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Numa aldeia italiana em ruínas, as casas voltaram a ter gente (por breves momentos)
Reina o silêncio em Topolò, uma aldeia italiana em ruínas. O estúdio FAHR 021.3 visitou-a e preencheu o vazio. Estado límbico está em exposição no Porto, no espaço do Canal 180, até 10 de Fevereiro.
A 580 metros acima do nível do mar, no topo de uma íngreme colina entre as montanhas de San Martino e Colovrat, a pequena aldeia italiana de Topolò quase não tem habitantes. Em 2008, os censos italianos registavam apenas 28 moradores. Encostada à fronteira com a Eslovénia – fronteira que foi, em tempos, a Cortina de Ferro que separou Itália da Jugoslávia – Topolò foi fustigada pela I e II Guerras Mundiais e viu quase a totalidade da sua população emigrar em busca de segurança e melhores condições de vida. Durante décadas, a grande maioria das casas ficou ao abandono, em ruínas, e algumas foram restauradas no início dos anos 1990.
Foi neste cenário de dilapidação (e requalificação) que Filipa Frois Almeida e Hugo Reis, fundadores do estúdio de arte e arquitectura FAHR 021.3, e Antônio Frederico Lasalvia, que integrou o estúdio em 2022, desenvolveram o projecto estado límbico. A convite do colectivo italiano Robida, composto por um grupo de jovens que assentou arraiais em Topolò com o intuito de revitalizar material e culturalmente a aldeia, os três arquitectos realizaram, em 2022 e 2023, residências artísticas. No local, criaram, em equipa, um projecto multidisciplinar que “explora o mundo oculto das naturezas fictícias”.
“Na segunda residência pretendemos explorar a estranheza que o lugar nos suscitava”, explica Filipa, que fotografou, em entrevista ao P3. “Numa atitude especuladora, vagueámos pela floresta, por casas abandonadas, recolhemos objectos esquecidos e experimentámos modos de ver.” Os lugares onde fez os registos já foram habitados, “mas ficaram sistematicamente abandonados”; os gestos que encenaram, em conjunto, no interior desses edifícios “procuram criar um arquivo especulativo”, “um testemunho ficcional” das vidas e das coisas que passaram pelos lugares.
Reinam o silêncio e o absurdo nas imagens que Filipa fotografou. A “instrumentalidade”, ou função dos gestos encenados, não é o mais relevante, embora aludam para situações que poderão ter existido no passado. Os arquitectos preferem expor contextos que, embora habitualmente negligenciados, continuam a possuir uma vida própria, ainda que silenciosa. “Em Topoló, como tínhamos algum desconhecimento de todas as suas histórias, pretendíamos especular sobre o passado, presente e futuro, imaginando novos seres orgânicos e inorgânicos que pudessem surgir quando não estamos a olhar.”
O projecto, que está em exposição no espaço do Canal 180/Fahr 021.3, na rua Miguel Bombarda, no Porto, até 10 de Fevereiro, é composto pelo conjunto de fotografias patentes nesta fotogaleria, por uma fanzine e por fotogrametria – técnica que permite a construção de modelos tridimensionais a partir da sobreposição de fotografias.
“Gostamos de ter vários universos que relacionam a narrativa de estado límbico com o palpável e a ficção”, justifica Filipa. “O suporte material em papel e a desconstrução do espaço no digital permite redescobrir outras perspectivas e levantar perguntas.” A fanzine inclui o manifesto da autoria de Lasalvia "Site-Speculation: a provisional manifesto in two parts” o texto do filósofo esloveno Aljaž Škrlep (que integra o colectivo Robida) intitulado "Modelling Future Ruralism“.