A endometriose causa dores físicas, sexuais e até emocionais. A doença afecta cerca de 190 milhões de pessoas em todo o mundo — inclusive, uma em cada dez mulheres norte-americanas —, mas tem havido um silêncio contínuo à volta da doença e o impacto que tem na vida de uma pessoa.
Apesar de a endometriose ser uma doença ginecológica que pode afectar qualquer pessoa com útero — mulheres, homens “trans” ou pessoas não-binárias —, muitas vezes continua por diagnosticar porque os sintomas podem ser atribuídos a outras causas físicas ou psicológicas. Os pacientes que reportam este tipo de dores ouvem, muitas vezes: “Está tudo na tua cabeça.”
Ainda assim, a endometriose está a tornar-se uma doença mais visível, em parte graças a celebridades como Lena Dunham, Chrissy Teigen, Amy Schumer, Whoopi Goldberg e outras que começaram a partilhar as suas histórias publicamente.
Depois de 23 anos sem um diagnóstico, Padma Lakshmi, conhecida autora de livros de culinária, actriz e apresentadora do programa de televisão Top Chef, fundou em 2009 a Endo Fund (antes conhecida como Fundação Americana da Endometriose), para que os outros não tivessem que passar por um processo semelhante ao seu.
Sou professora, terapeuta de casais e famílias, clínica e investigadora. O meu próprio diagnóstico de endometriose aos 19 anos inspirou o meu trabalho para explorar a forma como esta doença afecta os outros, além dos sintomas físicos.
Para compreender melhor o impacto desta doença nas relações, entrevistei dez casais sobre as suas experiências de diagnóstico, tratamento e a vida com esta doença. Através das suas histórias sobre como as dores relacionadas com a doença podem afectar todos os aspectos da sua vida, inclusive as relações íntimas, eis algumas recomendações. As declarações que incluo neste artigo são da investigação que fiz para a dissertação de doutoramento.
Aspectos básicos da endometriose
Quando uma pessoa tem endometriose, as células do endométrio que revestem o útero “instalam-se” em outros lugares fora do útero, como os ovários, as trompas de Falópio, e a linha do abdómen — conhecida como peritónio. No fim de cada ciclo menstrual, o útero elimina o seu revestimento, que sai do corpo através do colo do útero e da vagina. As células endometriais “mal implantadas” também são eliminadas, mas não têm para onde ir, resultando em hemorragias internas, inflamação e dor.
O diagnóstico de endometriose é descrito em estágios relacionados com a presença visual da doença, desde um mínimo, ou estádio um, até um severo, ou estádio quatro. Não há, no entanto, uma correlação entre o nível da doença e a presença de dor.
Um dos sintomas é a dor intensa durante o ciclo menstrual. Outro é a dor durante o sexo. Uma vez que esta dor associada ao período ou à relação sexual pode ser considerada “normal”, atribuída a algum historial de abuso sexual ou a causas psiquiátricas como aversão ao sexo, algumas pessoas com endometriose esperam uma média de sete anos por um diagnóstico, que pode ser confirmado visualmente através de um procedimento chamado laparoscopia.
Além destes tipos de dor severa, a endometriose pode ainda causar infertilidade, e pacientes que queiram ter filhos têm de se sujeitar a procedimentos cirúrgicos para engravidar.
Impacto na escola, no trabalho ou no sexo
A dor física da endometriose pode ser incapacitante. Adolescentes com endometriose podem ter dificuldades em frequentar as aulas, sair com os amigos, fazer os trabalhos de casa ou actividades extracurriculares quando a dor se torna demasiado severa. Podem até optar pela escola em casa ou pelo ensino virtual para completar os estudos.
A dor pode também afectar a trajectória da carreira profissional. “Quase perdi o meu trabalho por estar algum tempo fora”, disse-me um entrevistado. “Quando fiz a minha histerectomia, falei com o meu chefe e ele disse-me ‘não me digas que vais fazer uma histerectomia e vais ter de estar de baixa seis semanas!’ e eu desfiz-me em lágrimas”.
Todos os participantes partilharam experiências onde os médicos desvalorizaram relatos de dores durante as relações sexuais — chamadas dispareunias — causadas pela endometriose. Isto pode adiar o diagnóstico e o tratamento.
O sexo e a intimidade tornam-se, muitas vezes, inexistentes, e alguns casais partilham até que, a dada altura, assumiram que as dores durante as relações sexuais faziam parte do sexo. Uma mulher partilhou comigo: “Não quero que me toquem ou que o meu corpo seja visto porque me sinto inchada, feia e estou num sofrimento horrível...”
Os parceiros também podem ser emocionalmente afectados. “Sinto-me horrível”, disseram-me. “Há alturas em que, durante o sexo, me sinto culpado porque sei que a estou a magoar, sei que ela está a sofrer e isso deixa-me infeliz.”
Estas experiências de dor, de não serem acreditadas por médicos e profissionais, dos efeitos negativos na educação e carreira e da intimidade destruída criam um pesado fardo emocional para os indivíduos e as relações.
Quebrar o silêncio em torno da endometriose
O meu diagnóstico de endometriose mudou o rumo da minha vida. Eu e o meu parceiro aprendemos a alargar a nossa definição de intimidade e a redistribuir as responsabilidades domésticas quando eu estava incapacitada. Visto que o risco de infertilidade só aumenta sem intervenção, começámos a ter conversas sobre ter filhos mais cedo do que o planeado. O meu diagnóstico também me levou a focar a minha identidade profissional como terapeuta familiar médica para ajudar outras pessoas a lidar com a endometriose e doenças crónicas.
Com base nesta experiência, aqui estão algumas formas de quebrar este silêncio:
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Aprende sobre a endometriose. Isso ajuda directamente quando os sistemas de apoio estão informados.
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Separa a pessoa da doença. Quando a dor que estás a sentir devido à endometriose é debilitante, ajuda as pessoas à tua volta, que também são afectadas, a entender que é devido à tua endometriose e não é nada pessoal.
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Fala a partir da tua própria experiência. Diz “eu...” em vez de “tu...”. Quando fazemos isso, diminuímos as defesas da outra pessoa e abrimos a comunicação, criando espaço para uma interligação.
Recomendações de pessoas com endometriose
Os participantes na minha investigação partilharam as suas próprias recomendações comigo, sublinhando a importância de acreditar que a dor é real; aceitar que o que estão a partilhar é a sua experiência genuína e fazer com que saibam que acreditam neles.
Brené Brown, autora de best-sellers e investigadora em serviço social afirmou: “A empatia alimenta a interligação, a pena gera afastamento.” Abordar alguém com endometriose a partir de uma posição de empatia envia a mensagem de que queres trabalhar de forma colaborativa.
Ao praticar essas habilidades de relacionamento importantes, podemos quebrar o silêncio em torno da endometriose.
Professora e Presidente da Terapia de Casal e Família na Universidade Adler