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Pai e filha, separados por um oceano, trocam "cartas" que são fotografias
Fernando vive em Lisboa, Catarina vive em Boston, nos EUA. Ao longo de dois anos, separados pela pandemia, desenvolveram um tipo de correspondência inusitada que se transformou num fotolivro.
O pai, Fernando Coelho, vive em Lisboa; Catarina, a filha, em Boston, nos Estados Unidos. Durante a pandemia, separados por um oceano, desenvolveram um tipo de correspondência inusitada, feita à base de fotografias subordinadas a um tema, a sombra, que deu corpo a um livro que se materializou há cerca de um ano. A Linguagem das Sombras: Correspondência Visual, reúne 100 das mais de 600 fotografias que trocaram ao longo de dois anos, entre 2020 e 2021.
"Muito antes de entrarmos no jogo das sombras, eu e a Catarina já enviávamos fotografias um ao outro via WhatsApp", conta ao P3 o designer de comunicação e professor do ensino politécnico Fernando Coelho. "Ela enviava-me, por exemplo, fotografias das ruas cheias de neve, em Boston, e eu dos jardins que visitava em Lisboa durante o período de confinamento." Nem Fernando nem Catarina sabem ao certo quando começaram a focar-se nas sombras ou quando tudo se tornou um jogo. Certo é que, quando deram conta, a troca de fotografias tinha-se tornado num exercício criativo estimulante.
"A coisa ganhou volume e aqui há uma parte interessante: esta correspondência tornou-nos muito próximos", observa Fernando. "Quando ela me enviava uma foto, eu ficava com a mente preenchida o resto do dia, a pensar numa possível resposta. Assim, mantinha o meu pensamento nela o dia todo. E tenho a certeza que com ela se passou o mesmo." O número de imagens avolumou-se e aquando da primeira reunião familiar pós-pandemia, em Janeiro de 2022, pai e filha decidiram olhar para o conjunto e seleccionar cem fotografias cada um. "Nos meses seguintes pensei que talvez pudesse organizá-las de forma a criar uma espécie de segunda correspondência."
Segunda correspondência? "Organizá-las novamente", explica. "Emparelhá-las para que formassem um novo diálogo, esse baseado na composição, nas linhas de força, na cor, no tipo de actividade, etc." A larga experiência de Fernando no design de livros, jornais e revistas (ao serviço de periódicos tão conhecidos como Jornal de Notícias, Comércio do Porto, Diário de Notícias) "influenciou a organização" das imagens. "Depois, naturalmente, pensámos que tudo isto podia dar um livro." Pai e filha acertaram os detalhes, "foram feitos ajustes", et voilà.
"Não importava se o livro seria só para amigos ou se chegaria ao grande público", sublinha. O importante era materializá-lo. Assim, foi elaborada uma primeira edição de 100 exemplares que foi distribuída, integralmente, por familiares e amigos. Mas a segunda edição vem a caminho. "Eu tenho guardadas muitas das reacções das pessoas a quem enviei o livro e é muito curioso observar que a esmagadora maioria faz menção ao valor emocional da relação entre um pai e uma filha que está na base do livro."
Embora a obra esteja terminada, a correspondência ainda continua. "Continuamos a trocar fotografias na estética da linguagem das sombras", afiança Fernando. Mas porquê as sombras? Catarina, professora universitária e gravurista, responde nas páginas do livro: "No universo de sombras e reflexos, mundos diferentes se sobrepõem. Nele, encontram-se figuras e formas antes segregadas pela distância geográfica ou pela falta de imaginação. Há jardins dentro de lagos, céus dentro de oceanos, figuras intersectadas pelo horizonte de uma paisagem distante, a sombra de um aceno cai sobre um planeta." Para ela, a sombra "é um apontamento arrojado", "uma prova existencial", "um gesto que se evade". É, sobretudo, o elemento que une pai e filha.