Ministra da Defesa considera eventual protesto de militares “não aceitável”. IL e BE pedem salários

As “Forças Armadas são o último esteio da nação. Como tal, não devem fazer nenhuma acção que comprometa não só a democracia como a estabilidade do país”, diz o chefe do Estado-Maior da Armada.

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O Chefe do Estado-Maior da Armada, almirante Gouveia e Melo Daniel Rocha
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A ministra da Defesa defende que a hipótese de manifestações de militares nas ruas "não é aceitável num Estado de direito democrático", considerando que quem defende o país "não pode ser fonte de insegurança e de desestabilização".

"Em primeiro lugar, a ideia de ter militares a manifestarem-se nas ruas não é aceitável num Estado de direito democrático. Quem nos defende não pode ser fonte de insegurança e de desestabilização. As Forças Armadas respeitam e protegem a Constituição, não militam contra ela", lê-se numa declaração escrita de Helena Carreiras enviada à agência Lusa, que se encontra na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, nos Estados Unidos da América.

Esta posição da governante surge depois de as associações representativas dos oficiais, sargentos e praças das Forças Armadas terem admitido protestos na rua se o próximo Governo decidir ir ao encontro das reivindicações das forças de segurança, mas não der "atenção especial" aos militares. Estes avisos foram avançados pelo semanário Expresso e confirmados à Lusa por fontes militares.

Para a ministra, é importante continuar a "valorizar a carreira militar e investir na defesa, sobretudo numa altura em que a guerra voltou à Europa e que são esses mesmos valores constitucionais que estão a ser desafiados".

"Isso faz-se com políticas, com instituições e com diálogo. É isso que tenho feito e, portanto, esse é o caminho. Não um caminho que envolva a produção de desestabilização e de insegurança", avisou Helena Carreiras.

A ministra manifestou a sua confiança nas chefias militares e nos elementos das Forças Armadas e mostrou-se convicta de que "estão à altura de enfrentar os desafios" actuais que esta área de soberania atravessa.

Nesta declaração enviada à Lusa, Helena Carreiras afirma que tem dialogado com várias estruturas, incluindo as associações militares, "que têm manifestado descontentamento", mas ressalvou que "há também muita coisa que tem sido feita e que tem revertido a favor da valorização da carreira militar".

A governante destacou os "aumentos salariais (segundo o INE, a variação do salário médio líquido mensal foi de 8,76% de 2022 para 2023)" e o aumento da componente fixa do suplemento da condição militar que passou de 30 para 100 euros mensais, com efeitos retroactivos a Janeiro de 2023, acrescentando que foram tomadas outras medidas "em áreas como a da valorização profissional, que vão no sentido de responder às justas pretensões os militares que naturalmente querem ver as suas situações melhoradas".

"É minha convicção que aquilo que se tem feito vai no sentido desse reforço. Estou convicta de que a Defesa é mesmo um tema muito importante nesta altura, ao qual temos de estar todos atentos, e por isso o diálogo e a discussão são o caminho para continuar a enfrentar quaisquer problemas e a situação complexa que se vive na Europa. Isso só é possível com muita coesão", avisou.

Protesto “inadmissível”

O chefe do Estado-Maior da Armada considera que "um protesto de rua dos militares" seria "completamente inadmissível". O almirante Gouveia e Melo reage assim ao facto de os militares terem admitido fazer acções de rua se os subsídios de missão da PSP e da GNR forem aumentados (como aconteceu aos da Polícia Judiciária), mas os das Forças Armadas não.

Em declarações à Rádio Renascença, esta sexta-feira, Gouveia e Melo defendeu que as manifestações dos militares "não devem ser feitas nem permitidas porque os militares são o último refúgio da estabilidade do país", e considera até que vão "contra o próprio regime democrático". "São inadmissíveis", vinca.

Para o almirante, as reivindicações devem ser "tratadas através do nível hierárquico nos fóruns apropriados que a democracia tem". Já questionado sobre se a possibilidade de os militares fazerem manifestações é um sinal de radicalização nas Forças Armadas, prefere não comentar.

"O que lhe quero dizer é que as Forças Armadas são o último esteio da nação. Como tal, não devem fazer nenhuma acção que comprometa não só a democracia como a estabilidade do país. E, portanto, nós, militares, não devemos ir para a rua. Não faz parte da nossa missão, da nossa ética e da forma como nos devemos comportar em democracia", observa.

IL fala em "formação", BE em "igualdade"

Também os partidos já começaram a reagir e tanto a Iniciativa Liberal como o Bloco de Esquerda defendem que é preciso resolver o "problema" dos salários da função pública. Mas se Rui Rocha quer mais crescimento económico para chegar lá e propõe uma "formação especializada" para os militares, Mariana Mortágua pede que o Governo reveja salários e carreiras e que garanta a "igualdade" entre as forças de segurança.

Defendendo que existe "um problema de remuneração em todas as áreas da função pública", o presidente da IL considera que "só há uma solução: apostarmos claramente no crescimento económico" para termos uma "remuneração competitiva". E, especificamente para as Forças Armadas, sugere que se crie uma "formação especializada que lhes dê competências para evoluir na carreira militar ou trazer benefício à sociedade no seu conjunto".

Também a coordenadora do BE considera que "há um problema transversal a todos os quadros do Estado" que é a "perda salarial", além da "estagnação das carreiras". Mas, além de defender que as carreiras e os salários "sejam revistos", desafia ainda o Governo a "garantir a estabilidade, a igualdade e a justiça entre todas as forças de segurança".

"O Governo criou uma desigualdade entre as forças de segurança. Tem a responsabilidade de a resolver", afirma, apontando que essa é a "melhor forma de assegurar a estabilidade e a paz no país".