Em uma cena logo no início de Encanto, animação da Disney que se passa na Colômbia, um garotinho aparece bastante "pilhado" enquanto faz uma série de perguntas repetitivas à protagonista Mirabel. Ele tem nas mãos uma xícara de café, até que Mirabel a recolhe e avisa: "É por isso que café é para adultos."
Mirabel tem razão — para os médicos, não há níveis seguros de consumo de cafeína por crianças. A cafeína é um composto químico naturalmente encontrado em alimentos como erva-mate (que faz o chimarrão), chás, refrigerantes, chocolate e… no café.
"Depende bastante do grão, da torrefacção, se a pessoa faz o café mais forte ou mais fraco, mas é importante saber que uma xícara pode ter de 15 a até 200 miligramas de cafeína. E nós não temos estudos que mostrem um limite seguro de consumo dessa substância antes dos 12 anos", explica Renato Kfouri, pediatra infectologista e presidente do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria.
A grande questão é que, além de poder deixar alguém "pilhado", como acontece com o menino de Encanto, a cafeína também tem potencial para causar problemas sérios no organismo de quem ainda é pequeno.
"Ela tem efeitos colaterais importantes, como irritabilidade, distúrbios de concentração, distúrbios de sono como a insônia, e principalmente arritmia", enumera Renato Kfouri. A arritmia cardíaca acontece quando os impulsos elétricos do coração não funcionam direito e a frequência fica irregular, seja mais rápida, seja mais lenta.
Kfouri cita um estudo feito em Boston, nos Estados Unidos, e incluído em um documento da Sociedade Brasileira de Pediatria, que descobriu que famílias permitiam que crianças de até 2 anos bebessem meia xícara de café por dia, e que havia até quem desse café para bebês menores de 1 ano. A prática não é recomendada pelos médicos.
"O que a gente sabe é que o café não traz benefícios nutricionais. E a cafeína, que está presente nele, também está em um monte de outras coisas que a gente consome e não tem nem ideia disso. Então, os pais devem prestar atenção nas formulações quando forem oferecer estes alimentos às crianças", ensina o pediatra.
Para se ter uma ideia de quantidades, é legal saber que uma xícara de chá, por exemplo, pode ter até 47 mg de cafeína, enquanto um refrigerante de cola dieta pode ter até 46 mg. Um dos cafés mais consumidos nos EUA, da marca Starbucks, traz, por sua vez, 360 mg de cafeína em 210 ml.
Sabendo disso, vem mais uma informação: adolescentes entre 12 e 18 anos devem limitar a ingestão de cafeína a menos de 100 mg por dia, o que equivale a uma xícara de café, na média.
"A cafeína pode causar até dependência e aumentos progressivos de uso de dose pelo adolescente, que começa a consumi-la de outras fontes, como o chocolate, os chás adocicados prontos, os energéticos. Na hora que vai ver, a soma no final do dia é enorme", comenta.
Isso não significa, no entanto, que crianças maiores e jovens devam ficar excluídos do café com leite de manhã em família, por exemplo. O pediatra sugere que se troque o café comum pelo descafeinado, que não oferece os mesmos riscos à saúde.
Exclusivo PÚBLICO/Folha de S.Paulo
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