Ex-PGR Cunha Rodrigues aponta “problema de hierarquia” no Ministério Público

Para o ex-procurador-geral da República, Cunha Rodrigues, é “um erro” concentrar todas as críticas no Ministério Público.

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O juiz conselheiro jubilado Cunha Rodrigues admite que "o conceito de hierarquia" está dissolvido no MP Rui Gaudêncio (arquivo)
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O ex-procurador-geral da República (PGR) Cunha Rodrigues defendeu esta quinta-feira que "é um erro concentrar todas as críticas no Ministério Público" (MP), mas diz entender que há um problema de hierarquia nesta magistratura, afirmando que não é claro quem dá ordens.

"Neste momento o conceito de hierarquia está dissolvido", disse o juiz conselheiro jubilado, em entrevista à SIC Notícias, admitindo que o problema não seja falta de hierarquia, mas hierarquia a mais. "Criaram lugares hierárquicos por tudo quanto é o MP e hoje não se sabe bem quem decide, quem dá ordens, que não dá", considerou.

No dia em que a Rádio Observador divulgou uma entrevista em que a ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, afirmou que é preciso "pôr ordem na casa" em relação ao MP, Cunha Rodrigues disse que a ministra terá usado "uma hipérbole" e que já por várias vezes demonstrou "respeito pelo MP". "Se tivéssemos que dizer a mesma linguagem, diríamos que é necessário pôr ordem não só na justiça, mas fora da justiça", afirmou.

Considerando que o que está a acontecer "era previsível", tendo a ver não apenas com a lei e com a justiça, mas também com a política, Cunha Rodrigues defendeu que é "um erro concentrar todas as críticas no MP", sustentando que isso "não corresponde de todo ao que se passa".

Cunha Rodrigues entende que, "por princípio, os procuradores-gerais da República não se devem afastar, devem assumir os mandatos até ao fim".

A actual PGR, Lucília Gago, que tem estado debaixo de críticas, termina o mandato em Outubro. Questionado sobre se concorda com a ideia de que Lucília Gago deve explicações, o magistrado apontou uma "expectativa geral" nesse sentido, de que partilha. "Penso como cidadão que há uma expectativa geral de que é necessário esclarecer alguns factos e esperaria que a senhora PGR tivesse também a mesma opinião que eu."

Sobre a necessidade de intervenção por parte do Presidente da República, Cunha Rodrigues rejeitou que se forme "uma espécie de coro" a pedir que Marcelo Rebelo de Sousa fale.

Na entrevista à Rádio Observador, a ministra admite que há uma "certa descredibilização" do Ministério Público e disse querer que o próximo Procurador-Geral da República inicie "uma nova era" e "ponha ordem na casa".

A ministra garantiu ainda que o Governo não tem dúvidas sobre o perfil para o novo procurador-geral da República, que terá de ser de liderança e de comunicação. Já depois da divulgação da entrevista, Rita Alarcão Júdice reiterou numa publicação na rede social X (antigo Twitter) que o próximo procurador-geral da República deve ter capacidade de comunicação, mas também de contribuir para a "dignificação da Justiça", para eliminar o "ambiente de crispação" e exercer funções "em linha com a Constituição".

Depois de o presidente do Sindicato dos Magistrados do MP, Paulo Lona, ter rejeitado a necessidade de "pôr ordem na casa", mas reconhecido a necessidade de o Ministério Público comunicar melhor, o Chega anunciou a intenção de chamar a ministra ao Parlamento para explicar as declarações e a expressão "pôr ordem na casa", que considera que "não se coaduna com o sistema democrático" nem " com o sistema de separação de poderes".

O Ministério da Justiça rejeitou as interpretações do Chega à entrevista, considerando que houve uma "escalada de deturpação das palavras" da governante.

Vários partidos pediram nos últimos dias a ida de Lucília Gago ao Parlamento, depois de terem sido divulgadas escutas que envolvem o ex-primeiro-ministro António Costa no âmbito da Operação Influencer, mas não directamente relacionadas com esse processo que levou à queda do Governo e a eleições legislativas antecipadas em Março.

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