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Suhail Nassar é fotógrafo em Gaza: “É surpreendente que ainda estejamos vivos”
Suhail tem 28 anos e vive, sem um tecto, no sul da Faixa de Gaza. O P3 recolheu o seu testemunho. "[Vejo diariamente] cena após cena de medo, fome, depressão e morte."
"O meu nome é Suhail Nassar, nasci na Líbia e mudei-me para Gaza em 1999. Tenho 28 anos e sou fotógrafo e designer gráfico em Gaza, na Palestina. Desde 2012 que trabalho em projectos locais e internacionais de design e no ano passado comecei a dar formação a muitos jovens artistas e fotógrafos através de uma série de workshops que, infelizmente, foram interrompidos pela guerra. Desde então não pude fazer mais nada para além de filmar e fotografar, tentando mostrar ao mundo a realidade da minha cidade.
Se eu tivesse palavras para descrever a vida em Gaza, neste momento, escreveria para sempre. Porque sou fotógrafo, as imagens falam por mim. Os meus olhos são a minha câmara e a minha mente é o meu cartão de memória. E ambos estão cheios de cena após cena de medo, fome, depressão e morte.
Todos os dias, nos últimos 139 dias, as nossas manhãs começam com filas intermináveis. Acordamos às cinco da manhã para poder comprar o mínimo essencial para a nossa sobrevivência: água, comida, lenha e medicamentos. Alguns dias regressamos de mãos vazias porque as pessoas roubaram os bens ou porque as provisões acabaram.
Como toda a gente, procurei um lugar onde eu e a minha família pudéssemos estar em segurança. Finalmente, consegui encontrar um lugar que seria, supostamente, seguro — mas depois foi bombardeado múltiplas vezes. É surpreendente que ainda estejamos vivos. Eu não tenho conseguido estar sempre junto da minha família. Só dormi junto deles duas vezes desde que fugimos para o Sul de Gaza. Não há espaço para todos. Também me movimento de um lado para o outro para tirar fotografias.
Às vezes, fica tão tarde que acabo por me deitar onde quer que seja até ser de manhã.
As noites são as mais assustadoras. Durante o dia pelo menos é possível ver onde as bombas vão cair. Quando anoitece, somos envolvidos numa escuridão total, sem electricidade. Vemos as bombas a cair através do brilho de lanternas ou da chama de uma vela. Só os mais sortudos têm baterias que podem ser carregadas no painel solar de alguém.
Mas isso isso são luxos.
Tudo o que queremos é que a guerra acabe. Pensávamos que as coisas iriam acalmar depois das tréguas em Novembro. Estávamos enganados. A situação tornou-se mais difícil e mais sangrenta do que nunca.
Queremos que o mundo inteiro continue a manifestar-se e a colocar pressão sobre os líderes e sobre aqueles que têm o poder de influenciar quem toma decisões para colocar um fim a esta violência. Continuem a falar de nós, levantem as vossas vozes e tenham a certeza de que, por pouco que façam, tudo é importante.
Os meus sonhos sempre estiveram relacionados com a liberdade de me movimentar pela minha terra natal, fazer fotografias de todas as bonitas paisagens, pessoas e lugares. Depois de 7 de Outubro, todos os sonhos de viajar pelo mundo se transformaram apenas num só: o de ver o fim da guerra e regressar a casa."
Suhail Nassar, 22 de Fevereiro de 2024.
Depoimento construído a partir de entrevista por email.