Funcionários judiciais preocupados com consumos de droga e álcool dos colegas

Número médio de filhos destes profissionais fica muito abaixo da média nacional. Metade dos inquiridos não tem descendência, o que pode ter origem nas condições de trabalho hostis que suportam.

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“Por vezes, somos um saco de boxe da má disposição dos magistrados”, disse um dos entrevistados aos investigadores LUSA/PAULO NOVAIS
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Os funcionários judiciais estão preocupados com os consumos de droga e álcool dos colegas, revela um estudo divulgado nesta terça-feira. Embora a grande maioria destes profissionais assegure que não necessita de medicamentos, drogas ou álcool para trabalhar, quase metade dos inquiridos assume a sua preocupação com os consumos nesta classe profissional.

Encomendado pelo Sindicato dos Funcionários Judiciais ao Observatório para as Condições de Vida e de Trabalho da Universidade Nova, do qual faz parte a investigadora Raquel Varela, o trabalho debruça-se sobre as condições de vida e de trabalho da classe. Que, segundo os investigadores, está “envelhecida e adoecida, devido, por exemplo, a políticas inadequadas de recrutamento e selecção de trabalhadores, a fracos incentivos para ingressar na carreira ou à exaustão física e mental, decorrente de um trabalho sistematicamente intensificado e exposto a elevados níveis de stress”.

Os dados recolhidos, que incluíram um inquérito a que responderam 2029 profissionais, apontam para a necessidade de proporcionar melhores condições de trabalho e de aumentar salários, como formas de combater o burnout.

A maioria dos funcionários queixa-se de o salário não lhes permitir ter uma vida digna: “Apenas 2% dos inquiridos afirmaram não se sentirem afectados por esta questão, enquanto 98% expressaram insatisfação com a sua compensação salarial.”

Uma das consequências deste cenário é o reduzido número de filhos que estes profissionais têm. Quase metade dos inquiridos disse não ter descendência, enquanto 27% têm um filho e 19,52% têm dois.

“A média de filhos é de 0,78, muito abaixo da média nacional de 1,38 filhos por mulher. É o número mais baixo encontrado em todas as classes profissionais estudadas, especialmente em profissões com médias de idade mais baixas, como jornalistas, profissionais de voo, maquinistas do Metropolitano de Lisboa e professores, cujos números variam entre 1,2 e a média nacional”, assinalam os autores do trabalho, remetendo para os estudos do matemático e biólogo norte-americano Lloyd Demetrius, que concluiu existirem muitas espécies a reduzir a fertilidade quando as condições do meio em que habitam se revelam hostis.

“Por vezes, somos um saco de boxe da má disposição dos magistrados”, disse um dos entrevistados aos investigadores, segundo os quais “parece grassar o sentimento de que os magistrados gozam de uma impunidade e de privilégios” negados aos funcionários judiciais.

“No entanto, não é assim tão claro que os oficiais de justiça estejam passivos ou impotentes face à dominação dos magistrados. Se ficou notório que os magistrados detêm o poder formal e dominante ao qual os oficiais de justiça têm de se submeter, também percebemos que os oficiais de justiça podem por vezes contrariar a dominação”, exercendo retaliação sobre juízes e procuradores, pode ler-se no trabalho. E se por um lado o discurso político vai no sentido de afirmar que a justiça é uma prioridade, “por outro aquilo que se verifica é um desinvestimento nesta área” que contraria este postulado.

Outro estudo divulgado este ano revelava que 8,7% dos juízes admitiam recorrer a substâncias ilícitas para lidar com o stress.

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