Um incêndio roubou-lhes a casa. O apoio que tiveram foi um quarto a dividir por cinco
Na Sé do Porto, três famílias ficaram sem casa na sequência de um incêndio. Duas não aceitaram solução da Segurança Social, a outra foi realojada num albergue. Agora, aguardam realojamento condigno.
Há vinte dias, depois de um incêndio num prédio do bairro da Sé do Porto, três famílias ficaram sem casa. De acordo com a câmara, em situações de emergência como esta, o protocolo exige a intervenção imediata da Segurança Social, de forma a ser dada uma resposta temporária de alojamento a quem, por força de um incidente como este, fique sem tecto. Segundo a autarquia, o procedimento foi cumprido e foi para a entidade que responde a situações de emergência social que o caso foi direccionado.
Só que uma das famílias, depois de duas noites passadas num hostel pago pela Segurança Social, foi reencaminhada para outro local. Depois de ficarem sem casa e de terem perdido alguns dos seus pertences, foram realojadas num centro de alojamento social da Santa Casa da Misericórdia para pessoas em situação temporária de sem-abrigo, onde têm de dividir o espaço de um quarto com cinco camas entre os cinco membros do agregado familiar.
Esta solução seria sempre um problema para a família que ficou sem poder habitar no apartamento que arrenda. Mas torna-se ainda mais grave porque, adivinha um membro do agregado, a situação não será “assim tão temporária”. Tiago Campos, de 25 anos, que depois do PÚBLICO ligar atendeu o telemóvel do pai, Miguel Pinto - que na madrugada do incêndio foi assistido no Hospital de Santo António com ferimentos ligeiros -, sublinha estar a contar, daqui para a frente, com um processo longo: será necessário apurar as causas do incêndio, esperar que o senhorio accione o seguro e ainda aguardar que o prédio seja reabilitado. “O prédio ficou aos caídos”, atira.
Por força disso, tem a esperança que a autarquia possa intervir, de forma a resolver a situação, que, do seu ponto de vista, passa por uma solução de alojamento com as condições que a família necessita. O pai, uma das pessoas que no dia do incêndio ficou 15 horas à frente do prédio que ardeu com a família e outro vizinho à espera de uma solução de alojamento, foi recentemente operado à coluna. O quarto não tem condições para a família habitar. Falta privacidade no sítio onde pernoitam e falta privacidade na rotina diária: têm de dividir todos os espaços comuns do edifício “com os outros utentes”.
Com os ordenados que a família aufere não têm hipótese de arrendar outro apartamento. Os preços que agora se praticam não são compatíveis com os rendimentos do agregado. A solução encontrada para uma família que passou por um incidente como este, defende, não pode ser a que lhes foi apresentada.
Câmara empurra solução para Segurança Social
As outras duas famílias que viviam no prédio ficaram alojadas em casa de familiares e amigos, onde ainda permanecem, também à espera de uma solução mais definitiva, depois de terem recusado o apoio da Segurança Social, que não consideraram apropriado.
A Luís Nunes, de 83 anos, que vivia sozinho, foi-lhe sugerido ser alojado num lar. Não aceitou. É uma pessoa autónoma e preferiu ir para a casa da filha. Mas é uma situação temporária. Porque, afirma, a casa não tem a dimensão necessária para albergar mais uma pessoa. O PÚBLICO não conseguiu chegar à conversa com a outra família, que habitava a fracção do terceiro piso, onde deflagrou o incêndio. Os vizinhos dizem que foram para casas de familiares ou amigos.
Quem faz a intermediação do imóvel adquirido há cerca de oito anos pelo actual proprietário, que vive fora do país, lamenta, ao PÚBLICO, a situação pela qual os inquilinos estão a passar. Além dos apartamentos onde viviam as três famílias, outras fracções do prédio estão arrendadas a um restaurante e a um escritório. O intermediário, que preferiu não se identificar, diz que nenhum dos inquilinos está a pagar rendas porque o espaço não pode ser usado. E, tão cedo, não voltará a ser, sublinha, porque o processo de reabilitação poderá ser demorado. Por agora, adianta, ainda aguarda pelos relatórios dos bombeiros, que ajudarão a que se conclua qual foi a causa do incêndio. Qualquer opção que passe pelo senhorio poder apoiar os inquilinos em nova situação de alojamento considera estar fora de questão, por falta de meios financeiros.
O PÚBLICO não conseguiu falar com a Segurança Social, mas perguntou à autarquia se já conhece as causas do incêndio e se poderá encontrar soluções de alojamento para os moradores condizentes com as suas necessidades. À primeira pergunta, a câmara adianta já terem saído três relatórios do Regimento de Sapadores Bombeiros, mas que são meramente técnicos. Só a PJ poderá apurar o que aconteceu. À segunda, como tem feito nos últimos meses sempre que aconteceu realojar-se munícipes em situação de emergência em espaços que não têm as condições mínimas para serem habitados por famílias, continua a sublinhar que a responsabilidade é da Segurança Social.