Joana Santiago é a primeira mulher a liderar produtores de Monção e Melgaço. Desígnio continua a ser a Denominação de Origem

Fazedora irrequieta, Joana Santiago é a primeira mulher à frente da Associação de Produtores de Monção e Melgaço e promete lutar pela criação de uma DO Monção e Melgaço dentro dos Vinhos Verdes.

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Joana Santiago nasceu para o mundo do vinho com a avó Maria, que geria sozinha em Monção uma quinta auto-suficiente Anna Costa
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Fazedora irrequieta, Joana Santiago é a primeira mulher à frente da Associação de Produtores de Monção e Melgaço (APA), cuja principal razão de existir continua a ser a união de um território em torno do desejo de uma certa autonomia.

Há muito que a sub-região dos Vinhos Verdes, afamada pela uva Alvarinho e os vinhos que ela dá, deseja ter uma Denominação de Origem (DO) que possa ostentar nos seus rótulos como garantia de uma diferenciação que todos lhe reconhecem, também há muito. Joana Santiago, que nasceu para o mundo do vinho nos verões que passava com a avó Maria na quinta auto-suficiente que a matriarca geria sozinha em Monção, foi eleita presidente da associação que não desiste de colocar Monção e Melgaço ao nível de "regiões de nível mundial", como Bordéus e Borgonha.

Da nova direcção da APA, fazem parte Sara Covas, da Cortinha Velha, e Paulo Cerdeira, da Quinta da do Regueiro, eleitos como vogais. Anselmo Mendes e Miguel Queimado, que lideraram a associação no passado, estão no mesmo barco e presidem, respectivamente, ao Conselho Fiscal e à Assembleia Geral de uma entidade criada em 1983 com o "intuito de defender os interesses dos vitivinicultores, a maior parte deles produtores de uva que vendiam para empresas grandes". "Era a forma de terem representatividade no conselho geral [da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes]", explica Santiago.

"Unidos por um território", os elementos da nova direcção "têm com o objectivo comum, entre outros, promover a criação de uma DO Monção e Melgaço, dentro da grande Região Demarcada dos Vinhos Verdes tal como acontece em regiões de referência mundial como Bordéus e Borgonha", refere Joana Santiago em comunicado. Um objectivo que a determinada altura se tornou uma missão para a sub-região, que tem logrado algumas conquistas.

Monção e Melgaço já um selo exclusivo desde 2017 — é a única das nove sub-regiões dos Vinhos Verdes que tem um selo de certificação específico aplicado aos seus vinhos —, que, explica a nova presidente, lhe "assegura um posicionamento premium nos mercados externos".

Em 2015, Monção e Melgaço celebrou acordo com a Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes (​CVRVV) que lhe valeu 3 milhões de euros de "compensação" pelo "valor criado historicamente pela marca Vinho Verde Alvarinho", trabalhada pela sub-região, uma verba que inicialmente teria de ser utilizada num período de transição de cinco anos, tendo depois o prazo para investir esse dinheiro sido estendido por mais três, ou seja, até 2023.

No passado, um vinho de Alvarinho só podia ter Denominação de Origem se fosse produzido em Monção e Melgaço. Durante os cinco anos do tal período de transição "passou desde logo a ser possível usar Alvarinho [nos rótulos] em vinhos de lote como DO Vinho Verde em toda a região". E, recentemente, toda a região dos Verdes passou a poder fazer Alvarinhos com Denominação de Origem.

O propósito do apoio financeiro excepcional era a sub-região investir na valorização do terroir, para passar a promovê-lo enquanto tal e não enquanto sinónimo de uma casta. "O Alvarinho pode ser plantado em todo o mundo [e é, está autorizado precisamente em Bordéus, desde 2019], é o nosso terroir que nós temos de defender", sustenta, em declarações ao PÚBLICO, Joana Santiago.

Esse plano de promoção é gerido pela CVRVV que, para o elaborar, todos os anos ouve a região, que tem um conselho de marketing, um órgão consultivo criado no âmbito do acordo.

"Números mostram força do território"

A Região dos Vinhos Verdes é a maior Denominação de Origem do país. A CVRVV atribui a DO Vinho Verde a vinhos e espumantes, brancos, tintos e rosados, aguardentes vínicas e bagaceiras e ainda a vinagre de vinho branco, tinto ou rosado. Já a Indicação Geográfica (IG) Vinho Regional Minho é atribuída a vinho licoroso, vinho frisante, vinho frisante gaseificado e aos brancos, tintos, rosados e espumantes que não cumprem os requisitos para ser DO.

Apesar de a DO ser Vinho Verde (toda a região), os Verdes dividem-se nas tais nove sub-regiões (para além de Monção e Melgaço, Lima, Cávado, Ave, Sousa, Basto, Amarante, Baião e Paiva), e os vinhos desses territórios podem ter a menção à sub-região no rótulo — coisa diferente é ter o tal selo de certificação, isso só existe para os vinhos de Monção e Melgaço.

Na nota que enviou à imprensa, Joana Santiago refere que "no ano de 2023 e até ao final do mês de Outubro, a sub-região de Monção e Melgaço produziu cerca de 6,4 milhões de litros de vinho certificado como Monção & Melgaço, representando mais de 70% do vinho certificado na Região dos Vinhos Verdes com Indicação de Sub-Região", cujo total, ainda segundo dados fornecidos pela presidente da APA, ronda para o mesmo período os 9,9 milhões de litros.

Para a responsável, é claro "o valor, reconhecimento e importância" que aquele terroir tem para os produtores de Monção e Melgaço, que "fazem questão da aposição do nome do seu território nos vinhos produzidos e comercializados". E, ao telefone, explica ao Terroir que "os números mostram a força daquele território", que inclusive já tem dia no calendário, 7 de Junho.

O vinho com indicação de sub-região é de resto ainda uma ínfima parte do vinho certificado na Região dos Vinhos Verdes. Basta olhar para os números fechados de 2022, o último ano completo: segundo dados compilados pelo PÚBLICO para o trabalho multimédia Não há canto de Portugal onde não se faça vinho, a CVRVV certificou 96 milhões de litros de vinho com DO Vinho Verde (com e sem indicação de sub-região) e 2,6 milhões de litros de vinho com IG Minho.

A nova líder dos produtores de Monção e Melgaço é advogada de formação e trocou o Direito pela produção vitivinícola quando o apelo da vinha e do vinho falou mais alto. Iniciou em 2009 o actual projecto da Quinta de Santiago e ainda vinificou os primeiros mostos dessa nova vida da quinta com a avó, que viria a falecer em 2022.

Empreendedora, Joana Santiago é também criativa, gosta de experimentar, sozinha ou com outros produtores, e combativa. Tem sido e é uma das vozes mais activas do território mais a Norte da grande Região dos Vinhos Verdes.

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