Cinco cuidados a ter durante a Jornada Mundial da Juventude
Das queimaduras solares às bolhas nos pés, até às intoxicações alimentares, o grande encontro dos jovens com o Papa exige alguns cuidados por parte dos peregrinos.
Um milhão de pessoas deverá acorrer a Lisboa para saudar o Papa Francisco, já na próxima semana, entre 1 a 6 de Agosto, naquele que é o grande encontro de jovens católicos, a Jornada Mundial da Juventude (JMJ). Espera-se muita gente, mas também sol abundante, pouca sombra e infindas horas em pé. Para viver intensamente estes dias de fé, há alguns cuidados essenciais, como levar um kit de primeiros socorros, usar o calçado correcto ou preparar o farnel, apontam os especialistas ouvidos pelo PÚBLICO.
O perigo das insolações
Apesar de muitíssimo reiterados, os cuidados com a exposição solar nunca são de mais lembrar. É precisamente o sol que deve ser evitado a todo o custo, especialmente entre as 11h e as 16h, horas em que os raios ultravioleta são mais intensos, defende o dermatologista João Maia Silva, coordenador da Unidade de Cancro da Pele no Hospital CUF Descobertas e na Clínica CUF Alvalade, em Lisboa.
“Sempre que possível, deve-se procurar a sombra das árvores, toldos, estruturas, prédios, etc.”, aconselha, lembrando que, "quando estamos à sombra, estamos a poupar a nossa tolerância diária à radiação UV e a ficar mais longe da queimadura solar”. Mas mesmo que tenha a sorte de encontrar um lugar à sombra durante os vários eventos da JMJ — praticamente impossível no Parque Tejo — e até use um guarda-sol, o protector solar é imprescindível.
Com um mínimo de SPF 30, o protector deve ser aplicado, “numa camada generosa”, 20 minutos antes de sair de casa e novamente no momento de sair. “Desta forma está a garantir que aplica uma quantidade suficiente”, assegura o dermatologista. Atenção que os detalhes importam: “Não se deve esquecer de aplicar protector solar em áreas como as orelhas, a nuca e em áreas de calvície, que são muitas vezes descuradas e são uma localização frequente do cancro da pele.”
Depois, a protecção solar deverá ser reaplicada a cada duas horas. “Como orientação, durante um dia na Jornada, deve reaplicar, pelo menos, quatro vezes”, sugere João Maia Silva. Caso transpire — o que será inevitável com a temperatura que se fará sentir —, terá de aumentar a frequência da aplicação, “pois é mais fácil remover ou limpar o protector solar nessa circunstância”.
Apesar de parecer um detalhe irrelevante, o que se veste também é importante para evitar insolações e queimaduras solares. Materiais de origem natural, como o algodão, devem ser privilegiados, além de roupa com protecção solar. “As roupas de protecção incluem, preferencialmente, camisolas com mangas mais compridas e calças, chapéu de abas largas e óculos de sol”, explica o dermatologista.
Com as crianças, os cuidados devem ser redobrados, especialmente no cumprimento do horário solar e na utilização do vestuário de protecção. “As queimaduras solares nas crianças estão muito associadas ao aumento do risco de cancro da pele”, avisa o especialista.
A exposição solar pode ainda levar à exaustão pelo calor e à insolação, que condicionará, claro, a participação na JMJ. A médica de família Maria João Canelhas avisa que os principais sintomas são o aumento da temperatura corporal entre os 38º e os 40º, além de tonturas, palpitações, dores de cabeça, fraqueza muscular, urina mais escura, diminuição da transpiração, náuseas e vómitos. No limite, podem mesmo conduzir “a convulsões e alterações do estado mental, como desorientação e confusão”.
Caso apresente algum desses sintomas, deve imediatamente procurar um ambiente mais fresco, beber água abundante e procurar o arrefecimento corporal, “quer seja pela remoção de vestuário em excesso, ou com uma toalha com água fria ou ventoinha”. E assevera: “Cuidado, pois, com uma temperatura corporal acima dos 40º, estamos perante um golpe de calor, que requer tratamento especializado imediato, sendo potencialmente fatal.”
Desidratação
Um dos primeiros conselhos da coordenadora de Medicina Geral e Familiar, no Hospital CUF Trindade, no Porto, é levar uma garrafa de água reutilizável, já que estão previstos locais de reabastecimento nos vários locais onde se realizará a JMJ. “Para poder desfrutar com saúde e segurança dos momentos de partilha e convívio, é importante começar a preparar-se em casa”, aconselha.
Para se manter hidratado e evitar a desidratação, deve dar primazia ao consumo de água e frutas, elege Maria João Canelhas. Por outro lado, reitera, “não estão recomendadas as bebidas açucaradas ou alcoólicas”. A nutricionista Inês Barreiros Mota aconselha outros líquidos, como leite, iogurtes ou sumos 100% fruta.
Há também hortícolas ricos em água que podem ser levados na mochila, para aumentar a hidratação, nota a nutricionista da CUF Tejo, em Lisboa, que sugere “o tomate mini, as cenouras e os palitos de pepino”. Além disso, os legumes também podem ser comidos em forma de sopa, que não só sacia, como hidrata.
Atenção aos sinais de desidratação, pede a médica de família Maria João Canelhas: “Incluem sede, diminuição da transpiração, menor produção de urina e boca seca.” Uma desidratação mais grave, pode levar à “diminuição da pressão arterial, com sensação de desmaio e confusão mental”.
A especialista apela, ainda, a uma especial atenção para com as crianças e idosos, cujo “sistema nervoso central tem menor capacidade de regulação térmica”. Além disso, “ambos têm maior dificuldade de se manterem hidratados, pelo que é importante que seja oferecida água, mesmo que não tenham sede”.
As picadas de insectos e um kit de primeiros socorros
A maioria dos eventos da JMJ é ao ar livre e as picadas de insectos, sobretudo em ambientes como o Parque Tejo, são quase inevitáveis, ainda que possam ser prevenidas. Maria João Canelhas aconselha a redução da exposição da pele, através do uso de mangas compridas, calças e chapéus. Além disso, é igualmente importante “o uso de repelentes de insectos, quer seja em forma de spray, gel ou pulseiras”. Os cuidados devem ser redobrados nos dias de maior calor e ao final da tarde.
As lesões resultantes da picada “são geralmente locais e autolimitadas”, descansa a médica de família. Para mosquitos e melgas, esperam-se picadas “arredondadas e vermelhas”, que causam comichão. Estas só necessitam de ser tratadas com “pomadas calmantes ou anti-histamínico”.
Todavia, as picadas de abelha exigem outro cuidado. “Deve-se retirar imediatamente o ferrão, raspando a superfície cutânea de baixo para cima, sem o comprimir, para evitar a injecção adicional de veneno”. De seguida, aplique gelo ou compressas frias no local da picada, para alívio da dor e do edema.
Em qualquer um dos casos, é crucial não coçar, com prejuízo de infectar a ferida. “De acordo com a inflamação, pode ser necessário recorrer ao uso de anti-histamínicos ou anti-inflamatórios orais, e, em caso de infecção secundária da pele, pode precisar de antibioterapia”, prevê a especialista em medicina geral e familiar. Perante um choque anafiláctico, que pode incluir edema da laringe ou dificuldade respiratória, não restam dúvidas: “Deve chamar o 112.”
Na mochila, não se esqueça de um kit de primeiros socorros, termina Maria João Canelhas. Deve incluir medicação para as dores, como paracetamol, pensos rápidos, compressas e soro fisiológico, para o tratamento rápido de pequenas feridas. “Se tiver uma doença crónica, como hipertensão ou diabetes, não se esqueça dos seus medicamentos habituais”, acrescenta.
Bolhas nos pés e pernas inchadas
Esta não é a ocasião certa para escolher “estar na moda”, mas, sim, para privilegiar o conforto, exorta o especialista em medicina física e reabilitação Filipe Bettencourt e a podologista Patrícia Gomes. “O nosso conselho é que opte por ténis ou botas já com alguma utilização e, por isso, bem ajustados aos contornos anatómicos do pé, preferencialmente com atacadores, para serem mais adaptáveis ao longo do dia.” É fundamental que não estejam apertados, pois os pés incham naturalmente.
Para saber que sapatilhas escolher, a base de apoio deve ter entre três a cinco centímetros de altura e ser maleável (mas não em excesso). A frente também carece de espaço, sobrando cerca de um centímetro entre o dedo grande e a ponta do sapato. “Se o material do sapato for demasiado rijo, pode provocar bolhas, inchaço e dor no tendão de Aquiles”, observam os especialistas.
Para evitar a inflamação dos ossos e nervos, bem como risco de entrose do tornozelo, esqueça sapatos de salto alto ou sabrinas, que não têm suporte adequado para o arco do pé e provocam problemas no joelho, ancas e costas. E mesmo que sinta calor, não calce os chinelos de enfiar o dedo: “Oferecem muito pouca protecção ao pé e deixam-no exposto, aumentando o risco de lesões ou, até, de queimaduras solares.”
As bolhas nos pés previnem-se com o uso diário de creme hidratante, secando bem os pés, “principalmente o espaço entre os dedos”, sem esquecer o corte das unhas em linha recta. Se, mesmo assim, aparecerem feridas, lave com soro e desinfecte. Drene o líquido das bolhas fazendo dois orifícios com uma agulha esterilizada. Nunca remova a pele porque funciona como uma camada protectora. Por fim, coloque um creme cicatrizante e proteja o local com um curativo.
Prevêem-se longas horas de pé e, como tal, o ideal é “alternar entre a posição de pé e sentado, procurando realizar alongamentos ao longo do dia”. Se não tiver oportunidade de caminhar, para não perder o lugar mais perto do palco, tente fazer o movimento de marcha no mesmo local ou activando as pernas, por exemplo, com a elevação dos calcanhares.
São também estas medidas que favorecem a circulação e reduzem o inchaço dos membros inferiores. Ademais, para evitar a retenção de líquidos, deve ingerir água em abundância, fazer massagens, elevar os membros durante o repouso, usar roupa confortável e até aplicar um spray refrescante nas pernas cansadas. Nestes casos, as meias também são importantes, devendo-se privilegiar as fibras naturais e com poucas costuras.
Cuidado com as intoxicações alimentares
Se o seu pacote de peregrino não inclui as refeições, é importante preparar o farnel em casa, não só para evitar a confusão, mas também para fazer as melhores escolhas, optando por alimentos que não são tão perecíveis. Isto porque, lembra a nutricionista Inês Barreiros Mota, “o calor acelera o crescimento ou a actividade de alguns microorganismos” presentes na comida e que se tornam “substâncias tóxicas para o ser humano”.
Os alimentos mais perecíveis são aqueles que, de modo geral, precisam de frio para a sua conservação. Se colocar esses na lancheira, como os iogurtes, queijos frescos ou fiambre, deve consumi-los nas primeiras horas após a saída de casa. Sendo que, nestas ocasiões, as sandes são uma das opções mais práticas para o almoço, observa a nutricionista, pode recheá-las com carne assada, pastas de leguminosas, ovos cozidos, atum ao natural e, ainda, conter vegetais, como alface, espinafres, tomate, rúcula, cenoura e couve ralada.
Para os lanches, evite novamente o pão, aconselha Inês Barreiros Mota. “Pode optar pelo ovo cozido, 30g de frutos gordos ou oleaginosas ou três colheres de sopa de tremoços, aos quais pode juntar uma porção de hortícolas ou uma peça de fruta.”
Se comeu algo que já não estava nas melhores condições, não vai demorar até surgirem os vómitos, a diarreia, as náuseas, as dores abdominais, os calafrios e até fraqueza. Caso vomite, não ingira outros alimentos durante cerca de uma hora para o estômago repousar, bebendo apenas pequenas quantidades de água. Se a diarreia atacar, evite tomar de imediato fármacos que a bloqueiem, visto que este é um mecanismo de expulsão do que consumiu.
Seja como for, importa é não descurar nos vários cuidados, nem se esquecer do farnel, é que, “para conseguir aproveitar tudo o que este evento oferecer, é essencial estar bem alimentado”, termina a nutricionista.