Rui Costa: o bicampeonato, 29 anos depois

O 38.º título de campeão do Benfica será o primeiro de Rui Costa como presidente das “águias”.

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Rui Costa MIGUEL A. LOPES
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Rui Costa foi escolhido de uma multidão. Entre 500 miúdos que apareceram num treino de captação algures em 1981, Eusébio da Silva Ferreira nem deixou que aquele rapazito estivesse sequer dez minutos num relvado secundário do antigo estádio da Luz. Foi falar com o pai de Rui Costa para lhe dizer que o queria lá no dia seguinte. Eusébio sabia que tinha escolhido um craque, só não sabia que estava a escolher um presidente. Rui Costa não ganhou muitos títulos como jogador dos “encarnados” – apenas dois, um campeonato e uma taça em cinco épocas. Em menos de dois anos como presidente, já vai a meio caminho.

Vinte e nove anos depois de ter sido campeão com o “10” nas costas, Rui Costa voltou aos títulos. Pode dizer-se que, nos anos em que foi administrador da SAD e vice-presidente, também ganhou coisas, mas haverá sempre a dúvida sobre qual seria o seu verdadeiro papel nas sucessivas direcções de Luís Filipe Vieira – o ex-presidente dos “encarnados” era alguém que gostava de ter a última palavra na gestão do futebol. Mas este é, sem dúvida, um título de Rui Costa e das suas escolhas.

Na verdade, Rui Manuel César Costa, sócio n.º 6034 do Sport Lisboa e Benfica, já era o presidente em exercício em 2021-22, mas o futebol do Benfica dessa época não foi escolha sua, Jorge Jesus incluído. Só com a época em andamento, em Outubro de 2021, é que foi eleito, com mais de 84% dos votos, e, cerca de dois meses depois, deu essa época como perdida, ao despedir Jesus, na véspera de um “clássico” no Dragão (que o Benfica perdeu). E foi aqui que Rui Costa começou a pensar na época seguinte, ao mesmo tempo que lidava com as sombras do vieirismo, uma era da qual ele próprio fez parte.

Era claro que a decisão do treinador seria o acto de gestão mais importante nos primeiros tempos da sua presidência – e já não seria a primeira vez que escolhia um treinador. Em 2008, Quique Flores foi a sua escolha como um novato director-desportivo (tinha acabado a carreira poucos meses antes), e também escolheu jogadores com currículo internacional que faziam sonhar os benfiquistas, sobretudo um, Pablo Aimar – uma curiosidade, o primeiro jogador que contratou foi Rúben Amorim.

Tirando os tempos em que era o “maestro” em campo, esta foi a primeira vez que mandou no futebol benfiquista. A aposta em Quique não resultou e a importância de Rui Costa foi baixando. De “delfim” e potencial sucessor de Vieira, Rui Costa foi perdendo importância na estrutura, mas manteve-se fiel ao presidente que se deixava guiar pelos “feelings”. Quando Vieira caiu, Rui Costa chegou-se à frente, evocando sempre o seu inquestionável benfiquismo, mas a fazer equilibrismo entre as partes da herança de Vieira que devia abraçar e as que devia rejeitar.

A sua primeira escolha, nos últimos dias de 2021, foi a de um interino da casa (Nélson Veríssimo) que o próprio Rui Costa, na altura, dizia poder ser mais que isso. Não foi. E voltamos à tal escolha que Rui Costa não podia falhar, porque o Benfica já estava há três épocas sem ser campeão e não podia esperar mais. Era preciso mudar o paradigma. Depois de 14 anos com treinadores portugueses que conheciam o futebol português, o Benfica voltou a ter um treinador estrangeiro que não conhecia o futebol português.

O presidente foi atraído pela promessa de “jogo atractivo e ofensivo” de Roger Schmidt, um treinador a quem faltava currículo, e reforçou essa aposta a meio da época, quando o Benfica voava na liga portuguesa e na Champions, dando-lhe mais dois anos e antecipando uma eventual cobiça internacional pelo técnico alemão. Não foi só na escolha de Schmidt que Rui Costa acertou.

Houve contratações certeiras (Enzo acima de todas, uma descoberta que rendeu muito, em campo e nas finanças do clube, mas também Neres, Aursnes e Bah), outras nem tanto (ainda estamos por saber o que valem jogadores como Tengstedt e Schjelderup, e os empréstimos de Guedes e Draxler não resultaram), mas houve uma redescoberta da fábrica de craques do Seixal (Ramos, Silva e Neves) que inspirou a reconquista do título, ou a redescoberta de jogadores como João Mário e Rafa Silva.

Tudo somado, valeu a Rui Costa o seu segundo título no Benfica, 29 anos depois do campeonato de 1993-94, em que o Benfica sobreviveu a um Verão quente (os das rescisões de Paulo Sousa e Pacheco tendo o Sporting como destino). Rui Costa, o rapazito escolhido por Eusébio e que foi figura maior do título mundial de juniores de 1991 (cuja final foi na Luz), foi um dos que disse não porque estava a cumprir o seu sonho de jogar no Benfica. No final dessa época saiu para a Fiorentina, chorou quando marcou um golo contra o seu coração na Luz e ficou dez anos em Itália, divididos entre Fiorentina e AC Milan (onde foi campeão europeu). Depois, voltou porque… não podia ser de outra maneira, para se despedir dos relvados onde queria verdadeiramente estar.

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