O cancro da mama na mulher jovem está a aumentar?
Várias organizações têm dedicado mais atenção a esta questão. Como é o caso da Breast Cancer in Young Women Foundation que organiza agora em Portugal a sua primeira conferência internacional.
O cancro da mama é um diagnóstico relativamente raro em mulheres jovens. Porém, entre 2012 e 2021, a incidência da doença aumentou 1,4% e este valor é um pouco maior do que nas mulheres com mais de 50 anos (1%), como descrito pela Sociedade Americana de Oncologia na sua mais recente publicação “Breast Cancer Facts and Figures 2024-2025”.
Este facto deve fazer-nos refletir, enquanto sociedade civil para nos ajustarmos e darmos resposta a um número crescente de casos em mulheres mais jovens. Mas o que poderá ser diferente quando o cancro da mama é diagnosticado em mulheres jovens?
Em primeiro lugar, geralmente o diagnóstico é mais tardio. Estas mulheres, ainda em idade reprodutiva, têm frequentemente mamas mais fibrosas, em que os exames de diagnóstico podem ser mais falíveis. De acordo com o padrão de densidade mamária, poderá ser útil na vigilância para diagnóstico precoce, em situações específicas, o recurso à combinação da mamografia com ecografia mamária e ressonância magnética da mama.
Também a biologia tumoral pode ser diferente: a maioria dos casos de cancro da mama que surgem na idade da menopausa expressa recetores hormonais, enquanto na mulher jovem há maior prevalência de cancro da mama sem expressão de recetores hormonais, muitas vezes também associados a fatores de maior agressividade tumoral.
Nos últimos anos, o tratamento multidisciplinar — cirurgia, radioterapia e tratamento médico, quer seja quimioterapia, hormonoterapia, agentes biológicos, anticorpos monoclonais ou imunoterapia — tem permitido aumentar a taxa de cura, reduzindo a mortalidade. Mas estes tratamentos têm diferentes consequências, com possibilidade de sequelas permanentes. Estão muitas vezes associadas a mudanças no corpo, mas também relacionais, pelo impacto que geram na vida familiar, no plano social ou laboral — e daí ser muito importante a nossa sociedade estar preparada para dar resposta às necessidades específicas dos sobreviventes de cancro.
O tratamento do cancro da mama na mulher jovem tem múltiplos desafios. Desde logo, se associado a alterações genéticas, o tratamento cirúrgico poderá incluir cirurgias redutoras de risco de recorrência local ou de segundas neoplasias, ou mesmo pela inclusão de medicamentos capazes de reduzir o risco de recorrência da doença no plano de tratamento.
É fundamental também salvaguardar a possibilidade de poderem ter filhos no futuro, com referenciação precoce na Medicina da Reprodução. Por outro lado, devemos evitar toxicidades tardias associadas aos tratamentos com intuito curativo, ajudar a lidar com as alterações decorrentes de uma menopausa precoce, mas também à reinserção social, profissional e familiar após o tratamento.
E se, aquando do diagnóstico, a doença já é suficientemente extensa que não permita um tratamento curativo? Aí os desafios são ainda maiores. Estas mulheres tendem a revelar um enorme impacto emocional da doença, com sentimentos de angústia, depressão, ansiedade, isolamento social e baixa autoestima. Assim, será necessário aumentar o apoio e o acesso a melhor e mais fidedigna informação sobre esta fase da doença com foco na qualidade de vida.
As mulheres sobreviventes de cancro da mama sentem o impacto da doença no trabalho, o que encerra vários desafios, entre os quais o stress devido à falta de segurança no emprego, a dificuldade no acesso aos benefícios do empregador ou em cumprir com os compromissos contratuais. A taxa de desemprego na Europa nesta subpopulação é mais do dobro da verificada em mulheres sem doença (35,6% vs 15,2%).
Muitas das mulheres estão e. Contudo, precisam ultrapassar as consequências físicas do tratamento. A impossibilidade de trabalhar pode levar as mm idade ativa e têm vontade de participar no mercado de trabalho após o tratamentoulheres com cancro da mama ou sobreviventes a sentirem-se mais isoladas. É muito importante que as empresas, as organizações e o Estado tenham conhecimento sobre o impacto do cancro da mama na vida profissional da uma pessoa, de forma a providenciar o apoio necessário e a contribuir para uma maior (re)inserção social, reduzindo a desnecessária abstenção laboral.
Identificados os principais desafios, após o tratamento do cancro da mama, é muito importante reforçar a importância da vigilância regular, que tem como objetivos a detecção de recorrência da doença e de segundas neoplasias, a vigilância e o tratamento precoce de efeitos tardios relacionados com o tratamento efetuado, assim como a instituição de medidas gerais redutoras de risco através da adopção de um tipo de vida mais saudável: dieta equilibrada, prática regular de exercício físico, abstenção do álcool ou tabaco e mesmo a possibilidade de integração de programas regulares de melhoria da qualidade de vida.
Porque a abordagem diagnóstica e as preocupações com o tratamento e as suas consequências na mulher jovem é diferente do que acontece em idade mais avançada, várias sociedades científicas e organizações têm dedicado atenção a esta questão. Mais recentemente, a inquietação que este tema gera na comunidade médica e científica levou a que especialistas de renome internacional se juntassem à Breast Cancer in Young Women Foundation (BCYW Foundation), que organiza em Portugal a sua primeira conferência internacional dedicada ao cancro da mama na mulher jovem. A iniciativa decorrerá em Lisboa, nos dias 29 e 30 de outubro, e permitirá discutir as causas do aumento do número de casos de cancro da mama em mulheres jovens e partilhar os avanços emergentes nesta área.
Esta discussão é de todos. O cancro da mama na mulher jovem está a aumentar e é necessário compreender os desafios que esta tendência coloca e procurar, em sociedade, formas de responder às necessidades destas mulheres.