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Na Madeira, o brutalismo e a natureza fundem-se num só retrato
O madeirense Nuno Serrão persegue a beleza do encontro entre o natural e o edificado e transforma-a em fotografia. O projecto All Islands Are Mountains será, ainda em 2024, publicado em fotolivro.
Em 2021, Nuno Serrão conduziu, pela primeira vez, na nova Via Expresso que liga o Funchal à Ponta do Pargo, no extremo oeste da ilha da Madeira. Um percurso que antes era percorrido em mais de uma hora, por uma estrada nacional longa, sinuosa, converteu-se numa curta viagem de cerca de 30 minutos. “Gosto de visitar a Ponta do Pargo, é das minhas zonas favoritas da ilha”, observa o fotógrafo madeirense. Após o curto percurso, Nuno sentiu uma “insatisfação estranha”. “Eu percorria a estrada antiga muitas vezes – às vezes ainda o faço. Em ritmo de passeio, com calma, aproveitava o longo caminho para pensar e observar a paisagem.” À chegada, começou a indagar-se acerca do motivo da sua insatisfação. “O que é que eu tinha perdido ao escolher aquele atalho?”
A questão levou-o a um pensamento mais profundo. “A vida moderna está cheia de atalhos. O café instantâneo, as mensagens instantâneas, as vias rápidas, o embarque prioritário”, enumera Nuno Serrão a título de exemplo. “Viajamos para chegar o mais rapidamente possível, queremos evitar o desconforto da viagem. Mas o que andamos a perder com todos os atalhos que escolhemos?”
As noções de tempo e de transformação da paisagem estão na base do projecto All Islands Are Mountains, que o fotógrafo desenvolve, desde 2021, em todo o território nacional – com especial enfoque na Madeira. Munido de uma câmara analógica de médio formato, que, ao contrário da digital, lhe permite fazer apenas alguns disparos, Nuno Serrão entregou-se à contemplação destas transformações, deste encontro entre o natural e o edificado.
O fotógrafo que integra a plataforma Futures gosta da lentidão, da calma, de ter tempo para pensar e ser criativo – a eterna convulsão das redes sociais, o ruído do consumo, a ansiedade que provoca “querer chegar mais depressa” são um obstáculo a essa forma de experienciar o mundo. “Fotografar com analógico, em médio formato, é um processo muito mais lento, meditativo”, explica. “Obriga a observar o local, esperar pela luz certa. E regressar, se for preciso. Prefiro assim, vai mais ao encontro daquilo que considero ser a minha fotografia.”
Nas periferias das grandes cidades ou em zonas rurais ou naturais, estruturas brutalistas erguem-se do solo, impondo o funcionalismo sobre a harmonia paisagística. Auto-estradas, viadutos, muros, vedações, infra-estruturas modernas que sustentam a actividade económica rompem a continuidade da paisagem natural, criando novos acessos ou barreiras, alterando os hábitos e as oportunidades de quem usufrui da sua edificação. “Essas estruturas nem sempre são bonitas, mas cumprem uma função”, admite Nuno Serrão, que prefere não ver o copo meio cheio ou meio vazio no que toca o tema do projecto. “Nem sempre uma auto-estrada é bonita, mas pode ser necessária para evitar o despovoamento ou combater a pobreza de uma localidade ou região”, justifica.
A cruzada de Nuno não é ideológica, mas sim visual. Ele persegue a beleza que emerge do encontro entre dois mundos, o natural e o humano. As fotografias de All Islands are Mountains, que ainda não está concluído, irão integrar um livro homónimo que deverá ser publicado ainda durante o ano de 2024. “Este projecto é um reflexo visual de uma questão que me pôs a pensar”, conclui. “Gostaria que as pessoas que vissem o projecto se colocassem as mesmas perguntas, ou mesmo outras completamente diferentes.”