O navio da vergonha e a conivência com Israel

O navio carregado de explosivos para Israel está à deriva no Mediterrâneo. Malta recusou passagem em águas internacionais. Inacreditavelmente, ainda ostenta pavilhão português.

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O armador do polémico navio MV Kathrin, que transporta explosivos encomendados por uma empresa israelita de armamento, pediu no dia 27 de Setembro a retirada do pavilhão português ao Registo Internacional de Navios da Madeira. A informação foi anunciada por fonte oficial do Governo português à agência Lusa, que realçou o desfecho, a seu ver, positivo, fruto de conversas “discretas” entre o Governo português e o armador alemão. O processo seria rápido e em “dois ou três dias” o assunto estaria encerrado.

Dez dias depois desse pedido, porém, o navio continua a navegar com bandeira portuguesa e o Governo português remeteu-se ao silêncio sobre este assunto, não respondendo às perguntas feitas pelo PÚBLICO.

“Dois ou três dias” poderia ter sido o tempo para o navio, que na altura estava perto do Mar Adriático, chegar ao porto de Montenegro, que estava apontado como o seu destino final. Por estar em processo de mudança de pavilhão, o navio não pode atracar, porém, em nenhum porto.

Actualmente, o navio com explosivos RDX Hexogen encomendados por uma empresa de Israel e outra da Polónia encontra-se ao largo da Sicília e a dirigir-se para Malta, mas um porta-voz do Governo já veio dizer nesta segunda-feira que não está autorizado a entrar em águas territoriais daquele país ou atracar em qualquer porto, mesmo que seja apenas para mudança de elementos da tripulação.

Foi em Agosto que o PÚBLICO deu conta de que um navio com bandeira portuguesa carregava alegadamente material de guerra que teria como destinatário Israel. Portugal demorou a reagir. Primeiro, negou que a carga tivesse alguma coisa que ver com os esforços de guerra, mais tarde reconheceu que era material de “duplo uso”, por fim, viu a necessidade de pedir mais explicações ao armador, que, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, se mostrou sempre colaborante.

O Governo português alegou, no entanto, não ver razão jurídica para a retirada da bandeira portuguesa, preferindo negociar uma solução amigável com o armador, mesmo quando o assunto chegou a ecoar na Assembleia Geral das Nações Unidas, no final de Setembro.

A relatora especial das Nações Unidas para a Palestina, Francesca Albanese, apelou nessa altura ao Governo português que solicitasse "urgentemente a remoção" da bandeira portuguesa do navio MV Kathrin, elogiando a posição de princípio de Portugal relativamente à Palestina, distinta da “hipocrisia demonstrada por muitos outros países europeus”.

O navio da vergonha continua agora à deriva no Mediterrâneo e só será acolhido por quem seja conivente não com a estratégia de Israel, mas com a estratégia de Benjamin Netanyahu.

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