Feijóo e Sánchez vão encontrar-se, mas não vão desviar-se do seu guião
A reunião desta quarta-feira no Congresso dos Deputados não deverá trazer qualquer novidade que aproxime Espanha de uma solução para o bloqueio político.
O convite do líder do Partido Popular (PP), Alberto Núñez Feijóo, para uma reunião com o líder do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) e actual chefe do Governo em funções, Pedro Sánchez, foi recebido com alguma perplexidade entre os socialistas, que o consideram uma perda de tempo. Ainda assim, animados por motivações bastante diferentes, Feijóo e Sánchez vão falar esta quarta-feira.
O encontro irá decorrer no Congresso dos Deputados, território considerado neutro, às 10 horas (menos uma em Portugal continental) e dificilmente deverá esperar-se um diálogo amistoso. A campanha que antecedeu as eleições legislativas de 23 de Julho foi uma das mais duras dos últimos anos, com acusações de alianças com os herdeiros do franquismo da parte dos socialistas e promessas de erradicação do “sanchismo” pela boca dos populares.
O tom duro manteve-se mesmo às vésperas do encontro entre Sánchez e Feijóo. Para a porta-voz do Governo de gestão, Isabel Rodríguez, o pedido para uma reunião com o líder socialista “não é nada mais que uma fita” de Feijóo, acusando-o de mentir aos eleitores. “Para que nos faz perder tempo? [Feijóo] não tem os apoios, está a mentir aos espanhóis”, afirmou Rodríguez, na conferência de imprensa que se seguiu a uma reunião do Conselho de Ministros.
Entre as hostes do PP, verificou-se uma suavização do discurso. O porta-voz Borja Sémper negou as acusações provenientes do PSOE de que os populares tenham apelado a dissensões entre os deputados socialistas para que votassem a favor da investidura de Feijóo, no final de Setembro. “Não seria conveniente que o PSOE e o PP se pudessem pôr de acordo para desbloquear a situação?”, questionou o dirigente durante uma entrevista à rádio Onda Cero.
Há pouquíssimas probabilidades de que a reunião desta quarta-feira entre os líderes dos dois principais partidos apresente qualquer progresso palpável para que seja encontrado um acordo. Ainda assim, há razões tácticas que explicam por que Feijóo e Sánchez não rejeitam participar num encontro fadado para falhar.
Negociações prosseguem
O líder socialista está sobretudo interessado nas difíceis negociações que tem em curso com os partidos independentistas e nacionalistas, e que decorrem em paralelo com a tentativa “oficial” de Feijóo, que foi indigitado pelo rei Felipe VI para formar Governo. Desde o início que Sánchez tem manifestado muitas dúvidas sobre as possibilidades de sucesso do PP em negociar apoio suficiente para garantir a investidura na sessão marcada para 26 e 27 de Setembro. E, por isso, os socialistas trabalham já nos bastidores para congregar apoios quando forem eventualmente convocados por Felipe VI para firmar uma solução governativa.
Para o PSOE, a única utilidade em aceder à reunião com Feijóo é a de mostrar ao rei que o líder socialista não fechou a porta, pelo menos de forma explícita, a uma possibilidade de entendimento.
Feijóo tem um mês para encontrar uma fórmula política que desafie o poder da aritmética. Para garantir a sua investidura à primeira volta, o líder popular tem de garantir 176 votos a favor, mas as bancadas do PP (137), do Vox (33), da Coligação Canária e da União do Povo Navarro (um deputado cada) ficam aquém desse objectivo. Numa votação à segunda volta, bastaria que Feijóo alcançasse uma maioria relativa, mas isso implica uma muito improvável abstenção do PSOE.
Acresce ainda que o líder popular enfrenta uma rejeição absoluta por parte dos independentistas catalães e dos nacionalistas bascos. Ainda esta terça-feira, os chefes dos governos autonómicos do País Basco, Iñigo Urkullu, e da Catalunha, Pere Aragonès, rejeitaram sem surpresas o convite que Feijóo fez para reuniões com todos os presidentes dos executivos regionais.
A estratégia do PP parece ser a de aproveitar a ampla janela temporal até à sessão de investidura para ir desgastando e minando as negociações paralelas encetadas pelos socialistas. Sabendo de antemão que dificilmente conseguirá reunir os votos para chegar à chefia do Governo, para Feijóo um cenário menos mau seria um falhanço posterior de Sánchez, o que forçaria novas eleições legislativas, potencialmente mais favoráveis aos conservadores.
Uma peça importante da estratégia de Feijóo parece ser a abertura de um diálogo com os independentistas do Juntos pela Catalunha, de Carles Puigdemont, de acordo com o El País, a quem os populares têm apelado para que se abstenham com o intuito de “encarecer” o preço a pagar pelo PSOE, que necessita dos votos deste partido.