minutos de carro do ponto de venda porque mais clientes são multicanal, de acordo com dados citados por Cochrane. “Há provas concretas, em ambos os sentidos, de que a abertura de uma loja aumenta as vendas online nas imediações dessa loja”, afirma. “E, inversamente, se fecharmos uma loja, há provas de que não recuperamos totalmente todas essas vendas, quer online, quer transferindo-as para outra loja.”

Stefan Reiner, director de vendas do retalhista de desportos de montanha Oberalp, diz que “quanto mais lojas estiverem presentes numa zona, maior será o interesse pela marca online”.

Para atrair os compradores, a Decathlon dispõe de centros dedicados à reparação ou ao aluguer de equipamento, e de áreas onde os clientes podem praticar desporto. “As lojas oferecem novas funcionalidades, como showrooms e estações de descoberta para integrar elementos físicos e digitais, facilitando a exploração, análise e comparação de produtos”, enumera Celine Del Genes, directora de clientes, à Reuters.

No centro comercial de Roma, a Decathlon colocou duas mesas de ténis de mesa junto à entrada da loja, onde as pessoas podem jogar gratuitamente. “É uma boa ideia: podemos divertir-nos num local onde normalmente só vimos para comprar”, refere um dos jovens jogadores à Reuters, enquanto as bolas de ténis de mesa voavam e os seus amigos discutiam se o tiro era dentro ou fora.

A retalhista espanhola Inditex, proprietária da Zara, oferece provadores de grupo, onde os amigos podem experimentar roupas. Os provadores também têm ecrãs tácteis para que os clientes possam pedir tamanhos ou estilos diferentes.

Na Alemanha, o retalhista online Zalando já tem 15 lojas físicas no país, estando uma outra a ser construída em Freiburg, no sul. Tal como outros retalhistas, a Zalando, que vende de tudo, desde fatos de banho a vestidos Hugo Boss, está a lutar contra a concorrência crescente da Shein. O retalhista online com sede em Singapura adoptou uma estratégia de lojas pop-up, abrindo lojas em cidades europeias ou britânicas que fecham ao fim de alguns dias.

Os especialistas do sector acreditam que os compradores preferem o toque humano, a conveniência e o imediatismo de comprar numa loja. “Os consumidores estão a optar por regressar às lojas porque estão a redescobrir o aspecto lúdico das compras”, afirmam os analistas do RBC.

Também gostam da conveniência de clicar e recolher, ou seja, escolherem online e irem à loja física buscar os artigos adquiridos, e, à medida que as pessoas regressam aos escritórios, isso significa que têm menos certezas de estar em casa para receber uma entrega. “Algumas pessoas só querem comprar uma T-shirt e ir a uma festa ou à escola. Se tiverem de esperar duas semanas, é simplesmente demasiado tempo”, conclui Joekel, da Union Investment.


Reuters

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