O melhor do amor é o que ainda não aconteceu. O que está para acontecer, tudo o que o antecede. A expectativa guardada em vácuo. As apostas invisíveis em cima da mesa. Os trunfos que, provavelmente, nem iremos gastar até ao fim.
O melhor do amor é o que imaginamos que condiz com aquilo que sentimos. Bate certo, parece impressionante, mas muitas vezes só bate certo na nossa cabeça.
O melhor do amor é voltar a olhar para um vestido antigo e vê-lo novo. Querer usá-lo. Achar que agora é que vai ser, que vamos ser o corpo certo naquela seda, os lábios que se encontram por fim com o batom de um vermelho-paixão. Antes, era só um vermelho por definir, mas, agora, na nossa boca, queremos que seja paixão.
O melhor do amor é tentar que o mundo caia para o lado certo, quando tudo continua do avesso. Ver esperança numa manhã que seria igual a todas as outras. Querer que o sono encurte a noite. Aliás, ver no sono um desperdício.
O melhor do amor é descobrir que, afinal, tínhamos lugar para mais uma pessoa na nossa vida. Que, da última vez, o coração, que parecia irremediavelmente partido, estava afinal apenas um pouco arranhado. Agora nem cicatrizes vemos. Nada. Parece novo, como uma prata areada.
O melhor do amor é guardar dentro de nós que gostamos daquela pessoa e, parecendo que estamos prestes a explodir de alegria, começar a contar o “segredo” a este e mais outro amigo, até serem muitos. Já não é segredo e vamos ter de viver com isso.
O melhor do amor é falarmos do que sabemos, do que não sabemos e do que queríamos mesmo saber: normalmente é saber se a outra pessoa também pensa em nós da mesma maneira. Desmedida.
O melhor do amor é nem deixar que o incómodo do condomínio nos ocupe a mancha da angústia. Nem a prestação do Visa ou da viagem que comprámos sem companhia. “Estava aérea quando a decidi comprar sozinha. Agora penso que a posso deitar fora se o amor vingar”.
O melhor do amor é sair de casa e achar que todas as canções que tocam na rádio são bonitas, mesmo quando continuam a ser péssimas. Aquelas batidas que antes desprezámos e que agora encontram, nos nossos sapatos, um compasso. Descobrir que afinal aquela canção da Dua Lipa é engraçada, quando antes nos parecia ser só a música de todas as lojas.
O melhor do amor é duvidar da nossa beleza. Perguntar às amigas se ele não é muito mais bonito do que nós. Saber que elas vão mentir porque nos querem ver outra vez felizes. (Só mais tarde perceberemos que ele não era mais bonito, nós é que o estávamos a ver com essas lentes do amor).
O melhor do amor é não ter noção dessas lentes que, ainda por cima, não são descartáveis. Duram até o amor acabar, mesmo que não chegue a começar (mas pode ser muito tempo!). Quando as lentes se esgotam (ou aquilo que julgámos ser o amor), voltamos aos óculos da realidade.
O melhor do amor é começar a pensar em sítios que ele frequenta. Ir a um desses lugares beber um copo. Sentir o coração saltar para o gin tónico, quando ele aparecer. Tentar que o nosso olhar se cruze com o dele. Acabar por acontecer e nesse momento acreditarmos mesmo em Deus.
O melhor do amor é voltar a não ter horas para chegar a casa. Querer ir a todo o lado porque nos sentimos infinitamente vivos. O trabalho ser uma coisa secundária, num dia que pode ser tão mais preenchido (mesmo que por coisa nenhuma. Só essa ideia de amor).
O melhor do amor é fazer do pensamento (ocupado por ele) o nosso emprego. Esquecer tudo o resto, sorrir a todos os colegas. Ver virtudes em muitos deles, quando antes só víamos defeitos. Perceber que o amor aumenta a produtividade da empresa, até quando estamos distraídos.
O melhor do amor são tantas coisas, mas é sobretudo aquilo que o antecede. A nossa visão megalómana de um sentimento poucas vezes correspondido. É amor porque é grande. Não importa que seja de curta duração, como aqueles antibióticos de três dias.
O amor seria o melhor remédio para todos os males do mundo, mas nem sempre nos encontramos. Quando estivermos a sofrer, pensemos que há outra pessoa, noutro ponto do planeta, também triste, porque não nos encontrou. Porque nem sequer eu sabia, nem ele, que existíamos. E, assim, sofremos em latitudes, continentes, línguas e culturas diferentes.
O amor é um grande mistério. É o melhor dos mistérios.
O coração ainda bate.