Deixar o Mundo para Trás: um disaster movie que é um desastre de filme

É o fim do mundo como estamos cansados de saber. Com Julia Roberts e Ethan Hawke fechados em casa.

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Filme Deixar o Mundo para Trás, de Sam Esmail, estreia-se esta quinta-feira
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Filme Deixar o Mundo para Trás, de Sam Esmail, estreia-se esta quinta-feira

Uma sensibilidade surrealista talvez se dedicasse a sublinhar a série de reaction shots em que se apoia, como muletas, Deixar o Mundo para Trás. O resultado talvez fosse hilariante e mais do que um tudo-nada experimental: a câmara afastar-se-ia da acção para, histerizando o que aqui se pratica como automatismo, se dirigir à reacção das personagens, numa espécie de coreografia autoderrisória. Mas lá se ia o filme (pós-)apocalíptico e o disaster movie, é verdade, para ficarmos talvez com uma sátira autoconsciente e, quem sabe, de proporções mais melancólicas.

Assim como está, sem transcender o léxico básico, sem transcendência alguma, ponto!, é um desastre de filme este filme da Netflix. Ou, mais serenamente, dependendo das expectativas, é aquilo de que se estava à espera vindo como vem de um homem de serviço às séries (Sam Esmail é o realizador, argumentista e produtor de Mr. Robot e Homecoming). O que se alcança em Deixar o Mundo para Trás é serial e ruminante, é televisivo, em suma: elenca-se uma série de situações que geram um catálogo de temas e motivos que assomam no cinema deste género, tal como antes exercitado em filmes de Don Siegel, Robert Wise, M. Night Shyamalan, Philip Kaufman, Spielberg, etc., etc., etc., e é nisso que são cerzidas as “personagens”.

Assim surgem Julia Roberts e o marido (Ethan Hawke), casal de Brooklyn que vai de fim-de-semana para Long Island, para uma casa arrendada em modo Airbnb, levando o filho e a filha adolescentes. Começam então a acontecer estranhos fenómenos, desde um petroleiro que se dirige ao areal da praia até aos animais da floresta em redor da casa que parecem paralisados de assombro, etc., etc., etc..

Chega o momento em que batem à porta dois desconhecidos, que afinal são os proprietários da casa (Mahershala Ali e a filha, Myha’la Herrold) à procura de refúgio. Levam notícias inquietantes do exterior para o interior, e aí começa o desfilar das ansiedades contemporâneas, a nova (des)ordem mundial, o medo, que é o inimigo, e a paranóia securitária, a (falta de) empatia social, o preconceito racial, “temas” aflorados apenas o tempo suficiente para serem catalogados (vamos fazer de conta que tudo isto é surpreendente; vamos jogar ao jogo do no spoilers).

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Deixar o Mundo para Trás: os intérpretes presos no filme (pós-)apocalíptico

Mas nada disso interessa, porque o que Deixar o Mundo para Trás pratica é uma mal-amanhada experiência de reflexos condicionados, que faz das personagens, na verdade, marionetas — o que é responsável pelo desinteresse dos conflitos e das interpretações das vedetas, ambos vizinhos da macaquice. Os actores abrem a boca e arregalam o olho para condicionarem os espectadores e estes, em vez de irem às salas de cinema que neste momento explodem de belas ofertas, ficam presos nas redes sociais a fazer de Deixar o Mundo para Trás o seu “eu vi, logo existo”. Já se sabia: é o fim de um mundo tal como o conhecíamos.

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