Sindicato guineense dos jornalistas apela a boicote ao Presidente Embaló

“Sistemáticos insultos” do chefe de Estado aos jornalistas levaram ao pedido para deixar de publicar as suas declarações. Sinjotecs reúne-se na quarta com directores dos órgãos de comunicação social.

Foto
Umaro Sissoco Embaló mantém uma má relação com os jornalistas, sobretudo com aqueles que fazem perguntas que não lhe agradam Aaron Ross/REUTERS
Ouça este artigo
00:00
03:48

A forma como o Presidente da República da Guiné-Bissau trata os jornalistas desde que assumiu o cargo há quatro anos acabou por romper a corda da paciência dos profissionais da comunicação social. Insultados, menosprezados, maltratados, os jornalistas decidiram agora revoltar-se contra a atitude de Umaro Sissoco Embaló e apelaram a todos os órgãos de comunicação social que boicotem o chefe de Estado. Para isso, o sindicato dos jornalistas convocou uma reunião para quarta-feira com todos os directores de todos os media no país para os convencer a deixar de ouvir o chefe de Estado.

O episódio que acabou com a paciência dos profissionais da comunicação social aconteceu neste domingo, no regresso a Bissau do Presidente depois da visita oficial à China. Na conferência de imprensa improvisada no aeroporto Osvaldo Vieira, o chefe de Estado recorreu a palavras do vernáculo mais baixo para insultar um jornalista que lhe fizera uma pergunta sobre a marcação das eleições presidenciais, questão tão legítima quando o mandato do Presidente se aproxima do fim e não há data prevista para o sufrágio, apenas uma intenção de convocar eleições legislativas para o Parlamento, que dissolveu à margem da Constituição antes de completar o prazo de um ano previsto na Carta Magna.

Apesar de estar a responder em crioulo da Guiné-Bissau, a palavra usada para vulgarmente designar o órgão sexual masculino é comum ao português e ao crioulo e é bastante perceptível quando o Presidente guineense envia o jornalista para aí. Enquanto abandonava as instalações do aeroporto, enfurecido por ter sido confrontado com uma questão que não lhe agradava, Embaló foi acrescentando outras palavras em crioulo e outra mais de linguajar de rua de uso comum nos dois países.

Para o Sindicato dos Jornalistas e Técnicos de Comunicação Social da Guiné-Bissau (Sinjotecs), numa nota de repúdio divulgada logo no domingo, este é “mais um triste episódio de sistemáticos insultos do Presidente da República Umaro Sissoco Embaló dirigidos aos jornalistas”. Porque “é recorrente nas comunicações públicas” de Embaló “a pregação dos adjectivos ofensivos contra os profissionais da comunicação social”.

Segundo a direcção do Sinjotecs, “o facto revela desrespeito e desconsideração” para com o “valioso serviço público da imprensa” e, como tal, só pode ser respondido com uma solução drástica: deixar de ouvir o chefe de Estado.

Em três pontos, o Sinjotecs pede, por isso, aos directores dos órgãos de comunicação social e a todos os profissionais da comunicação social que declarem boicote geral “a todas as actividades” do Presidente guineense, em “defesa de dignidade pessoal e profissional” dos jornalistas. Pedindo ao mesmo tempo ao chefe de Estado “para melhorar a sua conduta social e profissional” e, sobretudo, para ter “respeito” pelos profissionais da comunicação social.

Ex-primeiro-ministro expulsa jornalistas

O ex-primeiro-ministro Nuno Nabiam, antigo aliado de Embaló, com quem entretanto se desentendeu, havia lembrado em conferência de imprensa na semana passada que “o Presidente tem de marcar as eleições presidenciais em 2024. Se isso não acontecer, à meia-noite e um minuto do dia 28 [de Fevereiro de 2025] deixa de ser Presidente da Guiné-Bissau”.

Defendendo uma concertação “de todas as forças políticas”, uma “frente ampla para enfrentar Sissoco Embaló”, Nabiam acusou o seu antigo aliado, em declarações citadas pela Lusa, de estar a “armar-se com soldados e armas”, fora do controlo do Governo e do Estado-Maior General das Forças Armadas.

"Qualquer dia o Presidente manda prender os líderes políticos que lhe fazem frente. Ou até manda matar-nos", acrescentou o líder da Assembleia do Povo Unido -- Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB).

Curiosamente, também Nabiam mereceu o protesto de uma organização da comunicação social guineense, neste caso a Confederação Nacional das Organizações de Imprensa (CNOI), por ter impedido alguns jornalistas de cobrirem a conferência de imprensa que convocou para sua casa no dia 11 de Julho. Pelo facto, a organização veio a público “condenar veementemente” as “baixezas políticas” a que submeteu os jornalistas que foram intimidados a deixar a sala.

Sugerir correcção
Comentar