O vinho nos seus últimos filmes (Mal Viver e Viver Mal) não é um protagonista, mas é tratado com um carinho e um cuidado que não é muito normal. Isso quer dizer o quê da sua relação com vinho?
Quer dizer que eu tenho esse interesse e esse carinho pelo vinho há muitos anos. E em grande parte quem é responsável por isso é o mestre enófilo João Paulo Martins.
Tem uma garrafeira, tem alguns mitos sobre o vinho que gosta de conservar?
Tenho alguns mitos que conservo. Não me lembro há quantos anos conheço o João Paulo Martins, mas já tinha uma garrafeira antes de o conhecer — só que estava em muito más condições. Tenho garrafeira pelo menos há uns 30 anos.
Foi mais ou menos nessa altura que o João Paulo Martins começou a fazer crítica de vinhos.
Mas eu não o conheci logo, conheci-o um pouco depois. E então ele fez-me um curso e na altura do curso levou-me a todo o lado. E nessa altura do curso eu sabia mais do que o que sei hoje. Conseguia distinguir pelo cheiro castas e outras coisas assim que agora não consigo distinguir de maneira nenhuma.
Os vinhos que aparecem no filme foram escolhidos por alguma razão especial?
Aqueles vinhos resultam de uma lista que pedi a pensar num restaurante médio, mas com pretensões a ter uma garrafeira interessante. Os preços não podiam passar nunca os 25 euros e o João Paulo Martins fez uma lista [o nome do jornalista aparece na ficha técnica dos filmes] e daquela lista eu escolhi três.
Provou-os para decidir?
Já os conhecia.
E a descrição que é feita desses vinhos é sua, do João Paulo Martins ou a meias?
Nem minha, nem do João, nem a meias. É de um rapaz chamado Diogo Pereira que era, não sei se ainda é, o escanção do Pedro Lemos [chef do Porto com um restaurante aberto na zona da Foz], com quem a Anabela [Anabela Moreira, uma das actrizes dos filmes] fez um estágio. Ela já sabia quais eram os vinhos e foi-lhe perguntar o que havia de dizer sobre eles.
O João, sendo do Porto e vivendo entre Lisboa e o Alentejo, que preferência tem entre os vinhos de Portugal? Tem uma região fetiche?
Agora já não. Tinha do Douro, mas agora não. Agora gosto muito de muitos Dão, um deles do Manuel Vieira, o Vinhas da Teixuga, que é extraordinário. E também gosto muito de alguns da Bairrada.
Portanto vinhos mais ácidos, menos alcoólicos e menos encorpados.
Não sei se é isso. Mas sim. A grande diferença é que comecei para aí há 15 anos a gostar muito de vinhos brancos. Antes era mais só tintos. Ainda era daquele tempo em que havia o mito que o vinho é tinto.
Gosta de generosos? Porto, Madeira...
Gosto de todos, Porto, Madeira, Carcavelos, aquele dos Açores que não sei como é que se chama... o Czar?
Há uns anos contou uma história na Fugas em que recordava uma ida a um restaurante em que escolheu um Romanée Conti sem saber quanto ia pagar. Depois desse episódio passou a olhar com mais cuidado para as cartas de vinho?
Muitíssima mais atenção. Mas, na altura, eu sabia muito pouco. Fui enganado por mim mesmo. Hoje isso nunca aconteceria, mesmo que não olhasse para a carta de vinhos. Isso foi no princípio do século XXI, mas não me lembro quando*.
* João Canijo contou a sua aventura com um muito caro Romanée Conti na Fugas em Abril de 2006