O “cheiro a novo” é algo a que muitas pessoas se referem quando entram num automóvel zero quilómetros — a maioria com prazer. Porém, um novo estudo sugere que as boas sensações têm efeitos negativos para a saúde.
De acordo com o trabalho desenvolvido por uma equipa da Universidade de Harvard e do Instituto de Tecnologia de Pequim, os habitáculos automóveis concentram uma elevada dose de químicos que podem aumentar o risco de cancro.
Publicado, nesta quarta-feira na revista Cell Reports Physical Science, o estudo baseia-se em experiências no mundo real. Os investigadores deixaram os automóveis estacionados na rua durante 12 horas e, depois, mediram a qualidade do ar, através de sensores capazes de identificar 20 produtos químicos. E observaram que os níveis químicos excediam o padrão de segurança nacional da China para a qualidade do ar nos automóveis. Por exemplo, o nível de formaldeído, um composto orgânico volátil feito a partir do metanol considerado cancerígeno, ultrapassava as normas em 34,9%, enquanto o acetaldeído, também associado à doença, era 60,5% mais elevado do que a norma.
Os responsáveis pelo estudo alertam para o facto de serem precisos apenas 30 minutos dentro do carro para poder ter a saúde afectada por estas substâncias, observando que o tempo mais quente aumenta os níveis dos produtos químicos. Mas, mais do que a temperatura do ar, o estudo aponta para o facto de se ter verificado “que as características das emissões de compostos voláteis dependem da temperatura da superfície do material”, o que pode variar em relação à temperatura exterior. Quanto mais calor, maior será a concentração de químicos, mas não é por se estar no Inverno que o interior de um automóvel novo se torna mais seguro.
“O facto de as temperaturas mais elevadas aumentarem a taxa de desgasificação dos materiais não é novo, mas o que é interessante aqui é que os autores utilizam a temperatura da superfície dos materiais para prever a quantidade de composto que poderá ser libertada ao longo do tempo em vez da métrica mais comummente utilizada da temperatura do ar na cabina. Isto faz sentido quando se pensa em como os assentos e o volante podem ficar quentes num dia quente de Verão”, elabora Oliver Jones, professor de Química da Universidade RMIT, em Melbourne, Austrália, sobre o novo estudo, citado pelo Science Media Centre.
Com as concentrações observadas na cabina, o estudo afirma ter sido possível estimar o risco incremental de cancro ao longo da vida através da inalação, ingestão e absorção dérmica de alguns compostos orgânicos voláteis (COV, formaldeído, benzeno e acetaldeído) emitidos a partir de materiais. “Os cálculos detalhados indicam que a via inalatória desempenha um papel significativo no risco de cancro para condutores e passageiros expostos a COV, enquanto o risco dos três COV através da ingestão e absorção dérmica é relativamente pequeno.”
Os investigadores apontam a utilidade do estudo para quem projecta os interiores dos automóveis, mas ressalvam que “a abertura dos vidros dos automóveis poderá reduzir rapidamente a emissão das concentrações”.