Forasteiros no arquipélago — Benfica no Faial e no Pico
“Nem um livro de quinhentas páginas chegaria para descrever uma viagem destas, que transcende a mente e se acomoda no coração”, escreve a leitora Ana Catarina Gomes.
As despedidas e choraminguices de um encontro breve no aeroporto foram rapidamente abafadas pelo entusiasmo de quase cem adolescentes da Secundária José Gomes Ferreira (Benfica), com sede de liberdade e ir investigar. Afinal, não é todos os dias que temos a oportunidade de viajar com colegas para duas ilhas maravilhosas como o Faial e o Pico. Teríamos a honra de nos encontrarmos em dois dos laboratórios naturais mais belos que o nosso país tem para oferecer durante quase uma semana inteira.
Apesar da recepção pela chuva e pelo vento na Horta, os momentos que passámos até chegar ao Hotel do Canal serviram para uma consciencialização acerca de onde realmente estávamos. Deparámo-nos com um ambiente oposto ao da cidade: pacato, simples e calmo. O ar inspirado era puro, com um distinto toque de maresia e relva molhada que infestava as nossas vias respiratórias como se fosse a primeira vez que as sentíamos. Mesmo à frente do hotel era possível avistar um portinho de pesca, preenchido com alguns veleiros, lanchas e botes.
Depois de muitas arrumações, começou a viagem em si. Os primeiros três dias foram divididos entre uma exploração autónoma da ilha e dos seus geossítios. Todos estes trilhos estavam, como previsto, assegurados por guias e professores que nos acompanhavam para não perdermos a noção de um dos intuitos da viagem: o enriquecimento do nosso conhecimento geológico e os laços que criaríamos a partir daí. A verdade é que esse “desleixo” ou “perda de rumo” era inevitável; aos olhos de qualquer um de nós tudo era extraordinário e inexplicavelmente elegante. O tempo que passei no cimo do farol da Ponta dos Capelinhos não o vou calcular (e à probabilidade de me terem entrado inúmeros grãos de areia para a vista também não). A perplexidade de uma vista saudada pelas ondas do mar e, ao mesmo tempo, por um dos mais belos vulcões da região é impressionante.
Claro que nem tudo se encontra à volta dos Capelinhos. Considerando todos os geossítios visitados (Praia do Norte, Varadouro, a Caldeira do Faial e, até mesmo, os Montes da Guia e do Queimado), sinto que nenhum teve maior ou menor importância do que outro. Desde arribas fósseis lindíssimas a areias negras; de extensões enormes de campos verdes ao cheiro a hortelã nos trilhos de caminhadas; de explorações em grutas a abertos espaços de pura calma.
O Faial não nos desiludiu, mas o Pico também não. Em dois dias o horário de sono médio de cada um dos alunos foi entre uma a quatro horas: entre trabalhos propostos após visitas, a organizações pessoais e apanhar um barco às sete da manhã, pensámos que nada estava fácil. Felizmente, ao chegar à nova ilha, o ânimo voltava como se nada fosse. Passámos pelas Lajes do Pico, Gruta das Torres, pela Prainha e por uma imensidão de museus e centros de identificação ambiental. Novamente acabando os dias estafados, não o fazíamos sem um sorriso no rosto. As oportunidades únicas que vivemos foram de loucos, os museus de chorar por mais (nunca me esquecerei de como conhecemos a arte dos baleeiros nem da simulação de sismos feita por meios tecnológicos) e as apresentações impecáveis.
A verdade é que nem um livro de quinhentas páginas chegaria para descrever uma viagem destas, que transcende a mente e se acomoda no coração. Novos laços, novos horizontes e novos conhecimentos sem a necessidade de uma sala de aula? Inédito mas possível.
Ana Catarina Gomes