Numa noite de nevoeiro, 400 marroquinos atiraram-se ao mar para chegar a Ceuta
Na última semana, uma nova vaga de “nadadores”, na sua maioria adolescentes e crianças, chegou às praias do enclave. Guarda Civil pede reforços e autoridades querem levar os jovens para Espanha.
Ceuta está a braços este mês de Agosto com uma nova pressão migratória de “nadadores”, na sua maioria adolescentes e crianças, que se lançam ao mar procurando contornar o quebra-mar do Tarajal e atingir as praias do enclave espanhol. Na madrugada de quinta para sexta-feira, o nevoeiro foi o disfarce perfeito para cerca de 400 pessoas tentarem iludir a vigilância nas praias marroquinas e conseguir chegar ao seu destino.
Durante toda a noite, testemunhou-se uma azáfama dos dois lados da fronteira, relatada pelo jornal El Faro de Ceuta: “A Guarda Civil mobilizou todas as suas tropas, enquanto a Marrocos chegaram reforços em quantidade para tentar blindar a fuga em direcção a Ceuta. Enquanto as unidades marroquinas eram destacadas, as pessoas saltavam ao mar e outros cidadãos observavam da orla marítima, espantados com a situação.”
Enquanto do lado marroquino se tentava conter as partidas, do lado de Ceuta, procurava-se salvar quem chegava: “As corujas alertando sobre as pessoas na água, as patrulhas costeiras recolhendo pessoas exaustas na praia, os cidadãos vindo ajudar com roupas para aquecer quem chegava... E a todos eles juntou-se o Serviço Marítimo, que voltou a recolher um grande número de pessoas no mar para depois as trazer para os bancos de areia junto ao quebra-mar para o seu regresso a Marrocos”, relata o mesmo jornal.
Desde o início de Agosto, cerca de centena e meia de pessoas, em média, tem sido identificada por noite nos postos policiais de Ceuta, segundo o El País, mas há dias em que esse número ascende a mais de 350, como no domingo passado e na madrugada de sexta-feira. Na sua maioria são menores, já que os adultos são de imediato reconduzidos ao outro lado da fronteira.
A situação intensificou-se na última semana de tal forma que, na quinta-feira, mesmo antes da atribulada noite de nevoeiro, o executivo local reuniu-se para analisar o pico histórico de acolhimento de menores e lançou um pedido de ajuda ao Governo espanhol e às comunidades autónomas para articular mecanismos que permitam a transferência desses adolescentes para outros pontos do país.
Um pedido bem recebido pela ministra espanhola da Juventude e da Criança, Sira Rego, que terá dito ao autarca de Ceuta estar a acompanhar “ao detalhe” a situação e que a preocupação é “partilhada”, segundo o El Faro de Ceuta. No entanto, uma transferência de menores para a península já foi tentada em Julho no Congresso, mas falhou devido à rejeição do PP, Vox e Junts à reforma da lei de imigração.
As autoridades estimam que o número de migrantes a chegar a Ceuta por via terrestre (que inclui quem chega a nado) aumentou 173% face ao ano passado e já somam mais de 1600 pessoas, segundo o El País. Está ao nível de 2019, embora não tenha atingido o pico de 2021, altura em que se registou a entrada maciça de mais de 10 mil pessoas.
Neste momento, mais de 400 menores marroquinos estão alojados em centros de acolhimento regional, muito acima da capacidade instalada. O assessor da presidência e governação de Ceuta, Alberto Gaitán, afirmou ao El Mundo que, desde Fevereiro, continuam a entrar menores a um ritmo elevado. “Temos 18 quilómetros quadrados e não é possível encontrar novos espaços para acomodá-los decentemente. É uma verdadeira emergência humanitária e apelamos ao Governo e ao Estado como um todo para aliviar a situação.”
A autoridade de menores de Ceuta detectou uma alteração no perfil dos que chegam ao enclave. Se antes da crise migratória de 2021 chegavam muitas crianças que viviam nas ruas, agora vêm de famílias normalizadas. “Desses 400, não há nenhum que esteja detido num centro” por ter cometido alguma infracção, diz uma fonte oficial ao El País, sinalizando que os migrantes têm bom comportamento e não causam problemas. Muitos deles têm conhecidos em Ceuta.
Muitos outros menores perdem a vida na tentativa de nadar até Ceuta e o nevoeiro, se é um disfarce para se atirar ao mar, é também uma armadilha, tal como as correntes nas águas da baía sul de Ceuta. Na última quarta-feira, um jovem vestido com roupa de neoprene e barbatanas apareceu a boiar no Poço San Felipe. E no El Faro de Ceuta multiplicam-se as fotografias de jovens desaparecidos no mar.