Douro deixará uvas na vinha até Dezembro para quantificar produção desperdiçada

O IVDP está a pedir aos 18 mil viticultores da região que reportem a quantidade de uva que deixaram na vinha por falta de destino para essa produção. A uva deverá ficar na vinha para verificação.

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O IVDP pediu aos viticultores para declararem a produção de uva que deixaram este ano por vindimar nas suas vinhas Anna Costa
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É o próprio Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP) quem está a pedir aos cerca de 18 mil viticultores da região que reportem, em documento próprio, a percentagem de uvas que deixaram por vindimar nesta campanha, por não terem quem lhes comprasse essa parte da produção e/ou não terem encontrado outro destino a dar às uvas. A sugestão foi levada ao conselho interprofissional pela Associação dos Viticultores Profissionais do Douro (​ProDouro) e aceite tanto pelos outros representantes da produção como pela bancada do comércio naquele órgão.

"Envia-se este email com a tabela anexa, para que possa informar este instituto das parcelas de vinha que não foram vindimadas ou que o foram apenas parcialmente", pode ler-se na missiva que o IVDP enviou esta quinta-feira aos viticultores, fazendo-a acompanhar de uma folha de cálculo onde devem ser discriminadas as características das vinhas em causa. A data-limite para a submissão de respostas é "15 de Novembro", mas a ProDouro, por exemplo, que já tinha escrito aos seus associados (105, representando um universo de 1200 agricultores), pediu aos viticultores para aguentarem os cachos nas videiras até 15 de Dezembro, de forma a dar tempo para que possam depois ser fiscalizados pelo instituto.

A ideia surgiu ainda antes de a vindima começar, quando a associação começou a perceber que "muitos viticultores teriam dificuldade em colocar e vender as suas uvas este ano". Na altura, a ProDouro até organizou a Mostra da Uva do Douro para promover o escoamento de uma maior quantidade de uvas pelos produtores presentes. Três meses volvidos, há por toda a região parcelas por vindimar, porque não há quem queira essas uvas.

"O primeiro objectivo" da iniciativa, explica o presidente da ProDouro, Rui Soares, "é medir e avaliar a dimensão" da colheita que ficou por vindimar, porque, nota, "uma coisa é ouvirem-se rumores, outra é saber-se, de facto, quantas pipas ficaram por vindimar". O segundo é ter informação que pode ser muito útil para a decisão de medidas no futuro, medidas compensatórias mas também outras que olhem para o futuro."

O presidente da Associação das Empresas de Vinho do Porto e representante do comércio no conselho interprofissional, António Marquez Filipe, concorda. "Quantificar a uva que ficou por vindimar, por viticultor, por parcela e por sub-região é essencial para percebermos a dimensão do problema." Mas, ressalva, "não é medir por medir", deve aproveitar-se a informação que daí resultar para tomar medidas de médio e longo prazo e não para insistir em cuidados 'paliativos'.

A poda em verde é uma medida de curto prazo, exemplifica: "Pode ser uma medida extraordinária, mas dificilmente se compreende que possa ser sistemático." Também a redução da produtividade máxima por hectare é conjuntural, receia, defendendo "que seja avaliada ano a ano". "Este ano foi o primeiro ano e [a sua aplicação] não foi propriamente relevante, porque baixou [para as oito pipas por hectare], mas quem provasse ter uvas acima desse limite podia pedir uma vistoria ao IVDP [e transformar a uva] até 20% a mais." "Devemos [antes] olhar para o tema da área de vinha do Douro." Para o arranque de vinha? "Preferimos chamar-lhe um abandono controlado [da actividade]", respondeu António Marquez Filipe, fazendo notar que nem a destilação de crise é solução. "O Douro não tem condições em termos de preço, custo e reputação para produzir vinhos para destilar", justificou, adiantando que o tema será discutido na próxima reunião do conselho interprofissional do IVDP, ainda em Outubro.

"Nós estamos num negócio que tem vindo a decrescer em volume. O vinho do Porto perdeu 31% das suas vendas em volume desde 2000. E pela primeira vez tivemos um decréscimo nas vendas do DOC Douro no ano passado, que se mantém este ano. Várias empresas compraram uva para além das suas necessidades. Temos uma gestão da oferta para fazer", notou o também administrador da Symington. António Marquez Filipe lembra que a produção das vinhas este ano foi, de resto, generosa, e no rescaldo da "vindima grande do ano passado, que gerou excedentes" na região, em parte destilados na última destilação de crise.

Como o PÚBLICO deu conta há dias, muitos viticultores nem sequer iam colher as uvas. Outros, aqueles que podiam pagar a jorna aos vindimadores (entre 70 e 75 euros este ano na região), ou que tinham amigos e família para ajudar na vindima, estrearam-se a fazer vinho em casa. Até por isso, "é muito difícil" prever o que quer que seja e o retrato que sair da avaliação em curso será sempre incompleto, diz Rui Soares.

Questionado pelo PÚBLICO sobre os desafios que a fiscalização colocará ao IVDP daqui a algumas semanas, o seu presidente, Gilberto Igrejas, respondeu que isso "dependerá das perdas que vão ser declaradas". E mais não quis comentar nesta fase.

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